Marco Martins rasga a folha em branco da paternidade
O encenador queria trabalhar um dueto com Beatriz Batarda e Romeu Runa, a partir da figura do pai. Perfil Perdido, em estreia nacional no Teatro São Luiz, de 8 a 20 de Dezembro (em 2021 passará por Guimarães, Loulé, Viseu e Porto), é uma intensa, provocadora e perturbadora viagem a memórias e emoções fundacionais.
“Ei!”. Há um grito autoritário que se escuta de forma recorrente ao longo de Perfil Perdido. Vem de um voz grave e ríspida, e põe fim a qualquer acção que possa estar a decorrer. De cada vez que invade a sala, os corpos de Beatriz Batarda e de Romeu Runa, e os seus esquiços de personagens, detêm-se, viram as costas ao público e enfrentam uma forma cónica que se encontra no fundo do palco. Baixam as cabeças, como quem sabe que se “portou mal” — mesmo que as razões que justificam essa reprimenda possam não ser claras. “Both of you guys are in big trouble”, ouve-se num primeiro momento, na faixa áudio retirada de um vídeo que circula viralmente pela internet. Ela e ele estão em maus lençóis e terão de ser disciplinados. E, num tom ameaçador, a voz promete que serão proibidos de beber sumo e receberão outros castigos que ainda falta determinar mas que existem já enquanto ameaça. Pelo meio, o pai deixa escapar uns risos. Pode parecer cómico — mas não é.