País tem obrigação de ir buscar crianças e mulheres de jihadistas portugueses, defende Ana Gomes
A ex-eurodeputada foi arrolada como testemunha de Rómulo Costa, que está a ser julgado juntamente com Cassimo Turé, suspeitos de fazerem parte de uma célula terrorista com mais seis portugueses.
A ex-eurodeputada Ana Gomes defendeu esta segunda-feira no Campus da Justiça, em Lisboa, que é obrigação do Estado português ir à Síria buscar as crianças e as mulheres dos jihadistas portugueses.
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A ex-eurodeputada Ana Gomes defendeu esta segunda-feira no Campus da Justiça, em Lisboa, que é obrigação do Estado português ir à Síria buscar as crianças e as mulheres dos jihadistas portugueses.
A socialista foi arrolada como testemunha de Rómulo Costa, que está a ser julgado juntamente com Cassimo Turé, por fazerem alegadamente parte de uma célula terrorista com mais seis portugueses, acusados de pertencerem ao Daesh e de unirem esforços, recrutarem e financiarem a organização terrorista, apoiando a ida de cidadãos portugueses e britânicos para a Síria para combaterem ao lado de jihadistas.
Ana Gomes disse que não conhecia o arguido, mas confirmou que recebeu, um e-mail de Rómulo Costa, e cartas do pai deste a pedirem ajuda para ir buscar os filhos e as mulheres de Celso e de Edgar Costa, que teriam falecido em combate.
A ex-eurodeputada explicou que encaminhou a questão para o Ministério dos Negócios Estrangeiros, juntamente com um parecer seu em que defendia essa intervenção do Estado português, explicando que está em causa o superior interesse das crianças porque são portuguesas, e também por questões de segurança nacional.
“Estas crianças e as suas mães, que segundo sei são estrangeiras, deviam ser integradas num programa de vigilância e de desradicalização”, disse, sublinhando que não obteve resposta dos Ministério dos Negócios Estrangeiros e que não sabe se foi ou está a ser feita alguma diligência.
Também perante o tribunal, Ana Gomes disse que sabe que os responsáveis da Policia Judiciária e dos serviços de segurança nacionais partilham da sua opinião.
De acordo com a ex-eurodeputada, já houve países que tiveram essa iniciativa e até há uma recomendação do Parlamento Europeu no sentido de cada país ir buscar os seus nacionais.
E até deu o exemplo de uma mulher belga com quem chegou a falar e que, apesar de ter regressado da Síria com “o cérebro completamente lavado”, conseguiu, no âmbito de um programa de desradicalização, perceber a realidade daquilo em que se tinha efectivamente metido e que estava agora a colaborar com as autoridades belgas, no sentido de, por exemplo, dada a sua experiência, ajudar a detectar eventuais movimentos de recrutamento.
Programas de desradicalização
Já à saída do tribunal, Ana Gomes explicou a importância de investir em programas de desradicalização e no combate ao terrorismo: “Se nos desinteressamos destas crianças depois não nos admiremos que ressentimento e oportunidades de radicalização venham a voltar-se contra a nossa segurança colectiva.”
A ex-eurodeputada quis também explicar que, como deputada europeia que trabalhou nas comissões de inquérito sobre o terrorismo, sabe que não é por falta de interesse e de empenho das autoridades a nível europeu que não há uma política concertada e coordenada.
“É porque os governos dos vários Estados-membros continuam a entender que as questões de segurança e defesa, incluindo o combate ao terrorismo, se devem fazer numa perspectiva nacional, desarticulada. Não querem partilhar informação e estratégias”, afirmou.
Além de Ana Gomes, a defesa de Rómulo Costa, também arrolou como testemunha, Graça Mira Gomes, secretária-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa.
O advogado Lopes Guerreiro queria provar que Rómulo Costa e a sua família fizeram contactos com as autoridades portuguesas para que fossem buscar os filhos e as mulheres dos seus irmãos, Celso e Edgar Costa, à Síria, no sentido de demonstrar que, de certa forma, o arguido com esta atitude não pactua com os ideais do Daesh, recusando sujeitar os seus familiares, neste caso os seus sobrinhos, às regras e ensinamentos dos terroristas.
No entanto, Graça Mira Gomes explicou que este tema está ao abrigo do Segredo de Estado, ao qual está sujeita pelas funções que desempenha.