Há cursos de línguas eslavas gratuitos na Universidade de Lisboa — e as inscrições continuam abertas

Em 2019/2020, cerca de 200 alunos aproveitaram as aulas gratuitas, com algumas das motivações para aprender os idiomas a serem relações familiares e amorosas, fascínio por culturas diferentes ou interesse em fazer Erasmus num determinado país.

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Aulas gratuitas de línguas eslavas são disponibilizadas pelo Centro de Cultura e Línguas Eslavas da Faculdade de Letras, da Universidade de Lisboa Sara Jesus Palma

A Universidade de Lisboa prolongou até ao final do mês as inscrições para os cursos de Línguas Eslavas, de frequência gratuita, onde os alunos têm contacto com a cultura da Rússia, Bulgária, Polónia, Eslovénia, República Checa e Croácia.

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A Universidade de Lisboa prolongou até ao final do mês as inscrições para os cursos de Línguas Eslavas, de frequência gratuita, onde os alunos têm contacto com a cultura da Rússia, Bulgária, Polónia, Eslovénia, República Checa e Croácia.

No ano lectivo transacto, estas aulas foram frequentadas por cerca de 200 alunos com as mais variadas motivações, havendo sempre casos de namoro e de “casais mistos” em que um procura aprender a língua e cultura do outro, disse à agência Lusa o director do Centro de Cultura e Línguas Eslavas da Faculdade de Letras, Gueorgui Nenov Hristovsky.

Há também quem vá pelo fascínio de uma cultura diferente, pela curiosidade de um alfabeto distinto (cirílico), porque já visitou o país e gostava de aprofundar o conhecimento sobre a região, por motivação profissional ou porque tenciona fazer Erasmus num destes países onde por vezes é mais fácil conseguir bolsa.

Com a entrada da Bulgária na União Europeia, em 2007, o cirílico tornou-se o terceiro alfabeto oficial da UE, além do latino e do grego. “Há casos de fascínio por estudar estas línguas que não estudaram na escola. Também temos pessoas que já estão reformadas e querem manter a cabeça activa”, contou à Lusa o responsável, revelando: “Já encontrei pessoas que coleccionam línguas, fizeram várias línguas.”

As inscrições deveriam ter terminado a 9 de Outubro, mas este ano os processos estão “muito atrasados”, pelo que foi decido prorrogar o prazo. Os dados ainda não estão fechados, mas é já possível notar “uma pequena quebra de alunos”, devido à pandemia de covid-19, segundo o professor, de origem búlgara. Segundo o site do Centro de Cultura e Línguas Eslavas da Faculdade de Letras, o curso está aberto a qualquer pessoa com idade superior a 16 anos.”

A frequência é gratuita porque “as embaixadas não querem que a cultura se pague”, explicou Gueorgui Nenov Hristovsky, referindo que é apenas cobrada uma inscrição de 20 euros.

O curso completo tem a duração da generalidade das licenciaturas (3 anos), à excepção do russo que tem mais dois níveis, criados a pensar nas comunidades deste país e da Ucrânia em Portugal: “Muitos deles cresceram cá, falam a língua, mas nunca tiveram oportunidade de aprender a escrever bem. Nas aulas são lidos textos de autores russos, é diferente de estar a falar com os pais”. É igualmente ensinada história e cultura, nas mais variadas vertentes.

As aulas de russo são as mais procuradas, não só porque a Rússia é “o maior país eslavo do mundo”, mas por “razões históricas” e também porque na Ucrânia “uma grande parte da população é russa”, disse o docente.

“O russo tem muitos falantes. Há muitos falantes russos e ucranianos cá em Portugal”, sublinhou. Os alunos que sejam já fluentes na língua podem fazer apenas os últimos níveis. A comunidade ucraniana em Portugal ascendia, em 2018, a 29.218 pessoas, de acordo com estatísticas oficiais publicadas na página da embaixada, que contabiliza os cidadãos legalizados.

Os países da Europa de Leste são também muito visitados hoje em dia, o que contribui para o interesse suscitado nos últimos anos. Em sentido inverso, o maior número de turistas destes países em Portugal no ano passado, veio da Polónia (277.616), de acordo com dados do INE relativos a hóspedes em estabelecimentos turísticos. Seguiram-se os russos (186.911) e os checos (63.591).

Depois há quem se interesse por temas específicos, como guerra e religião e mesmo a gastronomia. “São culturas muito ricas. Além de noites de poesia e tertúlias, fazíamos também encontros de música - apesar de ser difícil arranjar em Portugal músicos autóctones - e degustação de comida, petiscos e bebida, um copo de vinho ou vodca”, acrescentou Nenov, lamentando que com a pandemia as actividades tenham agora de ser limitadas. “Éramos o centro mais activo da faculdade nestas actividades”, afirmou.

A Universidade de Lisboa afirma-se como a única em Portugal a oferecer estes cursos livres semestrais, que podem ser frequentados por alunos internos (de outros cursos) e externos. O ambiente é multicultural, com alunos e professores de várias proveniências: “Por vezes temos um polaco que vem estudar checo ou um russo que vem estudar búlgaro”, referiu.

Em entrevista à Lusa, Gueorgui Nenov destacou que a maior parte da Europa fala estas línguas. “A cultura dos Balcãs é muito antiga. Tem tradições muito interessantes, mesmo ao nível do folclore, da música. São países que têm muito a oferecer aos estudantes, em termos de literatura, arte, canções. Muita gente vem pela cultura”, admitiu.

A Bulgária, de onde é natural, é “o terceiro país na Europa onde há mais descobertas históricas, depois da Grécia e da Itália”, sustentou, recordando a cultura trácia, que no século V antes de Cristo se disseminou por várias regiões entre o norte da Grécia e o sul da Rússia. A influência dos trácios, divididos por vários grupos e tribos, fez com que Heródoto os definisse como “o segundo povo mais numeroso do mundo conhecido e potencialmente o mais poderoso, se não fosse a sua desunião”.