Quando os médicos foram à periferia para mudar o país
Era uma vez um país onde muitos nunca tinham visto um médico ou vendiam terras para pagar uma consulta. Era uma vez uma geração de médicos que foi para o interior lançar as bases do SNS. O Serviço Médico à Periferia (1974-1982) foi uma hecatombe no Portugal “medieval”, conta Raquel Varela no livro Uma Revolução na Saúde. A História “nunca se repete”, mas é uma semente: o que pode o país de hoje reciclar desse tempo?
Quando o homem descalçou as botas e as meias para ser visto pelo médico, os pés surgiram cobertos de vermes. O “velhote” não tiraria os sapatos “há meses” e as úlceras haviam crescido sem ele perceber. Desmaiou. “Uma coisa absurda, não é?” O cirurgião pediátrico Jaime Mendes trocara a Suíça por Mangualde, depois de anos de exílio para escapar à ditadura e à guerra, e encontrara um país das “cavernas” na Europa. Ali, a população não tinha electricidade e o cenário memorava os “filmes soviéticos dos anos 30”.