Missão científica vai estudar o icebergue gigante que se soltou da Antárctida
Equipa do Reino Unido investigará icebergue com 3900 quilómetros quadrados que se está a aproximar da ilha da Geórgia do Sul. Deve chegar à ilha no final de Janeiro.
Há um icebergue gigante que está em rota de colisão com a ilha da Geórgia do Sul, no Sul do oceano Atlântico, o que pode pôr em risco a vida selvagem desse território. Agora, uma equipa de cientistas liderada pelo British Antarctic Survey vai estudar o icebergue, designado A-68a (a letra corresponde a um local no mapa da Antárctida e o número a uma sequência definida por esta entidade) e que se separou da plataforma Larsen C, na Antárctida Ocidental, em Julho de 2017.
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Há um icebergue gigante que está em rota de colisão com a ilha da Geórgia do Sul, no Sul do oceano Atlântico, o que pode pôr em risco a vida selvagem desse território. Agora, uma equipa de cientistas liderada pelo British Antarctic Survey vai estudar o icebergue, designado A-68a (a letra corresponde a um local no mapa da Antárctida e o número a uma sequência definida por esta entidade) e que se separou da plataforma Larsen C, na Antárctida Ocidental, em Julho de 2017.
Depois de se ter separado da Larsen C, o icebergue viajou lentamente para oceano aberto. Após dois anos, atingiu a poderosa Corrente Circumpolar Antárctica, que circunda a própria Antárctida. Neste momento, o icebergue continua a seguir essa corrente e “parece que se vai aproximar da Geórgia do Sul nos próximos dias”, indica ao PÚBLICO Andrew Fleming, cientista do British Antarctic Survey (BAS), que é responsável por assuntos do Reino Unido na Antárctida. O A-68a está a menos de 100 quilómetros da ilha.
“O icebergue gigante A68a pode colidir com a terra este mês, causando estragos perto das águas da ilha da Geórgia do Sul”, avisou também em comunicado a Agência Espacial Europeia (ESA), que tem acompanhado a viagem deste icebergue através de satélites. Já Stef Lhermitte, investigador da Universidade de Tecnologia de Delf (nos Países Baixos), diz ao PÚBLICO que é difícil de dizer se ainda continua em rota de colisão com a ilha. “Está muito perto das águas pouco profundas, mas poderá ser levado pelas correntes, tal como aconteceu com a maioria dos icebergues”, nota, referindo que a única forma de o saber é acompanhá-lo nos próximos dias.
Andrew Fleming explica ainda que, à medida que se aproxima da Geórgia do Sul e entra em águas pouco profundas, o icebergue pode ficar “encalhado” no fundo do oceano. “Se isso acontecer, a colisão poderá acontecer nas próximas semanas”, antevê o cientista. “Mas há ainda a possibilidade de não ficar preso e se movimentar lentamente à volta da ilha, seguindo para o oceano aberto a norte.”
Apesar de ter vindo a perder muito do seu volume nos últimos meses e semanas, o A-68a ainda atinge proporções consideráveis. Originalmente, tinha cerca de 5800 quilómetros quadrados, mas agora já terá 3900 quilómetros quadrados, de acordo com um comunicado desta terça-feira do BAS.
Relativamente à área, A68a é bem maior do que o Luxemburgo (com 2586 quilómetros quadrados) ou do que Singapura (728 quilómetros quadrados). Em tempos, já ultrapassou a área do Algarve (4997 quilómetros quadrados) e de Cabo Verde (4033 quilómetros quadrados). Neste momento, terá (mais ou menos) a mesma área da Geórgia do Sul, que tem à volta de 3900 quilómetros quadrados.
A profundidade por baixo da linha de água do A-68a é cerca de 200 metros, disse à BBC Stef Lhermitte, que analisou dados do satélite Icesat-2. Tem 140 quilómetros de comprimento, segundo dados de domingo do satélite Sentinela-1 do programa Copérnico da Comissão Europeia e da ESA.
Até agora, o maior icebergue já registado foi o B-15, que tinha uma área de mais de 11 mil quilómetros quadrados. Soltou-se da plataforma de gelo de Ross, também na Antárctida, em 2000.
Investigar a temperatura e a salinidade
No próximo mês, a missão científica liderada pelo BAS seguirá rumo à Geórgia do Sul (que faz parte do território britânico) e utilizará o navio de investigação James Cook, do Centro Nacional Oceanográfico do Reino Unido. Depois de terem visto imagens de satélite que mostravam que o icebergue se movia em direcção à ilha, a equipa propôs uma missão urgente ao Conselho de Investigação do Ambiente do Reino Unido. Agora espera chegar à ilha no final de Janeiro.
“Temos uma oportunidade única para visitar o icebergue”, diz Povl Abrahamsen, oceanógrafo do BAS, num comunicado da instituição. “Normalmente, levamos anos a planear a logística para viagens de investigação marinha.”
Nesta missão, usar-se-ão veículos robóticos subaquáticos e instrumentos de amostragem para perceber como é que a massa do icebergue está a influenciar o ambiente envolvente. Afinal, grandes icebergues podem mudar a temperatura da água à sua volta e introduzir grandes quantidades de água doce à medida que derretem, o que pode afectar a vida marinha. Concretamente, serão usados dois planadores subaquáticos e pretende-se monitorizar a temperatura e a salinidade, bem como recolher concentrações de clorofila. Conseguirá assim saber-se a quantidade de fitoplâncton que está na água, pois estes organismos estão na base da cadeia alimentar e são comidos por pequenos crustáceos, que, por sua vez, são alimento de grandes predadores.
“O icebergue causará devastação no fundo do oceano ao varrer comunidades de esponjas, estrelas e ouriços-do-mar, o que fará decrescer a biodiversidade”, alerta Geraint Tarling, ecólogo do BAS. “Na história da ciência, não há nada assim tão grande que estivesse a chegar à Geórgia do Sul.”
Uma das preocupações tem sido a grande população de pinguins na ilha. Geraint Tarling explica que o icebergue se pode prender ao flanco da ilha e permanecer aí durante dez anos, o que poderá bloquear a passagem dos pinguins para a água e impedi-los de alimentar os seus filhos. Por exemplo, os pinguins-rei fazem, normalmente, viagens de ida e volta durante 16 dias, em que recolhem comida que depois dão aos filhos. Se a viagem for demasiada longa, as crias podem passar fome e até morrer.
Contudo, nem tudo será negativo e Geraint Tarling exemplifica que, ao viajarem pelo oceano aberto, os icebergues podem soltar enormes quantidades de poeira mineral que poderão fertilizar o plâncton.
E são as alterações climáticas que estão por detrás deste icebergue? A comunidade científica tem vindo a investigar se têm uma consequência directa ou parcial nos icebergues, refere-se num artigo da BBC, em que se destaca que “os cientistas ainda têm uma compreensão limitada sobre como o gelo se comporta historicamente”. A monitorização dos icebergues polares começou apenas nas décadas mais recentes com os satélites. Além disso, a Antárctida é influenciada por outras variáveis, como os padrões climáticos nos trópicos e ventos fortes. Também se sabe que, actualmente, a Antárctida é um dos sítios do planeta que estão a aquecer de forma mais rápida e que o degelo é um problema.