Autora do Jardim de Sophia, no Porto, diz que o seu trabalho foi desrespeitado
Souto de Moura recusa-se a alimentar polémica com arquitecta paisagista, que garante que tentou participar no projecto de redefinição daquele espaço público que desenhou nos anos 90. O jardim “está inviabilizado” com a futura estação, nota o projectista do Metro.
A arquitecta Marisa Lavrador, autora do jardim de Sophia, na Praça da Galiza, acusa a empresa Metro do Porto de desrespeitar o seu direito de autoria daquele espaço que vai ser reconfigurado com a construção da Linha Rosa do Metro, a não lhe ter dado a oportunidade de intervir no projecto. Esta forma de agir, explicou, entra em contradição com a atitude da empresa em 2009. Nessa altura, a equipa interna da Metro que projectou a Linha do Campo Alegre – que não veio a ser construída – convidou-a a participar, tendo em conta que o traçado afectava o Parque da Pasteleira, de que é autora também. Uma atitude “correcta”, insiste, que valoriza o papel dos arquitectos paisagistas nestes projectos com impacto na paisagem urbana.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A arquitecta Marisa Lavrador, autora do jardim de Sophia, na Praça da Galiza, acusa a empresa Metro do Porto de desrespeitar o seu direito de autoria daquele espaço que vai ser reconfigurado com a construção da Linha Rosa do Metro, a não lhe ter dado a oportunidade de intervir no projecto. Esta forma de agir, explicou, entra em contradição com a atitude da empresa em 2009. Nessa altura, a equipa interna da Metro que projectou a Linha do Campo Alegre – que não veio a ser construída – convidou-a a participar, tendo em conta que o traçado afectava o Parque da Pasteleira, de que é autora também. Uma atitude “correcta”, insiste, que valoriza o papel dos arquitectos paisagistas nestes projectos com impacto na paisagem urbana.
Passada uma década, a autora do Jardim de Sophia está profundamente desiludida, e ainda magoada, com a forma como foi tratada neste outro processo, quer pelo dono da Obra, a Metro, quer também por Eduardo Souto de Moura, com o qual se reuniu duas vezes, a segunda delas já em Setembro do ano passado. Convidada para uma primeira reunião no gabinete do prémio “Pritzker”, três meses antes, ainda acreditou, por minutos, que a estavam a chamar para ser voz activa na redefinição daquele espaço público que desenhara em 1997, mas saiu dali já convicta de que tal, dificilmente, iria acontecer.
“O Engenheiro Victor Silva, representante da Metro, disse-me, no final dessa reunião, que o projecto das estações do metro tinha sido entregue, na totalidade, ao gabinete de Souto de Moura, e que caberia a este convidar-me, ou não, como entendesse fazer”, descreveu ao PÚBLICO. Garante que ainda lhe disseram ali que “voltariam a falar” mas, depois disso, acrescenta, tentou por várias vezes contactar aquele gabinete, sem sucesso. Quando lhe responderam, foi-lhe argumentado que, estando prevista a destruição do jardim, dificilmente poderia ser invocado, neste caso, qualquer direito autoral a intervir.
Destino do jardim contestado em petição
A perspectiva de destruição do jardim para escavação do túnel e implantação do estaleiro das obras da Linha Rosa levou esta semana várias associações ambientalistas a acusar a Metro do Porto de violar a Declaração de Impacte Ambiental (DIA) desta obra, e a pedir que o Relatório de Conformidade Ambiental do projecto de Execução da mesma seja chumbado pela Agência Portuguesa do Ambiente. A DIA exigia que a Metro tomasse medidas para a preservação do jardim, pela importância que lhe é atribuída, mas o que a Metro propõe, afinal, é uma reconstrução, com abate de dezenas de árvores e plantação de outras.
Marisa Lavrador não lutou, contudo, pela preservação integral da obra de que é autora, mas pelo direito a ter uma palavra a dizer nessa reconstrução daquele espaço por via da chegada do metro. “Passaram mais de 20 anos, o jardim está maduro para as funções ecológicas, sociais e paisagísticas para que foi pensado”, diz por um lado, “mas nada é intocável”, assume, referindo, até, que o projecto original tinha alguns defeitos que hoje procuraria corrigir, como a ausência de circuitos acessíveis a pessoas com mobilidade reduzida, entre outros. E foi por achar que lhe deveria ser dada a oportunidade de intervir que se voltou para a Câmara do Porto, conseguindo uma reunião com o vice-presidente Felipe Araújo, a 7 de Setembro do ano passado, explica.
Nesse encontro, explica ter ficado surpreendida por ver que também estariam presentes o mesmo representante da Metro, director de obras da empresa, e Eduardo Souto de Moura. Sem entrar em grandes detalhes sobre o encontro, garante que dali não saiu convite nenhum por parte do arquitecto responsável pelo projecto global da linha, como a Metro – e o próprio Souto de Moura, esta quinta-feira, ao JN – referem ter existido. “Isso não é verdade. Disseram-me que o projecto teria de ser entregue até 30 de Setembro. Faltavam vinte dias”, nota, lembrando que nunca quiseram a sua colaboração antes, e que fora ela que pedira aquela reunião, com o vereador, depois de lhe terem fechado outras portas.
Souto de Moura não quer alimentar polémica
Eduardo Souto de Moura recusa-se a alimentar uma polémica com Marisa Lavrador, mas insiste que lhe fez o convite, nesse encontro de Setembro, e que esta recusou por não ter tempo. “Tenho quatro testemunhas”, garante, assumindo que se encarregará do projecto do novo arranjo da superfície da Estação Galiza, com apoio de engenheiros agrónomos. A autora do Jardim de Sophia contrapõe, afirmando que lhe foi dito que não havia orçamento para integrar nenhum novo elemento na equipa projectista, mas que poderia, ainda assim, “dar algumas sugestões”.
Marisa Lavrador não isola este caso com o que acontece no panorama nacional, em que a classe dos arquitectos paisagistas ainda luta pelo direito a ver reconhecido o seu trabalho, a importância dele na definição da paisagem e no ordenamento do território e, por tudo isto, a ver reconhecido, também, o seu direito a ver respeitada a autoria dos projectos. Lembra que muitos, na senda de Francisco Caldeira Cabral e Gonçalo Ribeiro Telles lutaram para que a arquitectura paisagista fosse valorizada pela sociedade, mas nota que, neste, como em muitos outros casos, isso, na sua perspectiva voltou a não acontecer.
Souto de Moura nega qualquer desrespeito. “O jardim passou a estar inviabilizado quando se assumiu que o metro tinha ali uma estação”, frisa, assumindo, por seu lado, que, mesmo não tendo responsabilidade nos traçados das linhas de metro do Porto, já se habituou a ser criticado pelo impacto dos seus projectos em outros espaços públicos da cidade. Mesmo, acrescenta, quando consegue minimizar as árvores a sacrificar, como se viu no Jardim do Marquês, recorda. Considera, por isso, que mal os projectos destas estações estejam concluídos a Metro do Porto deve fazer uma apresentação pública, porque os cidadãos se interessam e têm o direito a saber o que vai ser feito nestes espaços.