Forças Especiais da Austrália mataram 39 civis no Afeganistão

O inquérito à conduta das forças de elite australianas no Afeganistão foi desencadeado pelo trabalho de uma socióloga militar que ouviu relatos perturbadores, incluindo a descrição de um caso em que os comandos degolaram dois adolescentes.

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Reuters

Membros das forças especiais da Austrália mobilizadas no Afeganistão a seguir ao 11 de Setembro de 2001 assassinaram pelo menos 39 civis afegãos que não apresentavam qualquer ameaça, em “casos em que os novos membros da patrulha foram forçados a disparar sobre um prisioneiro para levar a cabo o seu primeiro homicídio” ou usando-os para fazer “tiro ao alvo”.

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Membros das forças especiais da Austrália mobilizadas no Afeganistão a seguir ao 11 de Setembro de 2001 assassinaram pelo menos 39 civis afegãos que não apresentavam qualquer ameaça, em “casos em que os novos membros da patrulha foram forçados a disparar sobre um prisioneiro para levar a cabo o seu primeiro homicídio” ou usando-os para fazer “tiro ao alvo”.

As revelações incluídas no relatório divulgado nesta quinta-feira são “vergonhosas”, “profundamente perturbadoras” e “chocantes”, disse o mais alto responsável militar australiano, general Angus Campbell, prometendo que os responsáveis serão acusados.

O chamado Relatório Brereton – a investigação dos últimos quatro anos foi dirigida pelo major e juiz Paul Brereton – detalha como estes possíveis “crimes de guerra” foram cometidos e encobertos por comandantes de patrulha, normalmente sargentos ou cabos, sem o conhecimento das chefias. Os comandantes de patrulha eram vistos pelas tropas como “semideuses”, o que tornava impossível que fossem denunciados.

Mas o relatório não iliba a hierarquia, apontando falhas de supervisão exacerbadas pela “cultura guerreira” das forças de elite, com soldados motivados por “sede de sangue”, e pelo recurso a um pequeno grupo de militares repetidamente mobilizados durante longos períodos.

"Sinais de alerta"

Havia também a sensação de que o “sacrifício colectivo” das Forças de Defesa Australianas (SAS) justificava desvios às regras. “É claro que havia sinais de alerta, mas nada aconteceu”, escreve o inspector-geral adjunto das SAS, David Whetam.

Brereton identificou 25 militares envolvidos, entre responsáveis e cúmplices, incluindo alguns que ainda servem nas SAS. Os 39 afegãos foram assassinados, e outros dois tratados com crueldade por estas tropas em 23 incidentes.

Muitos pormenores são censurados no relatório, mas fica claro que nenhum destes afegãos foi morto em batalha ou em “circunstâncias em que a intenção do perpetrador fosse pouco clara ou confusa” – para além disso, “todas as pessoas entrevistadas [423 testemunhas no total] conheciam a lei da guerra e as regras de envolvimento em que operavam”. Um incidente, censurado quase na totalidade”, é descrito como “possivelmente o episódio mais infame da história militar australiana”.

Os militares não só encobriam os seus actos, encenando muitas vezes a cena do crime, pondo armas ou rádios junto aos corpos das vítimas, e mentindo de forma sistemática nos seus relatórios operacionais, como se gabavam e mantinham contagens de mortos.

O inquérito foi desencadeado pelo trabalho da socióloga militar Samantha Crompvoets, a quem foi pedido que avaliasse a cultura das forças de elite e que ouviu alegações de crimes de guerra. Num incidente que lhe foi contado, as SAS pararam dois rapazes de 14 anos e decidiram que podiam ser simpatizantes dos taliban – foram degolados. “O resto das tropas teve depois de ‘limpar a cena’, encontrando outros para os ajudar a eliminar os corpos”, que acabaram “por ser ensacados e atirados para um rio”.

Campbell diz que aceitou as 143 recomendações do relatório, incluindo encaminhar 36 casos, envolvendo 19 indivíduos, para o gabinete do investigador especial criado pelo Governo para avaliar possíveis acusações criminais. O chefe do Exército australiano pediu desculpas “ao povo do Afeganistão”, assim como primeiro-ministro australiano, Scott Morrison, que antes da divulgação do relatório telefonou ao Presidente afegão, Ashraf Ghani.