Quarteirão da Suíça vai tornar-se um grande espaço comercial
Projecto foi aprovado esta quinta-feira e prevê a reabilitação dos edifícios de acordo com o “conceito pombalino” original. PCP está contra. “[É] uma oportunidade perdida”, acusam vereadores.
O emblemático quarteirão do Rossio que durante décadas albergou a Pastelaria Suíça, em Lisboa, vai ser reabilitado e transformado num grande espaço comercial e de serviços. Muito degradados há anos e quase totalmente devolutos, os edifícios voltarão a ter uma traça arquitectónica pombalina.
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O emblemático quarteirão do Rossio que durante décadas albergou a Pastelaria Suíça, em Lisboa, vai ser reabilitado e transformado num grande espaço comercial e de serviços. Muito degradados há anos e quase totalmente devolutos, os edifícios voltarão a ter uma traça arquitectónica pombalina.
É essa a proposta do promotor, a empresa imobiliária JCKL Portugal, e dos arquitectos do atelier Contacto Atlântico, que esta quinta-feira vai a votos na Câmara de Lisboa. O projecto contempla a manutenção da Pérola do Rossio – a única Loja com História do quarteirão desde que a Ourivesaria Portugal e a Casa da Sorte encerraram – e a instalação de uma nova loja âncora que ocupará quase todos os pisos. Na mansarda deverão existir escritórios.
O projecto Rossio Pombalino, assim se chama, deixa de lado os usos de habitação e hotelaria que chegaram a ser pensados para o local. “O quarteirão está situado num ponto nevrálgico entre as áreas comerciais mais nobres e dinâmicas da cidade, como o são a da Avenida da Liberdade e a do Chiado. Entendemos assim, após uma cuidadosa avaliação, que o que fazia sentido para poder viabilizar o projecto e o investimento avultado requerido para a intervenção era assumir essa valência comercial do quarteirão”, explica Patrícia Rodrigues, da JCKL, ao PÚBLICO.
De acordo com esta responsável, o empreendimento “pretende vir a contribuir para ajudar a revitalizar comercialmente a zona da Baixa, tão depauperada agora pelas circunstâncias derivadas da crise pandémica”.
Confirmando ter já recebido “várias manifestações de interesse” pelo projecto e não querendo, para já, adiantar qual a loja que ocupará a quase totalidade do quarteirão, Patrícia Rodrigues refere que a expectativa do promotor é ter a obra pronta e aberta ao público “no máximo em meados de 2023”.
O primeiro passo foi dado esta quinta-feira com a aprovação do projecto de arquitectura pela câmara, a que se seguirá a apreciação do licenciamento. Os vereadores do PCP já anunciaram que estão contra a proposta. “Mais uma vez estamos a assistir a uma oportunidade perdida de dotar o centro da cidade de uma multifuncionalidade desejável que mantenha a cidade habitada e viva, preservando o património e a história da cidade”, disseram os comunistas, em comunicado. “O PCP considera que não é através de megaempreendimentos comerciais que se revitaliza o centro histórico de Lisboa.”
Devolver o “conceito pombalino”
Uma das características principais do projecto é a sua vontade em recuperar os cinco edifícios do quarteirão seguindo as normas do Cartulário Pombalino, um conjunto de documentação técnica que foi produzido depois do terramoto de 1755 com normas sobre como edificar a nova Baixa de Lisboa.
Assim, estão previstas mudanças profundas sobretudo no rés-do-chão e no telhado para os aproximar da matriz e estética pombalinas. No local onde funcionou a Pastelaria Suíça, por exemplo, as portas e janelas que ainda caracterizam uma grande parte da Baixa foram há muito substituídas por outros modelos, mas deverão agora retomar o traçado original.
Tratar-se-á de “uma intervenção contida e fiel ao original”, explica Francisca Alves, do atelier Contacto Atlântico, num vídeo divulgado há dois dias pelo Mirage Virtual Reality, estúdio 3D, em que se explicam as principais linhas do projecto. “Propomos a uniformização da cobertura com uma solução mais próxima da Baixa Pombalina e da sua envolvente próxima”, diz a arquitecta.
Explicando que as diferentes ocupações comerciais foram adulterando a estrutura do quarteirão, o arquitecto André Caiado diz, no mesmo vídeo, que “o edifício [se] encontra em muito mau estado” e que faltam muitas paredes interiores. “No piso zero vamos ter oportunidade de repor o pavimento em lajes de lioz”, acrescenta, referindo-se também à manutenção dos tectos trabalhados, das escadas e de um elevador, embora este seja posterior ao século XVIII. “A nossa perspectiva para a reabilitação deste edifício é a mesma que já tivemos em tantos outros na Baixa Pombalina: trazer de novo a originalidade do conceito pombalino para o edifício”, conclui André Caiado.
Está igualmente prevista a reabilitação e manutenção do mobiliário e da pintura do tecto da antiga Manteigaria União, bem como o cunhal ornamentado da antiga Ourivesaria Portugal. Desde o encerramento da Pastelaria Suíça, em 2018, de uma espingardaria, e mais recentemente da ourivesaria e da Casa da Sorte (já durante a pandemia), o quarteirão é ocupado somente pela casa de chás e cafés Pérola do Rossio, uma loja histórica classificada pela Câmara de Lisboa.
Há dois anos, a autarquia retomou um controverso projecto de colocação de azulejos em todas as fachadas da Praça da Figueira e o primeiro contemplado foi o quarteirão da Suíça. Patrícia Rodrigues diz que não compete ao promotor “emitir opiniões” sobre o assunto e que este fará o que o município decidir. Em 2018, a câmara disse ao PÚBLICO que só aprovaria licenciamentos de obras na praça, se estes contemplassem a colocação dos azulejos.