Sud Expresso celebra 133 anos mas não se sabe se está apenas suspenso ou morto
O mítico comboio Sud Expresso iniciou a sua exploração entre Lisboa, Madrid, Paris e Calais a 4 de Novembro de 1887. Desde Março que o serviço se encontra suspenso.
Foi um dos primeiros grandes expressos europeus que começaram a cruzar o velho continente nos finais do séc. XIX. O seu criador, o empresário belga Georges Nagelmarkers, que fundou a Compagnie Internationale de Wagons Lits et des Grands Express Européens, alimentava o sonho de criar um comboio directo entre Moscovo e Lisboa, tarefa que se revelou impossível com os nacionalismos da época.
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Foi um dos primeiros grandes expressos europeus que começaram a cruzar o velho continente nos finais do séc. XIX. O seu criador, o empresário belga Georges Nagelmarkers, que fundou a Compagnie Internationale de Wagons Lits et des Grands Express Européens, alimentava o sonho de criar um comboio directo entre Moscovo e Lisboa, tarefa que se revelou impossível com os nacionalismos da época.
Mas o Sud Expresso acabaria por se tornar um dos mais icónicos comboios, a par do Expresso do Oriente, ao ligar Paris a Lisboa com uma velocidade e um conforto sem precedentes. Realizava-se uma vez por semana e demorava 45 horas para ligar o Sena ao Tejo passando ainda por Madrid. Mas o sucesso desta ligação foi tão grande que seis meses depois já circulava duas vezes por semana, passando a trissemanal três anos depois.
Em 1895 a viagem foi encurtada em 195 quilómetros, passando o Sud a circular pela linha da Beira Alta, sem ter de prestar vassalagem a Madrid e reunindo-se com o ramo espanhol na estação de Medina del Campo.
A rapidez da viagem – dois dias e uma noite entre França e Portugal – levou as companhias de navegação a alterar as suas rotas adequando os horários dos navios à chegada do Sud Expresso a Lisboa. Agora, para viajar da Europa para África ou para a América do Sul, poupava-se três dias de navegação marítima e evitava-se a conturbada passagem do Golfo da Biscaia.
O Sud transportou aristocratas, milionários, diplomatas, espiões, gente endinheirada que podia usufruir do wagon lit (carruagem-cama) e das lautas refeições servidas no restaurante em talheres de prata.
Eça de Queirós referia-se à chegada do Sud à estação do Rossio, de onde as últimas edições literárias vindas da cidade luz seguiam directamente para a elite intelectual que frequentava a Brasileira do Chiado. Por essa altura, o Hotel Avenida Palace, no Restauradores, tinha uma comunicação directa com a estação do Rossio para receber os clientes do prestigiado comboio.
E é tendo em conta a clientela burguesa que viajava, perdão, que frequentava, este comboio, que, nos anos 30 do século passado, a carruagem-cama do Sud passa a seguir directamente para o Estoril, ajudando a consolidar aquela vila como estância de férias internacional.
Na segunda metade do século XX o Sud perde o seu glamour. Nos anos 70 transporta emigrantes para França a que se juntam, nos anos 80, jovens em Interrail. Mas nunca deixou de ter um “segmento de mercado” mais restrito que viajava na carruagem-cama e escolhia os melhores vinhos na carruagem-restaurante.
Em 2013 é-lhe retirada a carruagem-restaurante, uma medida justificada pela redução de custos. Por esta altura o Sud já não é composto por material convencional nem possui o tradicional Wagon Lit de cor azul. É uniformizado com carruagens Talgo, alugadas pela CP a Espanha. A sua exploração é realizada pela CP e em Hendaya a ligação a Paris é feita pelo TGV.
Em Março deste ano, devido à pandemia, a sua circulação é suspensa, bem como do seu homólogo Lusitânia Expresso (Lisboa – Madrid). Os prejuízos do serviço e o desinteresse da Renfe pelo serviço internacional entre Espanha e Portugal têm levado ao arrastar de uma situação que também não despertou grande interesse ao nível dos governos dos dois países.
As duas composições que estavam estacionadas em Santa Apolónia foram enviadas para Madrid. Hoje não há qualquer registo físico do Sud Expresso, o qual poderá voltar a circular com o mesmo material Talgo, em regime de comboio-hotel, ou com material convencional, sendo certo que terá de incluir sempre carruagem-cama ou, no mínimo, carruagens com beliche para se viajar deitado.
Aos 133 anos não se sabe se o Sud está apenas suspenso ou morto. Não é a primeira vez ao longo da história que este serviço se interrompe. Esteve suspenso entre finais de 1914 e 1922, de 1936 a 1939 e de 1940 a 1947, coincidindo com a Guerra Civil Espanhola e as duas guerras mundiais, mas foi sempre retomado.