Um dia a fábrica de Nadir Afonso foi abaixo. E isso deu um filme
Era um edifício icónico, guardião de memórias colectivas de Vila Real. A população lutou pela panificadora desenhada por Nadir Afonso, mas em 2020 a obra fez-se pó para dar lugar a um supermercado. Documentário 1965 - Panreal um edifício de Nadir Afonso, do realizador José Paulo Santos, é uma homenagem ao pintor e arquitecto no ano do seu centenário
Os gritos repetidos e angustiados de uma mulher misturam-se com o ruído de fundo de maquinaria pesada: “Vergonha. Cobardes. É uma vergonha!” A noite já caiu em Vila Real e a demolição de uma fábrica acontece perante a revolta, incredulidade e desânimo de alguns cidadãos. São os primeiros segundos do documentário de José Paulo Santos sobre o último edifício projectado por Nadir Afonso (1920-2013), um “início invertido” com o desejo de agarrar o espectador a uma narrativa onde cabe arquitectura, urbanismo, património, política, cidadania. E onde a memória, em parte causa da luta cidadã, recusa fazer-se pó, como o edifício histórico que acabou substituído por um supermercado. “Um país sem documentário é como uma família sem álbum de fotografia”, diz o realizador nascido em Coimbra e crescido em Vila Real, citando Patricio Guzmán, para falar do “dever” de filmar 1965 - Panreal um edifício de Nadir Afonso. Uma homenagem ao pintor e arquitecto no ano do seu centenário, com o sonho de preservar parte da memória colectiva de uma cidade.