Medidas anticrise “devem actuar nas margens”, avisa Centeno

Governador do Banco de Portugal diz que elevado nível de dívida não permite ao Estado uma resposta massiva à crise. E que medidas tomadas têm de ter carácter temporário

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Nuno Ferreira Santos

As políticas públicas a pôr em prática para responder aos efeitos da presente crise devem ter um carácter temporário e actuar essencialmente nas margens, uma vez que o elevado nível de dívida não permite uma acção massiva e para toda a gente por parte do Estado, defendeu esta segunda-feira o governador do Banco de Portugal.

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As políticas públicas a pôr em prática para responder aos efeitos da presente crise devem ter um carácter temporário e actuar essencialmente nas margens, uma vez que o elevado nível de dívida não permite uma acção massiva e para toda a gente por parte do Estado, defendeu esta segunda-feira o governador do Banco de Portugal.

Na intervenção que realizou no decorrer da 10ª Conferência do Banco de Portugal realizada na manhã desta segunda-feira por via digital, Mário Centeno deixou recomendações aos membros do Governo que abandonou há alguns meses. Uma das principais foi a de que, tendo em conta a limitação nas finanças públicas portuguesas, não será possível ajudar todos nem prologar por muito tempo as medidas postas em prática.

Começando por dizer que “esta é uma crise que tem todas as características de uma crise temporária” e que “aquilo que não será temporário é o aumento da dívida pública e uma maior desigualdade”, o governador do Banco de Portugal defendeu que neste cenário, as políticas públicas “devem actuar nas margens”, isto é proteger essencialmente aqueles que mais precisam. “O nível de dívida pública impede políticas massivas. Temos de ser focados, concentramo-nos nos trabalhadores com mais dificuldade em entrar no mercado de trabalho”, afirmou Mário Centeno.

Para além disso, alertou, “os apoios públicos devem ser temporários”, defendendo que perante uma crise que não será permanente, não há razões para não manter as características essenciais da estrutura económica e social.

Outra recomendação deixada por Centeno ao executivo é que, no capítulo do investimento público, que o seu sucessor, João Leão, promete fazer crescer fortemente no decorrer do próximo ano, “o foco deve estar na forma de catalisar investimento privado, que continua a ser o tipo de investimento com maior peso”. Por isso, disse, “para uma retoma eficaz, os recursos públicos devem estar focados em projectos que já estão em curso”.

Por último, ao nível dos apoios ao emprego, o governador defendeu que se deve procurar, não tanto promover os empregos actuais, mas mais a criação de novos empregos. “A realocação dos postos de trabalho deve ser apoiada e não devemos ter políticas que bloqueiem essa realocação”, disse, e avisou que o importante é “promover a manutenção do rendimento entre empregos”.

Estas declarações de Mário Centeno surgem numa altura em que sobe de tom o debate sobre a dimensão dos apoios públicos no terreno. Para além da agitação social trazida pelas novas medidas de confinamento, nas próximas duas semanas decorrem os debates e as votações na especialidade da proposta de Orçamento do Estado para 2021, onde a discussão entre o Executivo e os partidos à sua esquerda sobre a dimensão da resposta financeira do Estado à crise económica trazida pela pandemia vai assumir um papel central.