Incerteza na aviação é oportunidade para repensar aeroporto do Montijo
Recuperação do tráfego aéreo pode demorar entre cinco a 15 anos. Especialistas defendem plano estratégico de longo prazo para o sector aeroportuário.
A incerteza que a covid-19 veio trazer sobre o transporte aéreo aumenta o risco das decisões de investimento pelo que, no caso português, era útil avançar já para um plano estratégico de longo prazo tendo em conta que qualquer decisão hoje sobre um novo aeroporto demora, no mínimo, 15 anos a concretizar-se.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A incerteza que a covid-19 veio trazer sobre o transporte aéreo aumenta o risco das decisões de investimento pelo que, no caso português, era útil avançar já para um plano estratégico de longo prazo tendo em conta que qualquer decisão hoje sobre um novo aeroporto demora, no mínimo, 15 anos a concretizar-se.
Esta a opinião de Rosário Macário, investigadora em Transportes e a única mulher oradora no congresso da Adfersit - Associação Para a Defesa dos Sistemas Integrados de Transportes (um sector maioritariamente masculino), que diz que é muito difícil estimar o tempo de recuperação da procura no transporte aéreo até aos níveis de Fevereiro de 2019. “Tanto pode demorar cinco como 15 anos”, disse.
Artur Ravara, ex-presidente do LNEC, acrescentou ainda mais um factor de incerteza sobre o futuro do sector ao lembrar que “o aquecimento climático e as medidas que vão ser adoptadas para o evitar colocam o transporte aéreo no olho do furacão”. Alguns países estão a restringir os voos domésticos até 600 quilómetros desde que haja alternativa ferroviária.
É tendo em conta este tempo que o sector vai demorar a crescer, que o especialista considera que é altura de repensar o Montijo e recolocar Alcochete em cima de mesa. “Complementar por complementar, que seja Alcochete porque tem a vantagem de ser mais flexível”, disse Artur Ravara, acrescentando que esta solução poderia ser feita só com uma pista – tal como o Montijo – podendo depois evoluir para o futuro aeroporto de Lisboa se e quando a procura o justificar.
Esta proposta depara-se, porém, com a determinação do Governo em não querer mais discutir o assunto, numa decisão que está em sintonia com o grupo Vinci (detentor da ANA – Aeroportos de Portugal) que pretende ter o Montijo como complemento ao aeroporto Humberto Delgado.
Rosário Macário sublinhou que uma coisa é o “modelo de negócio privado” da Vinci e outra é a “visão estratégica pública para o desenvolvimento do transporte aéreo no país”. Em seu entender, o Montijo é uma solução de curto prazo para um problema de curto prazo o qual, quanto muito, pode ser comparado com Alverca, também na óptica de aeroporto complementar e de curto prazo. Mas o que é importante é pensar já o futuro aeroporto de Lisboa e daí a necessidade de um plano estratégico de longo prazo “que contemple o sector do turismo e o desenvolvimento urbano e regional”.
A também professora universitária estudou o futuro provável do transporte aéreo e diz que, apesar de toda a incerteza, é indispensável manter Lisboa como hub para a América do Sul por ser um segmento de mercado com grandes possibilidades de crescimento. Por outro lado, prevê uma redução do segmento de business “que poderá representar uma oportunidade para as companhias aéreas low cost”.
No mesmo painel, Bernardo Trindade, que já foi secretário de Estado do Turismo e é administrador da PortoBay Hotels & Resorts, teve uma posição mais pragmática. Concordou com os outros dois oradores, mas gostaria de ver uma solução rápida para responder ao crescimento da procura de turistas que espera, e deseja, no pós-covid. “Não sei o que era isso de haver ‘turismo a mais’, mas sei muito bem agora o que é o ‘turismo a menos’”, afirmou.