Novo presidente do Tribunal de Contas envolvido no caso das PPP

José Tavares foi questionado pelo Ministério Público sobre o papel que teve na tentativa do Governo de José Sócrates de desbloquear o impasse nas PPP rodoviárias, cujo impacto poderá ter lesado o Estado em 3,5 mil milhões de euros.

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O recém-nomeado presidente do Tribunal de Contas recebeu uma longa lista de questões enviadas pela procuradora Lígia Salbany, no âmbito da investigação das renegociações dos contratos de PPP (parcerias público-privadas) rodoviárias que, de acordo com o Ministério Público, terão lesado o Estado em 3,5 mil milhões de euros. José Tavares, que toma nesta quarta-feira posse como presidente do Tribunal de Contas, foi durante 25 anos director-geral daquela instituição e terá sido nessa qualidade que teve um papel importante para desbloquear o impasse em que mergulharam as negociações desses contratos.

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O recém-nomeado presidente do Tribunal de Contas recebeu uma longa lista de questões enviadas pela procuradora Lígia Salbany, no âmbito da investigação das renegociações dos contratos de PPP (parcerias público-privadas) rodoviárias que, de acordo com o Ministério Público, terão lesado o Estado em 3,5 mil milhões de euros. José Tavares, que toma nesta quarta-feira posse como presidente do Tribunal de Contas, foi durante 25 anos director-geral daquela instituição e terá sido nessa qualidade que teve um papel importante para desbloquear o impasse em que mergulharam as negociações desses contratos.

Duas das perguntas concretas que lhe foram remetidas pela procuradora passavam por saber se, em algum momento, o Tribunal de Contas tinha recebido pressões de membros do Governo para contornar a recusa de visto prévio aos contratos de concessões rodoviárias. E, por outro lado, que intervenção directa teve o Tribunal de Contas na solução encontrada para fazer a reforma dos contratos que estão sob investigação do Ministério Público. 

Em causa está a renegociação dos contratos para a construção e exploração de sete auto-estradas, lançadas como subconcessões da Estradas de Portugal. Os concursos foram lançados antes da eclosão da crise financeira de 2008, pelo que os concorrentes que saíram vencedores apresentaram propostas financeiras que não conseguiram manter quando chegaram à fase final das negociações, optando por agravar o custo para o Estado.

Quando estes contratos chegaram ao Tribunal de Contas, esbarraram com uma posição intransigente deste organismo, que lembrava que o Estado pretendia entregar obras a propostas mais caras do que aquelas que haviam ganho o concurso – e a posição do Tribunal de Contas era a de que os contratos não podiam ser assinados. O então primeiro-ministro, José Sócrates, insistiu em lançar o seu programa de obras públicas, dizendo que era o investimento público que iria ajudar Portugal a combater a crise económica.

A investigação está a decorrer no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) e, de acordo com os autos consultados pelo PÚBLICO, os investigadores do Ministério Público quiseram saber qual o real envolvimento do Tribunal de Contas nesta solução. Isto porque, se a posição do Tribunal de Contas foi intransigente em não dar visto prévio a esses contratos, a verdade é que foi encontrada uma solução que, segundo o então presidente da Estradas de Portugal, Almerindo Marques, acabou desenhada pelos próprios responsáveis do Tribunal de Contas. Foi o gestor quem o disse numa comissão parlamentar de inquérito que avaliou estes contratos em Março de 2013, referindo mesmo a realização de reuniões presenciais com esse propósito.

No relatório elaborado pelos inspectores da Polícia Judiciária que estão a fazer a investigação, lê-se que foram inclusive interceptados alguns emails trocados entre o conselheiro José Tavares e o ex-secretário de Estado Paulo Campos. O novo presidente do Tribunal de Contas terá mesmo enviado da sua conta de email pessoal uma cópia do contraditório a um relatório de auditoria do próprio tribunal para Paulo Campos. E participou em reuniões consideradas pelos inspectores como “secretas”, por terem decorrido a um sábado na Presidência do Conselho de Ministros, onde terão estado presentes o então ministro Mário Lino, o ex-secretário de Estado Paulo Campos e José Tavares.

A solução encontrada acabou por ser avançar com uma série de pagamentos contingentes – as famosas e polémicas “side letters”, que permitiram aos privados serem ressarcidos pelo aumento dos custos financeiros e que ficaram à parte dos contratos reformados que foram viabilizados pelo Tribunal de Contas. Guilherme d’Oliveira Martins desmentiu Almerindo Marques quando foi ouvido no Ministério Público em Abril de 2018, dizendo que não houve nenhuma pressão do Governo para viabilizar os contratos, nem que o Tribunal de Contas terá participado activamente em nenhuma solução.

Mas Almerindo Marques terá repetido essa versão já em Abril de 2019, quando foi ouvido num depoimento para memória futura e que foi dirigido pelo juiz Carlos Alexandre, no âmbito da investigação. De acordo com o Observador, que teve acesso a esse depoimento do ex-gestor, Almerindo Marques foi mais longe e disse mesmo que recebeu textos precisos com soluções jurídicas e financeiras para ultrapassar o chumbo do Tribunal de Contas com uma ordem clara: tinha de destruir tais documentos após os ler. No entanto, o ex-líder da Estradas de Portugal não soube esclarecer se tais textos tiveram origem no Tribunal de Contas.

A investigação às PPP de José Sócrates começou em 2012 e envolve suspeitas de corrupção, gestão danosa, burla agravada, branqueamento de capitais, tráfico de influências, fraude fiscal, participação económica em negócio e associação criminosa. Na mira dos investigadores está não só Paulo Campos mas também os ex-ministros Mário Lino e Fernando Teixeira dos Santos, e o secretário de Estado Carlos Costa Pina, tendo todos já sido constituídos arguidos.