Reforma da PAC: desafios novos
A PAC tem que ser a Política da solidariedade entre o campo e a cidade. Portugal não pode desperdiçar a oportunidade da próxima década.
A agricultura, entendida como um setor vital para a então Comunidade Económica Europeia, haveria de consagrar-se como uma verdadeira política comunitária logo em 1962. De aí para cá, várias foram as reformas e também vários foram os alargamentos a outros países que passaram a integrar o espaço que hoje é a União Europeia.
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A agricultura, entendida como um setor vital para a então Comunidade Económica Europeia, haveria de consagrar-se como uma verdadeira política comunitária logo em 1962. De aí para cá, várias foram as reformas e também vários foram os alargamentos a outros países que passaram a integrar o espaço que hoje é a União Europeia.
Ainda tenho presente na memória as grandes discussões, e outras tantas incompreensões, relativas à primeira grande reforma de 1992. Foi durante a primeira Presidência Portuguesa, em que eu tive a honra de trabalhar de muito perto, enquanto secretário de Estado da Agricultura, com o meu amigo Arlindo Cunha, então ministro, e já na altura considerado um dos maiores especialistas em matéria de Política Agrícola.
Volvidos estes anos, e após as voltas que o Mundo dá, aqui escrevo sobre a aprovação do pacote de regulamentos que irão definir a Política Agrícola da próxima década. Naturalmente, não é alheio ao debate gerado o quão evidentes se tornaram a agricultura e os agricultores no decurso desta crise pandémica.
A PAC culpada do abandono dos campos? Não! Isso deve-se, infelizmente, aos falhanços das políticas de desenvolvimento rural, no sentido mais amplo, e naturalmente à integração de outras políticas de incentivo à fixação das pessoas no mundo rural, não à agricultura.
Agora, com esta nova reforma, o desafio é o de aliar a produtividade, herança de outras reformas, com o da sustentabilidade. Com efeito, o paradigma mudou. E, por isso, mudam também os instrumentos.
Bruxelas quer devolver aos Estados-membros a responsabilidade pela definição e implementação da política agrícola. E a definição da estratégia mais apropriada, sobretudo no tocante à chamada arquitetura verde. Isto é, à reconversão de práticas em compromissos benéficos para o ambiente. E isso será feito, com maior subsidiariedade, através dos Planos Estratégicos nacionais, que deverão responder aos principais parâmetros-base fixados pela UE, depois aprovados, monitorizados e avaliados pela Comissão.
Eis o grande desafio: o Governo terá de desenhar e implementar a PAC com maior margem de manobra na escolha das medidas que considera as mais adequadas para corresponder aos objetivos comuns, por um lado, e para contribuir para um verdadeiro desenvolvimento sustentável da agricultura e das zonas rurais, por outro.
O sucesso ou insucesso desta nova PAC dependerá da qualidade, da ambição e da vontade política de assumir a política agrícola como prioridade. Em suma, teremos uma PAC mais verde, mas com mais autonomia e mais responsabilidade para os Estados.
A cada um dos Estados-membros, e por isso também a nós, compete um desempenho de medidas no “tal” PEPAC suficientemente atrativas para que os agricultores optem por aderir aos eco-regimes do Pilar I, no âmbito dos pagamentos diretos, e aos regimes clima, ambiente e bem-estar animal do Pilar II, no âmbito do apoio ao desenvolvimento rural. Mas que permitam também que mais jovens e novos agricultores queiram iniciar atividade. Que modernizem a produção dotando-a de mais meios tecnológicos, mais precisão. Que garantam mais valor acrescentado aos alimentos que produzimos.
O orçamento para Portugal está delineado, e contará com 359 milhões de euros adicionais durante o período de transição da PAC, em 2021 e 2022, para investimentos no âmbito do desenvolvimento rural. Falta a estratégia.
Por último, e não menos importante para a próxima década com esta nova PAC, aqui deixo mais dois desafios para o PEPAC da responsabilidade do Governo: o primeiro, um plano que garanta rendimentos justos para os agricultores, obtido também através das chamadas convergências interna e externa dos pagamentos diretos. Em segundo, que responda com ambição às mais urgentes necessidades em termos de modernização do setor, no âmbito dos investimentos.
A PAC tem que ser a Política da solidariedade entre o campo e a cidade.
Portugal não pode desperdiçar a oportunidade da próxima década.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico