O Centro de Congressos do Estoril é o “quartel-general” do combate ao vírus em Cascais
Espaço foi adaptado para ser centro de testagem à covid-19 logo em Março. Mais recentemente, acolheu a equipa que faz a vigilância epidemiológica dos novos casos e foi criada uma área para doentes com queixas respiratórias, que não necessitem de tratamento hospitalar.
Mal se chega à porta do Centro de Congressos do Estoril, as pessoas cobertas com fatos da cabeça aos pés denunciam que, por ali, o vírus anda à espreita. Mandam entrar, recomendam que se sigam os percursos marcados no chão para evitar cruzamentos. Ao início da manhã da passada quinta-feira, tudo fluía com normalidade, sem filas ou confusão.
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Mal se chega à porta do Centro de Congressos do Estoril, as pessoas cobertas com fatos da cabeça aos pés denunciam que, por ali, o vírus anda à espreita. Mandam entrar, recomendam que se sigam os percursos marcados no chão para evitar cruzamentos. Ao início da manhã da passada quinta-feira, tudo fluía com normalidade, sem filas ou confusão.
Logo em Março, quando os primeiros casos de infecção pelo SARS-CoV-2 começaram a aparecer no país, a Câmara de Cascais adaptou este equipamento, junto ao Casino Estoril, a centro de rastreio com o apoio de laboratórios privados. Onde antes se realizavam conferências, congressos, está hoje montado o “quartel-general” do combate ao vírus do município de Cascais.
Tânia Caixeiro está lá desde o dia um, a testar quem chega agarrado à esperança de um teste negativo. Por ali, sobretudo nos primeiros tempos, não havia mãos para tanto trabalho. O stress, esse, é constante para garantir que não há qualquer descuido na protecção. Trocar de luvas constantemente, desinfectar os invólucros das zaragatoas, confirmar se as etiquetas estão correctas já se tornou um ritual.
Chegar a casa e não poder abraçar os filhos de oito e quatro anos antes de trocar de roupa e de tomar um banho também. São quase nove meses a lidar com o bicho de frente, sem nunca o ver. “Eu mantenho toda aquela segurança, de me despir à porta de casa, ir tomar banho e só depois ir ter com os meus filhos”, conta.
Nos primeiros seis meses da pandemia viu-os uma vez, depois de ter deixado as crianças ao cuidado dos avós, em Viseu. “Não é fácil. Nós também não somos de ferro.” Mas, por vezes, parecem que são, quando tentam sossegar quem ali entra cheio de receios.
Celina Torre tosse há mais de uma semana. Como é empregada doméstica, e trabalha com pessoas mais velhas, contactou a linha de Saúde 24 que lhe prescreveu o teste. “Não é fácil, mas não é tão mau como dizem”, diz com os olhos lacrimejantes, depois de Tânica lhe retirar a zaragatoa do nariz. Agora, é ir para casa e esperar por um resultado negativo.
Francisco, o bebé de dez meses de Isabel Silva, teve febre durante a madrugada e a mãe achou por bem contactar a Saúde 24. Encaminharam-no para teste. Como Isabel ganha à hora como empregada doméstica e o marido é pintor em obras, o receio de um resultado positivo é mais do que muito. Significará que terão de ficar em casa com ele e isso também significa que é menos dinheiro que entra em casa ao fim do mês.
Por dia, estão a ser testadas cerca de 250 pessoas, diz Susana Passos Sousa, técnica administrativa do laboratório Germano Sousa, que chegam encaminhados pela Saúde 24, pelos centros de saúde ou que marcam mesmo sem ter prescrição. Este laboratório tem três postos de testagem, com capacidade para fazer 300 testes diários — o laboratório Joaquim Chaves tem mais um no local.
Doentes respiratórios
Algumas das pessoas que ali vão fazer o teste são encaminhadas também pelos médicos da Área Dedicada para Doentes Respiratórios (ADR-C), que foi recentemente instalada no centro de congressos.
Quase nove meses depois, e para aliviar a pressão sobre o Centro de Saúde de São João do Estoril, o município adaptou o foyer do edifício, e criou um “mini” centro de saúde para atender doentes que apresentem queixas respiratórias, mas que não têm indicação para ir ao hospital. Se o médico decidir que deverá ser testado à covid-19, o utente pode descer até ao centro de rastreio, no piso da entrada, e fazer logo ali o teste. Mas os médicos podem também atender doentes que estão infectados com o novo coronavírus e que tiveram um agravamento de sintomas.
São sete gabinetes (cinco para consulta, um de enfermagem e um de isolamento), com capacidade para ter até cinco médicos e dois enfermeiros ao serviço. Por agora, explica Nuno Basílio, médico de Medicina Geral e Familiar no Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) de Cascais, estão ao serviço três médicos e um enfermeiro a fazer 60 atendimentos por dia, de segunda a sexta, entre as 10h e as 18h e aos sábados, domingos e feriados das 9h às 13h.
Inquéritos epidemiológicos em dia
O Centro de Congressos do Estoril está agora também a acolher rastreadores que realizam os inquéritos epidemiológicos dos casos de infecção identificados em Cascais. No ecrã da delegada de saúde, Marina Soares, contabilizavam-se 5953 casos confirmados de infecção e e 151 óbitos no município desde o início da pandemia. Mas há um número que deixa esta médica mais descansada: estavam apenas 13 inquéritos epidemiológicos pendentes e todos referentes a casos que tinham sido dados como positivos naquela manhã.
Chegaram a ser quase 400 inquéritos em atraso. “Aqui o timing é fundamental. Quanto mais cedo isolarmos os contactos das pessoas positivas, mais cedo quebramos as cadeiras de transmissão”, diz a médica de saúde pública.
A debater-se com falta de meios humanos para fazer esta tarefa de vigilância epidemiológica, a Câmara de Cascais abriu uma bolsa de voluntariado aos funcionários municipais para ajudarem nessa missão. Há agora 30 trabalhadores do município que estão treinados para reforçar as equipas dos rastreadores, que têm como missão descobrir com quem contactou o infectado nas 48 horas antes ao aparecimento de sintomas ou do teste positivo. Depois, é preciso entrar em contacto com elas.
Segundo explica Marina Soares, depois de um pico de casos em Outubro, com mais de 100 novos casos diários, a propagação da infecção está paulatinamente a baixar. Os números do início da semana indicavam cerca de 40 casos por dia e o indicador de transmissibilidade (Rt) está já abaixo de 1, seguindo a tendência nacional. No entanto, apesar desta evolução positiva, tanto na área de vigilância epidemiológica, como no centro de rastreio, aguarda-se com expectativa o início do ano, depois do Natal e do fim do ano.
Às quartas-feiras, também a Cruz Vermelha Portuguesa, que lidera a operação de testes que a Segurança Social está a correr em todos os trabalhadores de lares do concelho, faz ali os seus rastreios.
Ao PÚBLICO, o presidente da câmara de Cascais, Carlos Carreiras, nota que o investimento feito pelo município nestas duas novas áreas rondou os 230 mil euros. Como muito desse investimento é em equipamento informático e mobiliário, o município poderá depois reutilizá-lo. Recentemente, a autarquia arrendou também um hotel junto aos Cascais Shopping para “poder receber assintomáticos que não têm condições para ficar nas suas casas”. Há 70 quartos disponíveis, que poderão também acolher, como já aconteceu, utentes de lares onde o SARS-CoV-2 entrou.