“Avó Wong” reaparece em Hong Kong e conta ter estado detida na China

Activista sexagenária diz ter sido mantida sob detenção na fronteira, obrigada a prometer não voltar a participar em protestos e depois impedida de voltar à antiga colónia britânica durante um ano.

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Alexandra Wong falou este sábado aos jornalistas em Hong Kong Reuters/TYRONE SIU

Até Agosto de 2019 era presença habitual nas manifestações pró-democracia de dimensões sem precedentes que por essa altura se repetiam no território semi-autónomo. Magrinha, cabelo grisalho e óculos, surgia sempre nos protestos agitando uma enorme bandeira britânica, e foi apelidada de “Avó Wong” pelos outros manifestantes. Um dia deixou de ser vista nas ruas da antiga colónia que desde 1997 está sob domínio da China. Até este sábado.

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Até Agosto de 2019 era presença habitual nas manifestações pró-democracia de dimensões sem precedentes que por essa altura se repetiam no território semi-autónomo. Magrinha, cabelo grisalho e óculos, surgia sempre nos protestos agitando uma enorme bandeira britânica, e foi apelidada de “Avó Wong” pelos outros manifestantes. Um dia deixou de ser vista nas ruas da antiga colónia que desde 1997 está sob domínio da China. Até este sábado.

Alexandra Wong, 64 anos, deu uma conferência de imprensa onde explicou que foi presa depois de uma manifestação quando regressava a casa, em Shenzhen, a cidade que une Hong Kong à China continental onde vivia há 14 anos. Diz ter sido colocada pelas autoridades desta metrópole em “detenção administrativa” e depois em “detenção criminal” durante 45 dias, sem nunca lhe ser dito de que é que estava acusada.

“Tive medo de morrer no centro de detenção”, diz Wong, explicando que, na verdade, passou por vários centros. Em todos, descreve, havia sempre muita gente junta, até 26 pessoas a dormir em divisões que não chegavam aos 20 metros quadrados. Wong conta que durante esse mês e meio foi interrogada quase todos os dias sobre os protestos em Hong Kong.

Em troca da libertação diz ter sido obrigada a ler uma declaração diante de uma câmara onde prometia não voltar a participar em protestos nem a dar entrevistas e assegurava que não tinha sido torturada. Em seguida, ainda a fizeram renunciar por escrito a toda a actividade política. “A pior coisa que me fizeram na vida foi escrever esta confissão”, afirma. “Mas não tinha nenhuma maneira de negociar.”

Quando pensava que já estava livre, foi enviada para uma “viagem patriótica” de cinco dias na província de Shaanxi, no Noroeste da China: aqui tiraram-lhe fotografias enquanto segurava numa bandeira chinesa e cantava o hino nacional.

Finalmente libertada, ficou a saber que estava acusada de “incitação à desordem pública”, uma acusação frequentemente usada pelo regime chinês contra os dissidentes. Nunca recebeu quaisquer documentos sobre o processo.

Autorizada a voltar a casa, em Shenzhen, ficou proibida de entrar em Hong Kong durante um ano, restrições que foram por fim levantadas no fim de Setembro. “Não me atrevo a regressar a Shenzhen”, diz agora Wong.

Ao longo de todo este tempo, vários activistas e grupos de direitos humanos tinham manifestado a sua preocupação com o desaparecimento de Wong.

Os protestos massivos de 2019 começaram em Junho, primeiro por causa de lei que facilitava a extradição de suspeitos de crimes para serem julgados na China continental, uma medida que a oposição via como forma de perseguição política. Três meses depois, em Setembro, a chefe do governo da região administrativa, Carrie Lam, anunciou a retirada definitiva da proposta de lei, mas entretanto os próprios protestos mudaram a natureza do movimento. “Demasiado tarde”, reagiu um dos principais líderes pró-democracia de Hong Kong, Joshua Wong.

Entretanto, as manifestações evoluíram para uma contestação mais alargada ao sistema político e à interferência chinesa e estavam a ganhar novo ânimo em Maio, depois do confinamento provocado pela pandemia de covid-19. Em resposta, numa tentativa de silenciar os protestos, Pequim votou uma controversa lei de segurança nacional, que impôs a Hong Kong e que entrou em vigor a 1 de Julho (data da transferência do território da soberania britânica para a chinesa, em 1997), pondo em causa o princípio “um país, dois sistemas”, que deveria dar autonomia legislativa a Hong Kong até 2047.

A nova lei proíbe todos os actos secessionistas ou a interferência externa e já permitiu acusar activistas de “conspiração com forças estrangeiras", um crime para o qual estão previstas condenações que podem ir até à prisão perpétua.