Menos alarido e menos festejos: como o país prepara o Natal e a passagem de ano
Não serão apenas os eventos que assinalam a passagem de ano que deverão sofrer alterações com a pandemia. Já há autarquias a cancelar várias actividades natalícias. E a ponderar, por exemplo, iniciativas online.
Quando as 12 badaladas se fizerem ouvir, 2021 deverá chegar às ruas de Portugal com menos festejos do que aqueles que habitualmente enchem as ruas e praças. E, já antes disso, o Natal será assinalado com menos programação em diferentes cidades.
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Quando as 12 badaladas se fizerem ouvir, 2021 deverá chegar às ruas de Portugal com menos festejos do que aqueles que habitualmente enchem as ruas e praças. E, já antes disso, o Natal será assinalado com menos programação em diferentes cidades.
Várias autarquias estão a suspender eventos de Natal e passagem de ano. No Porto, não haverá fogo-de-artifício para assinalar o novo ano, em Lisboa, não haverá concerto no Terreiro do Paço. Há quem esteja a tentar adaptar as actividades ao universo virtual e municípios que ainda estão a decidir o que fazer. No horizonte, apenas uma certeza: será um Natal e uma entrada num novo ano diferentes e adaptados às regras da pandemia.
Neste ano, na Madeira, salva-se o fogo-de-artifício, que assinala a passagem de ano, as iluminações de Natal nas ruas do Funchal e das principais localidades do arquipélago, e pouco mais. A “festa”, como os madeirenses se referem ao período que começa bem antes do dia 25 de Dezembro, e termina já por Janeiro dentro, vai, este ano, ser “a possível”.
“Nem o governo nem a autoridade de saúde regional vão autorizar eventos de Natal ou na ‘festa’, que permitam a concentração de cidadãos e constituam um risco para a saúde pública”, reforçou, nesta quinta-feira, o presidente do executivo madeirense, Miguel Albuquerque. Aos jornalistas, Albuquerque explicou que tudo o que for considerado um “risco para a saúde pública”, e que seja “propenso a criar focos de transmissão” não será autorizado.
De fora do calendário do Natal, ficam as missas do parto que tradicionalmente terminam em festa, no adro das igrejas. O executivo já acordou com a Diocese do Funchal que não serão promovidos convívios no final das cerimónias religiosas. As restrições chegam ao grande evento do Natal na Madeira: a Noite do Mercado no Funchal. Tradicionalmente na noite de 23 de Dezembro e na madrugada do dia seguinte, milhares de madeirenses e turistas confluem para a baixa do Funchal, junto ao Mercado dos Lavradores, onde músicas tradicionais e muita bebida assinalam a data.
A Câmara Municipal do Funchal quer manter, pelo menos, parte da tradição, circunscrevendo o dia aos cantares tradicionais, mantendo assim a “componente mais histórica e tradicional”. Miguel Gouveia, autarca da cidade, já remeteu um plano à autoridade de saúde regional, mas ainda não obteve resposta. “A Noite do Mercado como nós conhecemos não se vai realizar”, vincou, já esta semana, Albuquerque, que admite autorizar uma versão reduzida do parque de diversões de Natal, com menos equipamentos. “Se conseguirmos ter distanciamento e segurança, sim. Se não for possível, não vai haver.”
Lisboa e Porto com mudanças
Em Lisboa, confirmou o PÚBLICO junto de fonte de autarquia, também não está prevista este ano a realização de um concerto no Terreiro do Paço, para celebrar a chegada de 2021. Quanto ao Natal, haverá luzes e uma árvore na emblemática praça da cidade, mas sem inauguração, para evitar ajuntamentos numa altura em que os números da covid-19 continuam a desassossegar o país. Também não estão programadas iniciativas de rua.
No Porto, a câmara já tinha igualmente anunciado alterações na quadra natalícia e nos festejos de ano novo. Haverá iluminação, mas não haverá árvore de Natal nem fogo-de-artifício na passagem de ano. O motivo é sempre o mesmo: evitar aglomerações. “A árvore de Natal que, anualmente, se ergue imponente diante dos Paços do Concelho, não será este ano montada, entendendo a autarquia que a sua existência poderia tornar-se foco de aglomeração de pessoas”, anunciou a câmara municipal.
Na mesma nota, acrescentou: “E, na noite do dia 31 de Dezembro para 1 de Janeiro, as 12 badaladas no relógio da câmara municipal não serão acompanhadas pelo sempre muito aguardado fogo-de-artifício, que nos últimos anos tem levado milhares de portuenses e visitantes à Avenida dos Aliados.” Quanto à agenda de festejos, “que inclui concertos na Avenida, pistas de gelo localizadas em diferentes pontos da cidade, teatros de rua, contos para crianças, miniconcertos itinerantes pela baixa da cidade, promovida pela empresa municipal Ágora - Cultura e Desporto do Porto, fica também suspensa em 2020”.
Iniciativas online e estímulo ao comércio local
Já em Faro haverá iluminação de Natal, mas o orçamento que costumava ser usado noutras actividades natalícias será aplicado no estímulo do comércio local, como explicou ao PÚBLICO o vice-presidente da autarquia. A ideia permitirá entregar vouchers a famílias que serão sorteados semanalmente, de maneira a estimular o consumo no município. No que toca à passagem de ano, e embora se preveja que as 12 badaladas sejam assinaladas com fogo-de-artifício, outros eventos que aglomerem muita gente, como espectáculos ou concertos, estão cancelados.
Também em Caminha, o presidente da autarquia anunciou, logo no início do mês, o cancelamento, até Fevereiro de 2021, de “todos os eventos culturais, desportivos e lúdicos que não permitam controlo efectivo sobre lotação, circuitos e distanciamento social”. Segundo avançou à agência Lusa, estão canceladas, entre outras, várias actividades de animação natalícia, feiras, concerto de Ano Novo, festa de passagem do ano e até o desfile nocturno de Carnaval, já em Fevereiro de 2021. “O meu apelo é simples: cumpram as regras de higienização e distanciamento social, cumpram as medidas do Governo. E mais, nos próximos tempos esqueçam as jantaradas com a família toda, adiem as cerimónias que tinham pensado fazer com a presença dos amigos, evitem o convívio com os colegas de trabalho ao final do dia, deixem para o ano o jantar de Natal da empresa”, disse, na altura, Miguel Alves.
Em Coimbra, a câmara municipal também já fez saber que, apesar do reforço da iluminação de Natal, a restante programação de Natal foi cancelada. A autarquia “decidiu cancelar todas as iniciativas que habitualmente constituem a programação de Natal, que o município empreende há sete anos consecutivos, tendo em consideração as medidas de contingência da pandemia covid-19 e por entender que estas se poderiam tornar num foco incontrolável de aglomeração de pessoas”, avançou na quarta-feira a autarquia, em nota enviada à Lusa. Ficam, assim, sem efeito a pista de gelo, o carrossel parisiense, o concerto de inauguração da iluminação de Natal, animação de rua, actividades infantis, entre outras iniciativas. Quanto à festa da passagem de ano, e apesar de considerar que não se irá realizar nos moldes habituais, ainda está a avaliar “como poderá animar a noite” no actual contexto pandémico e “depois de um ano particularmente difícil para todos, apelando a que todos fiquem em segurança nas suas habitações”.
Segundo explicou o presidente da autarquia, Manuel Machado, ao PÚBLICO, em vez de concertos, de animação de rua e de uma rave, Coimbra irá assinalar a chegada do novo ano de outra forma: a autarquia pretende fazer gravações vídeo e áudio com bandas e grupos da cidade que divulgará, depois, através das redes sociais e outras plataformas online naquela noite. Além disso, para evitar aglomerações junto ao rio, onde costumava ser montada a operação de fogo-de-artifício, o que está em cima da mesa é escolher pontos diferentes nas 18 freguesias, apenas divulgados pouco antes, a partir dos quais será lançado o fogo-de-artifício, para que as pessoas possam assistir ao momento das janelas.
“O conhecimento que tenho é de reagendamento dos espectáculos de Natal e de passagem de ano para logo que seja possível fazê-los em vários municípios do país, havendo o pagamento antecipado de uma parte desses espectáculos. Este sector está a ser muito sacrificado, como outros também. As actividades artísticas e recreativas são muito importantes também para não se deixar morrer a esperança”, diz o também presidente a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Também o município da Guarda anunciou, igualmente, o cancelamento das iniciativas de Natal: “Face à evolução da pandemia covid-19, este ano não se realizam os eventos da época natalícia ‘Guarda Cidade Natal’, ‘Madeiro do Natal’ e ‘Alta Passagem de Ano’”, informou. Noutro ponto da região Centro, também não haverá o evento ‘Óbidos Vila de Natal’. Haverá, antes, percursos pela vila, que estará ornamentada, e algumas actividades.
Em Braga, fonte da autarquia explicou ao PÚBLICO que o programa das festas de Natal e de passagem de ano ainda está a ser elaborado, sem que haja para já uma versão definitiva. Porém, à semelhança de outros municípios, tudo indica que haverá alterações. No caso, está a pensar-se na possibilidade de transmissão online de alguns eventos, caso não seja possível terem público. Haverá iluminação de Natal, a árvore de Natal no centro da cidade e algum tipo de animação cultural, tentando equilibrar-se o cumprimento das normas de saúde com a actividade do comércio local. Quanto à passagem de ano, ainda há indefinição sobre o que irá a autarquia organizar, mas cenários com concertos e festas com DJ estarão certamente afastados do horizonte, em contexto de pandemia e com as regras que podem ir sofrendo alterações. Também Guimarães está ainda a ponderar que solução adoptar para as celebrações do Natal e da passagem de ano, esperando-se novidades no início da próxima semana.
Maioria dos eventos cancelados
A Associação Portuguesa de Empresas de Congressos, Animação Turística e Eventos (Apecate) já tinha dito ao PÚBLICO que, logo depois do anúncio de que o país entraria em situação de calamidade (agora já está em estado de emergência), os membros desta associação viram 80% dos eventos de Natal cancelados. “As festas de Natal presenciais foram, na sua maioria, canceladas, passando algumas delas para formato online e outras para acções diferentes, como, por exemplo, acções de charme em que entregamos em casa dos colaboradores uma oferta de Natal. A indicação que temos é que a maioria das autarquias está a cancelar, ou já cancelou, as suas iniciativas de Natal, ficando só por acções que não implicam a participação directa de público”, disse numa resposta enviada por escrito. A estas informações acrescenta, quando questionada nesta quinta-feira, que “os grandes eventos de fim de ano, normalmente promovidos pelas autarquias estão na sua maioria, ou mesmo na sua totalidade cancelados” e que também “as provas de desporto, associadas à passagem de ano, estão canceladas”, como as corridas de São Silvestre.
O presidente da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo, Pedro Costa Ferreira, acrescenta: “O sector está completamente paralisado.” As perspectivas deste responsável não são animadoras. Acredita que a quebra de actividade no sector poderá ser, nesta fase, superior a 90%, com falta de reservas e cancelamento de algumas que tinham sido feitas. “Será o pior fim de ano de que tenho memória. Estou a referir-me a reservas de lazer, sejam de viagens para estrangeiro ou mesmo estadias em Portugal, no ano novo. Não tenho boas previsões, neste momento estamos em modo de sobrevivência. Estamos em diálogo com o governo para obtenção de apoios para sobreviver”, lamenta.