Dez sugestões para duas manhãs de cultura, com máscaras. Depois, é voltar para casa
Num fim-de-semana condicionado pelo recolher obrigatório, várias salas de espectáculos no país adequaram os seus horários às exigências do Governo. Um duplo gesto de resistência: pelo acesso à cultura e pela sobrevivência dos artistas.
Há um ditado português antigo, “De manhã se faz o dia”, que remete para o quotidiano do mundo rural, quando os lavradores se levantavam com o nascer do sol para irem trabalhar a terra. Neste (e no próximo) fim-de-semana, essa prática vai ter de estender-se ao mundo urbano para quem quiser aproveitar o sábado e/ou o domingo para amenizar o confinamento, a medida anti-covid-19 que o Governo reforçou ainda esta quinta-feira estendendo-a a 77 novos concelhos, a somar aos 114 inicialmente referenciados.
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Há um ditado português antigo, “De manhã se faz o dia”, que remete para o quotidiano do mundo rural, quando os lavradores se levantavam com o nascer do sol para irem trabalhar a terra. Neste (e no próximo) fim-de-semana, essa prática vai ter de estender-se ao mundo urbano para quem quiser aproveitar o sábado e/ou o domingo para amenizar o confinamento, a medida anti-covid-19 que o Governo reforçou ainda esta quinta-feira estendendo-a a 77 novos concelhos, a somar aos 114 inicialmente referenciados.
“É mesmo para as pessoas ficarem em casa”, avisou António Costa. Restam, por isso, as manhãs (das 5h00 às 13h00) para quem não quiser ficar dois longos dias (e três noites) confinado à família e à gastronomia, à leitura, à televisão e ao streaming, ou apenas à solidão das suas paredes.
Se as visitas aos parques, jardins e museus (a Gulbenkian, em Lisboa, ou Serralves, no Porto, para citar dois exemplos emblemáticos) são hábitos já enraizados nos centros urbanos, aos fins-de-semana, para muita gente, é de notar como muitos cinemas, teatros e outros palcos, um pouco por todo o país, se apressaram a ajustar os horários dos seus programas à actual situação. Uma forma de resistência, através da oferta cultural, mas também uma tentativa de atenuar os efeitos da pandemia na crise que todo o sector está a atravessar, sem ver nenhuma luz (ou vacina praticável) ao fundo do túnel.
Ainda que seja aconselhável que o leitor confirme os horários respectivos, o PÚBLICO alinha a seguir uma dezena de sugestões principalmente na área das artes do palco — sem esquecer as máscaras! Mesmo se muitos cinemas trataram também de programar sessões matinais — entre eles, as salas que acolhem o LEFFEST - Lisbon & Sintra Film Festival, cujo calendário foi apanhado na teia da pandemia, e que reagendaram para as manhãs destes sábado e domingo meia dúzia de sessões, incluindo as de homenagem a Paul Thomas Anderson ou a antestreia do muito esperado filme de Gia Coppola, Mainstream (Centro Cultural Olga Cadaval; domingo, 10h00).
Dança, teatro e música
No Porto, há dois programas que se perfilavam desde há muito como acontecimentos a não perder no calendário da dança e da performance. No Teatro Rivoli (sábado, 10h45), repete-se o espectáculo da véspera, com que o Ballet de Lorraine, Centro Coreográfico Nacional de Nancy, França, está a estrear entre nós um programa que assinalou o centenário de Merce Cunningham (1919-2009), referência maior da dança do século XX. RainForest (1968), criado em colaboração com Andy Warhol, e Sounddance (1975), numa parceria com David Tudor, são duas das peças de Cunningham, a que Peter Jacobsson, responsável pelo espectáculo, acrescenta For four walls (2019), feita em parceria com Thomas Caley para o Ballet de Lorraine, com música de John Cage, outro colaborador cúmplice de Cunningham.
Em Serralves, a assinalar o último fim-de-semana da exposição Yoko Ono – O jardim da aprendizagem da Liberdade, será possível assistir (sábado e domingo, 10h00), a uma série de performances inspiradas em eventos e criações dos anos 60-70 da artista que foi sempre mais do que a mulher de John Lennon, como a sua exposição documenta. Cut piece, Voice piece for soprano, Sky piece to Jesus e Painting to shake hands são algumas das peças que serão interpretadas por Thamiris Carvalho, Carla Cruz, Xana Novais, Joana von Mayer Trindade, Gil Mac, Dori Nigro, Xavier Paes e Bruno Senune.
Em Lisboa, o Alkantara Festival, iniciado esta sexta-feira, adequou também o programa original às restrições da pandemia reagendando para este fim-de-semana (Culturgest; sábado e domingo, 11h00) a criação Still dance for nothing. É uma peça da húngara Eszter Salamon, presença recorrente em palcos portugueses, que aqui desafia a bailarina portuguesa Vânia Doutel Vaz a participar nesta partitura coreográfica que teve também na origem a música de Cage.
De regresso ao Porto, o Teatro Carlos Alberto (TeCA; sábado e domingo, 11h00) faz a última récita de A Morte de Raquel, com que a dramaturga e encenadora Raquel Castro encena o seu próprio funeral, “como se de um espectáculo se tratasse”. Estreada no Teatro São Luiz, em Fevereiro, A Morte de Raquel é uma antevisão, entre o temido e o desejado, de uma vida que se espera ainda longa, quase centenária… Com Joana Bárcia, Nuno Nunes, Raquel Castro e Rita Morais.
Na música, registe-se a continuação do Guimarães Jazz, este ano em versão maioritariamente portuguesa, também com dois concertos às manhãs: o Ensemble do saxofonista César Cardoso apresenta o disco Dice of Tenors, gravado em parceria com o pianista Óscar Graça e o baterista Marcos Cavaleiro (Grande Auditório do Centro Cultural Vila Flor; sábado, 10h30); e o Projecto Porta-Jazz, desta vez em versão quarteto liderado pelo pianista Hugo Raro, num concerto cenografado em tempo real pelo artista plástico JAS (Black Box do Centro Internacional de Artes José de Guimarães; domingo, 10h30).
Em Braga (Theatro Circo; sábado, 11h00), Tiago Sousa toca também o seu novo disco, Oh Sweet Solitude, em “deambulações ao piano”. Um trabalho que acaba de ser gravado e que reúne nove composições, abrindo com Angel of despair.
Neste ano em que se assinalam os 250 anos do nascimento de Beethoven (1770-1827), a Casa da Música, no Porto, propõe para os mais novos “um encontro ficcionado” entre o compositor e Napoleão, a quem aquele começou por dedicar a sua 3.ª Sinfonia, substituindo-a, depois de se aperceber dos intentos imperiais do general francês, pelo título Heróica (Sala de Ensaio 2; sábado, 10h30).
E continua a poder ouvir-se Beethoven também em Lisboa (Centro Cultural de Belém; domingo, 11h00), com a orquestra Melleo Harmonia, dirigida por Joaquim Ribeiro, a tocar a Sinfonia n.º 6, Pastoral, e o Concerto para piano e orquestra n.º 5, Imperador, com Marta Menezes como solista.
O Teatro Nacional D. Maria II antecipou igualmente para a manhã deste sábado (Salão Nobre Ageas, 11h00) o espectáculo para a infância estreado esta semana, Onde É a Guerra, uma desconstrução do imaginário bélico num mundo onde cada vez se constroem mais muros.
Ainda na capital, e para um público também abrangente, familiar, o recém-reactivado Teatro Maria Matos mantém em cena Avenida Q (sábado e domingo, 10h00), uma espécie de “Rua Sésamo em esteróides, que junta à estética ‘Muppets’ uma linguagem tão adulta, que só funciona mesmo porque a vida é uma longa marcha de tédio em direcção à campa”. Mas, antes desse fim incontornável — a seguir ao termo do espectáculo, queremos dizer —, o Maria Matos acena com um sugestivo “pacote espectáculo+brunch”, a completar no restaurante do vizinho Hotel Lutécia.
Depois, é ir para casa.