Covid-19: Pandemia teve um “baixo efeito” no aumento da mortalidade em Portugal

Inglaterra, País de Gales e Espanha foram as nações mais afectadas por um excesso de mortalidade, no período analisado (entre meados de Fevereiro e final de Maio), em estudo liderado pelo Imperial College de Londres.

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Lisboa, em Março de 2020, no início do estado de emergência devido à pandemia da covid-19 Daniel Rocha

Portugal faz parte de um grupo de três países europeus onde a primeira vaga da pandemia de covid-19 teve um “baixo efeito” no aumento total da mortalidade, conclui um estudo realizado por investigadores do Imperial College  de Londres agora publicado.

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Portugal faz parte de um grupo de três países europeus onde a primeira vaga da pandemia de covid-19 teve um “baixo efeito” no aumento total da mortalidade, conclui um estudo realizado por investigadores do Imperial College  de Londres agora publicado.

De acordo com o estudo, que analisa as mortes adicionais que ocorreram entre meados de Fevereiro e finais de Maio num total de 21 países industrializados e publicado na revista Nature Medicine, o efeito da covid-19 em Portugal foi dos mais baixos do universo analisado.

O “baixo efeito” na mortalidade foi sentido em Portugal, na Áustria e na Suíça.

Segundo o artigo científico, coordenado pelo investigador Majid Ezzati, a covid-19 provocou directamente 1396 mortes em Portugal – o que, de acordo com o método matemático utilizado, significa um aumento da mortalidade (directa e indirecta) de cerca de 2900 pessoas (em Portugal) no período em causa e relativamente aos números habituais de anos anteriores. Estes números representam um “excedente de mortalidade” de cerca de 13% no país.

A análise identifica quatro grupos de países consoante o número total de mortos na primeira vaga da pandemia. “O primeiro grupo compreende países que evitaram um aumento detectável da mortalidade em geral e inclui a Bulgária, a Nova Zelândia, a Eslováquia, a Austrália, a República Checa, a Hungria, a Polónia, a Noruega, a Dinamarca e Finlândia”, refere o estudo.

O segundo e terceiro grupos de países “experimentaram um efeito baixo a moderado da pandemia nas mortes em geral e incluem Áustria, Suíça e Portugal (baixo efeito) e França, Países Baixos e Suécia (efeito moderado)”, acrescenta a análise.

Por último, o quarto grupo de países ou nações, onde a mortalidade aumentou fortemente durante o período em causa relativamente aos valores comuns de anos anteriores e onde constam a Bélgica, a Itália, a Escócia, a Espanha e Inglaterra e País de Gales.

No total dos 21 países, tinham-se registado, entre meados de Fevereiro e final de Maio, “cerca de 206.000 mortes a mais do que o esperado se a pandemia da covid-19 não tivesse acontecido”, conclui este estudo.

A Inglaterra e o País de Gales, bem como Espanha, foram as nações mais afectadas, com um aumento de entre 37% a 38% na mortalidade em relação aos níveis esperados na ausência de uma pandemia – o que representa um nível muito acima da média de 18% do conjunto dos países analisados.

Na lista dos países europeus onde a primeira vaga da pandemia provocou maior aumento da mortalidade seguem-se a Itália, a Escócia e a Bélgica.

O estudo alerta que a doença causada pelo vírus SARS-CoV-2 causou directamente mais de um milhão de mortes em todo o mundo, segundo as contagens oficiais, mas também resultou em mortes indirectas, devido aos efeitos sociais e económicos e à perturbação dos sistemas de saúde (atrasos nos diagnósticos, adiamento de cirurgias, diminuição da actividade física, aumento de suicídios e violência intrafamiliar, entre outros factores).

Por outro lado, a diminuição do tráfego rodoviário e a melhoria da qualidade do ar durante o confinamento evitaram algumas mortes que teriam ocorrido se não se tivesse registado uma pandemia.

O conhecimento desses efeitos indirectos é “necessário para entender o real impacto da pandemia em termos de saúde pública”, explicam os investigadores do Imperial College.

“Este número (206.000) é semelhante ao número total de mortes por cancro de pulmão e é mais do dobro das mortes ligadas à diabetes ou a cancro de mama nesses países durante um ano inteiro”, sublinhou, em comunicado, o Instituto Francês de Estudos Demográficos (INED), em Paris, um associado do estudo.

As diferenças de país para país, referem os autores do trabalho, “reflectem variações nas características da população, nas políticas, na resposta à pandemia e na prontidão dos sistemas de saúde pública”. “Os resultados deste trabalho de investigação poderão ajudar a implementar políticas públicas que irão limitar a mortalidade em futuras vagas da pandemia”, defendeu o INED.

“Os países que desenvolveram testes eficazes e abrangentes e campanhas de rastreamento de contacto a nível local, bem como aqueles que implementaram medidas de contenção precoces e eficazes, tiveram um número menor de mortes durante a primeira vaga” de covid-19, segundo os autores da análise. “Numa altura em que estamos a entrar na segunda vaga, programas de testes e rastreamento e apoio a pessoas que tenham de se isolar representam a medida mais importante para minimizar o impacto da pandemia”, defendeu-se ainda.

Os investigadores usaram dados sobre a mortalidade desde 2010 nos países estudados, para estabelecer quantas mortes seriam, normalmente, registadas no período em causa caso a pandemia da covid-19 não tivesse ocorrido. A comparação entre esses números e o número de mortes realmente registadas durante este período permitiu deduzir que o excedente ao habitual é atribuível à covid-19.

Os países escolhidos para o estudo foram aqueles que têm uma população superior a quatro milhões de habitantes e sobre os quais a equipa de investigadores possuía dados semanais de mortalidade, discriminados por faixa etária e sexo, desde pelo menos 2015.