Algum do processo de usura da democracia, de crescimento do populismo, de tribalização da política, da cloaca das redes sociais, está para além do sentimento de exclusão económica, social e cultural, está para além dos efeitos perversos da corrupção e do nepotismo, e do racismo e xenofobia modernos. Está na fragilidade do suporte cultural que é essencial para a sobrevivência da democracia, que é uma escolha cultural no sentido lato contra a natureza. Repito, a democracia não é um regime natural, mas artificial. Natural era andarmos todos a comer-nos uns aos outros, e todos os regimes que assentam na violência e na ordem do poder estão mais próximos dessa natureza do que da democracia. O que distingue a escolha democrática é exactamente ser uma opção, uma escolha, que nos afasta da barbárie através de um conjunto de procedimentos cujo objectivo é dar poder a todos, pela soberania do voto, e construir sociedades reguladas pela lei, em que não vale tudo. É imperfeito, mas é o melhor que temos, e está a ruir diante dos nossos olhos à custa de muita covardia, abolia e inércia.
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Algum do processo de usura da democracia, de crescimento do populismo, de tribalização da política, da cloaca das redes sociais, está para além do sentimento de exclusão económica, social e cultural, está para além dos efeitos perversos da corrupção e do nepotismo, e do racismo e xenofobia modernos. Está na fragilidade do suporte cultural que é essencial para a sobrevivência da democracia, que é uma escolha cultural no sentido lato contra a natureza. Repito, a democracia não é um regime natural, mas artificial. Natural era andarmos todos a comer-nos uns aos outros, e todos os regimes que assentam na violência e na ordem do poder estão mais próximos dessa natureza do que da democracia. O que distingue a escolha democrática é exactamente ser uma opção, uma escolha, que nos afasta da barbárie através de um conjunto de procedimentos cujo objectivo é dar poder a todos, pela soberania do voto, e construir sociedades reguladas pela lei, em que não vale tudo. É imperfeito, mas é o melhor que temos, e está a ruir diante dos nossos olhos à custa de muita covardia, abolia e inércia.