A floresta em tempo de calmaria

Sem as chamas a entrarem-nos pela televisão dentro, a floresta portuguesa voltou a ser o que também tem de ser para uma comunidade humana normal: uma fonte de recursos. Aproveite-se a calmaria para deixar em paz a floresta de produção, para nos preocuparmos em encontrar soluções para a floresta de protecção.

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Nelson Garrido

A floresta portuguesa é essencialmente pirófita, até na política. Quando há fogo, devastação, culpas a atribuir e indignações a reclamar em público, a floresta torna-se o assunto mais importante do nosso destino colectivo. Quando o Verão é temperado e o princípio do Outono frio, não há fogo e a floresta fica remetida ao seu natural estado de desenvolvimento vegetativo. É caso para dizer que é melhor que não haja fogo por todas as razões e mais a que acelera o instinto político e legislativo do Governo ou das oposições. Não é que não faça falta o reformismo, o reforço da protecção ou o estímulo ao nosso mais importante recurso natural renovável; é que o pousio político na floresta evita ao menos que tantos caiam na tentação do disparate.

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A floresta portuguesa é essencialmente pirófita, até na política. Quando há fogo, devastação, culpas a atribuir e indignações a reclamar em público, a floresta torna-se o assunto mais importante do nosso destino colectivo. Quando o Verão é temperado e o princípio do Outono frio, não há fogo e a floresta fica remetida ao seu natural estado de desenvolvimento vegetativo. É caso para dizer que é melhor que não haja fogo por todas as razões e mais a que acelera o instinto político e legislativo do Governo ou das oposições. Não é que não faça falta o reformismo, o reforço da protecção ou o estímulo ao nosso mais importante recurso natural renovável; é que o pousio político na floresta evita ao menos que tantos caiam na tentação do disparate.

Estamos, por isso, num ano em que o business as usual reina nos espaços florestais nacionais. Como as áreas ardidas foram pequenas, perdemos a oportunidade de assistir ao frenesim legislador a forçar (e bem) a limpeza das orlas das estradas ou de rasgar corta-fogos em zonas densamente arborizadas. E como o nível de devastação não nos tomou conta da atenção nas semanas de calor nem no verão de São Martinho, perdemos também a oportunidade de assistir aos justiceiros a pedir a condenação do eucalipto ou a salvação do carvalho. Longe dos gabinetes da capital, o mundo da fileira faz-se como sempre se fez: algures entre a ordem natural das coisas, o interesse económico a servir de força motriz.

Esperemos que a administração faça o que lhe compete e defenda o interesse público florestal, que insista na protecção, se bata pela criação de uma floresta diversa, rica e sustentável dominada de preferência por espécies de crescimento lento. Como se espera que os produtores florestais possam gerir os seus espaços de acordo com a legislação em vigor e em função dos seus legítimos interesses. Sendo isso que está a acontecer, como podemos concluir numa simples viagem de automóvel pela A1 ou pelas auto-estradas que nos levam ao interior.

Sem as chamas a entrarem-nos pela televisão dentro, a floresta portuguesa voltou a ser o que também tem de ser para uma comunidade humana normal: uma fonte de recursos. Os polícias das espécies estão em paz, a produção e a indústria também e se isso não quer dizer que a floresta nacional viva no melhor dos mundos, há-de significar que a parte boa não seja castigada pelos dramas da parte frágil. Aproveite-se, pois, a calmaria para deixar em paz a floresta de produção, para nos preocuparmos em encontrar soluções para a floresta de protecção. E de preferência sem o alarme do fogo a estimular a irracionalidade.