Defendamos a vida
Senhoras deputadas e senhores deputados, volto a dirigir-me a vós: se votardes pela “despenalização da morte a pedido”, estais a cometer um ato antidemocrático.
Viver e ser feliz são os dois maiores anseios de qualquer ser humano. Porém, ninguém pode ignorar que viver é um risco contínuo e a felicidade não se adquire, constrói-se. Para minimizar os riscos que, inesperadamente, surgem ao longo da existência, há que criar condições para que eles se possam ir minimizando, sendo certo que, dadas as limitações endógenas à condição do ser e da natureza em geral, nunca será possível eliminar os riscos. O que há a fazer é enfrentá-los e isso tem sido o grande desafio lançado aos homens e mulheres de cada tempo. Muitos riscos vão sendo, assim, aniquilados e os mais complexos tornados mais suportáveis. A propensão para a vida é um desígnio tão natural que a morte, apesar de ser o único risco insuperável, se torna para muitos um tabu e para outros antinatural.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Viver e ser feliz são os dois maiores anseios de qualquer ser humano. Porém, ninguém pode ignorar que viver é um risco contínuo e a felicidade não se adquire, constrói-se. Para minimizar os riscos que, inesperadamente, surgem ao longo da existência, há que criar condições para que eles se possam ir minimizando, sendo certo que, dadas as limitações endógenas à condição do ser e da natureza em geral, nunca será possível eliminar os riscos. O que há a fazer é enfrentá-los e isso tem sido o grande desafio lançado aos homens e mulheres de cada tempo. Muitos riscos vão sendo, assim, aniquilados e os mais complexos tornados mais suportáveis. A propensão para a vida é um desígnio tão natural que a morte, apesar de ser o único risco insuperável, se torna para muitos um tabu e para outros antinatural.
Ser feliz não é alcançar o bem-estar total e definitivo. Face às limitações naturais da existência ninguém, jamais, conseguirá ser, intrinsecamente, feliz. Conforme as conquistas do bem que for alcançando, assim se sentirá mais em harmonia consigo e com os outros. Mas ninguém, por mais feliz que diga ser ou sentir-se, o conseguirá em plenitude. Como se diz que o “dia tem 24 horas”, não se pode esquecer que umas quantas delas são noite, também no nosso viver, apesar de, no âmago de cada ser humano, o anseio dominante, seja em que condição for, é ser feliz, é impossível não haver tempos, mais longos ou mais curtos, de sofrimento. É nos dispormos a “jogar” este jogo ou não pertencemos a este “campeonato”. Há jogos solitários, mas os mais estimulantes são os que se realizam em equipa. Todavia, tanto uns como outros precisam de táticas. No jogo da vida aquela que mais nos pode aproximar da vitória é o amor. Entrar no jogo sem uma tática definida e sem esperança de vencer é assumir, desde logo, a derrota.
Porém, “Quem se obriga a amar, dispõe-se a padecer”, diz o nosso povo na sua eloquente sabedoria. Também é verdade que ninguém será capaz de amar se não for amado. É importante, por isso, que cada pessoa se saiba amar primeiro que tudo para reunir condições de amar os outros. Mas amar-se em excesso facilmente se converte em narcisismo, obrigando que todo o mundo gire à sua volta. Amar é ser-com-os-outros. Isso obriga a dedicação, a cuidado, a compreensão, a compaixão, a renúncia, a entrega, a paciência, a silêncios, a denúncias…. Daí a analogia que o provérbio português faz entre o amor e o padecimento, aceite, mas não provocado. Isso seria um padecer masoquista. Quando assim é, trata-se de um distúrbio mental e não de uma consequência do amor.
Quero partilhar convosco esta reflexão para, em minha opinião, pensarmos o que está em causa quando se reclama pelo direito de “morrer a pedido”. Independentemente do conceito, não deixa de ser uma forma da prática da eutanásia, dita de uma forma mais soft. Tenho dúvidas de que se nos dispusermos a “sofrer com”, ou seja, a compadecer-nos; a sermos “solidários com” nos tempos mais sombrios da vida; a canalizarmos os recursos monetários para gerar mais vida, quero dizer, com menos sinais de morte como é o sofrimento; a usar mais a justiça que os interesses corporativos e ideológicos para que o bom que a todos pertence por todos seja distribuído segundo as objetivas necessidades… alguém deseje a morte.
Senhoras deputadas e senhores deputados, volto a dirigir-me a vós, fostes eleitos para responder aos legítimos anseios dos vossos eleitores. Nunca nos disseram que, ao sentarem-se numa das cadeiras da sala mais nobre da “Casa da Democracia”, iriam aprovar a possibilidade de facilitar a morte a quem, cansado do esquecimento a que é votado – alguém e os seus familiares – se lhe vai esmorecendo o sentido e a vontade de viver. Não fostes mandatados para isso. Por isso, se votardes pela “despenalização da morte a pedido”, estais a cometer um ato antidemocrático.
E, por favor, não me chamem demagogo, pois sabeis que a minha preocupação pelo bem-estar dos meus concidadãos e concidadãs não se resume a duas etapas da existência, mas ao longo da vida toda.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico