Geração fast forward
Frequentemente os jovens fazem fast forward num filme ou num episódio de uma série, se acharem que a cena é irrelevante para o enredo da história ou se desenrola num ritmo mais lento, não compatível com o ritmo frenético de consumo de media a que estão habituados.
Os jovens da geração atual estão a transformar por completo a forma como os conteúdos digitais são consumidos, levando a que a própria indústria se tenha de adaptar a este novo paradigma.
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Os jovens da geração atual estão a transformar por completo a forma como os conteúdos digitais são consumidos, levando a que a própria indústria se tenha de adaptar a este novo paradigma.
É comum dizer-se que vivemos num mundo cada vez mais acelerado, e que nos falta tempo para que possamos realizar todas as tarefas do dia a dia, seja no trabalho ou em contexto familiar. No “tempo da urgência” em que estamos, julgamos que a urgência da execução de uma tarefa e a produção estão intrinsecamente ligados. E sentimo-nos ansiosos e angustiados quando não acompanhamos essa aceleração.
Se a tecnologia simplificou e automatizou tarefas, também nos obrigou a acompanhar o ritmo acelerado dos dispositivos que nos notificam e nos mantêm constantemente online e hiper conectados, obrigando-nos a produzir mais, mas num muito menor espaço de tempo.
Nos atuais modelos de gestão organizacional, o tempo é valorizado e racionalizado ao limite, o que leva a que tenhamos de otimizar o tempo na nossa vida profissional. A nossa eficiência é posta à prova diariamente, através da premência da execução de tarefas que as máquinas espreitam por ansiosamente concorrer. Transportamos esta preocupação de gerir e aproveitar ao máximo cada segundo do nosso tempo, fazendo com que nos sintamos culpados se não conseguirmos otimizar também as tarefas pessoais e os nossos tempos livres.
Contudo, é nos jovens da Geração Z e millennials que mais se sente a aceleração do nosso quotidiano. Como escrevi há uns tempos noutro artigo de opinião , a tecnologia está a tornar as novas gerações cada vez mais insatisfeitas e ansiosas por novos estímulos, por novos conteúdos, mantendo-os numa insatisfação e ansiedade permanente.
A forma como os jovens consomem podcasts, filmes e música nas plataformas digitais é a prova da aceleração em que vivemos. Um recente estudo de da Statista mostrou que 26% de jovens americanos com mais de 12 anos, que responderam ao inquérito da investigação, ouvem regularmente os conteúdos de podcasts no dobro da velocidade de reprodução (2x), e em alguns casos até superior. Este valor representa um aumento de 7% quando comparado com o ano anterior, o que demonstra a tendência crescente deste comportamento de consumo nos conteúdos digitais. O mesmo acontece com filmes, séries e outros conteúdos de cinema e TV nas principais plataformas de streaming. A procura por esta funcionalidade foi tão grande por parte dos utilizadores da Netflix, que levou a que a empresa norte-americana incluísse esta opção de alteração da velocidade de reprodução nas suas aplicações, já vulgarmente utilizada por exemplo no Youtube.
A quantidade gigantesca de conteúdos digitais que atualmente podemos aceder e a escassez de tempo são os principais fatores apontados para esta alteração de consumo neste tipo de conteúdos digitais. Embora o aumento da velocidade de reprodução provoque que haja uma perda de compreensão e de informação dos conteúdos consumidos, os jovens não se sentem culpados por isso.
Frequentemente os jovens fazem fast forward num filme ou num episódio de uma série, se acharem que a cena é irrelevante para o enredo da história ou se desenrola num ritmo mais lento, não compatível com o ritmo frenético de consumo de media a que estão habituados. Esta impaciência permanente é também evidente no abandono dos jovens da geração Z pelas salas de cinema. Assistir a um filme num cinema é uma experiência desconfortável para quem desde cedo habitou-se a saltar cenas e a acelerar a visualização de um filme.
As indústrias cinematográfica e musical, obviamente atentas a estes fenómenos, têm ajustado os conteúdos aos padrões de consumo digital em que vivemos. O número médio de episódios das séries televisivas baixou de 22 em 2003 para 12 na atualidade, tendo a duração de cada episódio também sido gradualmente reduzida. Os cantores e produtores musicais têm também vindo a limitar a duração das suas músicas e com uma crescente preocupação em conteúdo musical que possa ser facilmente integrado em formatos de escassos segundos nas redes sociais com o Instagram Stories e TikTok.
Permanentemente insatisfeitos, os jovens destas gerações cresceram numa era em que o tempo é otimizado em todos os contextos e valorizado por todos que os rodeiam, provocando-lhes esta ansiedade pela absorção da maior quantidade de informação que conseguirem. No futuro, o fast forward será provavelmente substituído pelo pause, num mundo que não conseguirá mais acelerar.