Os Açores não são uma ilha
O PS venceu as eleições, mas ao fim de 24 anos de poder socialista volta ao princípio: se conseguir constituir governo – a geometria parlamentar permite também ao PSD pensar no poder – terá de o fazer sem a maioria absoluta, o que não acontecia desde a primeira vitória de Carlos César.
Se olharmos para o aconteceu do outro lado do mundo, para um outro arquipélago, seria aceitável pensar que a primeira eleição no meio do mar da pandemia, por terras portuguesas, se poderia traduzir numa vitória clara para quem tem tido bons resultados no combate à covid-19.
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Se olharmos para o aconteceu do outro lado do mundo, para um outro arquipélago, seria aceitável pensar que a primeira eleição no meio do mar da pandemia, por terras portuguesas, se poderia traduzir numa vitória clara para quem tem tido bons resultados no combate à covid-19.
Mas ao contrário do que sucedeu na Nova Zelândia, onde a primeira-ministra Jacinda Arden, conseguiu conquistar a maioria absoluta que lhe escapava, muito graças aos bons resultados durante o combate à pandemia, Vasco Cordeiro, à frente de uma região que tem sofrido com a covid-19 bem menos que o resto do país, viu a maioria absoluta escapar-lhe.
O PS venceu as eleições, mas ao fim de 24 anos de poder socialista volta ao princípio: se conseguir constituir governo – a geometria parlamentar permite também ao PSD pensar no poder – terá de o fazer sem a maioria absoluta, o que não acontecia desde a primeira vitória de Carlos César. Não capitalizou com a pandemia e os açorianos mostram fadiga em relação à actual solução governativa. Quem beneficiou foi o eterno rival, o PSD, que não venceu, mas ganhou um dos objectivos que lhe daria “meia vitória”, ao conseguir retirar a maioria absoluta a Vasco Cordeiro.
Mas estas eleições serão também recordadas pela entrada do Chega, da Iniciativa Liberal e do PAN no parlamento regional, enquanto o CDS-PP se volta a ressentir, caindo em relação à votação anterior e a CDU desaparece do Parlamento. Os Açores acabam assim por seguir a tendência nacional de ascensão dos novos partidos, especialmente à direita, e de alguma estabilidade, embora com sinais de erosão, ao centro. No que respeita à política, as eleições regionais mostraram que os Açores não são uma ilha separada do todo nacional. E se Rui Rio se apressou a vir reclamar os ganhos, a hesitação na reacção socialista mostra que há bastante para digerir pelas bandas do PS.
De assinalar, numa altura em que o funcionamento das democracias corre riscos, um pouco por todo o mundo e em parte devido à pandemia, que nos Açores se registou uma diminuição da abstenção em relação às anteriores eleições. Os açorianos estiveram à altura, talvez movidos pelo desejo de mudança perante o desafio permanente que enfrenta o arquipélago e que, de alguma forma, resumia esta semana um açoriano das Flores ouvido pelo PÚBLICO no podcast P24: “Que conseguíssemos transformar o isolamento numa vantagem, em vez de ser um obstáculo, e que encontrássemos um equilíbrio, um meio-termo, entre ser o paraíso dos ambientalistas e dos turistas e uma terra que é muitas vezes dura e com poucas oportunidades para quem cá vive.”