Covid-19: Há uma sensação de abandono em Poiares, Freixo de Espada à Cinta
Na aldeia de 300 habitantes há 20 casos positivos e mais 27 pessoas em quarentena. População tem que se deslocar 200 quilómetros para fazer teste à covid-19.
Os habitantes de Poiares, em Freixo de Espada à Cinta, demonstram um sentimento de uma inquietude silenciosa e uma sensação de abandono por parte das autoridades de saúde devido a um foco de covid-19, com 20 casos activos. Esta localidade do extremo sul distrito de Bragança reclama, há cerca de uma semana, uma unidade móvel de testagem para ajudar a controlar o foco de covid-19, que “atormenta” a população “e a impede de viver o seu dia-a-dia”, com a normalidade possível nestes casos.
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Os habitantes de Poiares, em Freixo de Espada à Cinta, demonstram um sentimento de uma inquietude silenciosa e uma sensação de abandono por parte das autoridades de saúde devido a um foco de covid-19, com 20 casos activos. Esta localidade do extremo sul distrito de Bragança reclama, há cerca de uma semana, uma unidade móvel de testagem para ajudar a controlar o foco de covid-19, que “atormenta” a população “e a impede de viver o seu dia-a-dia”, com a normalidade possível nestes casos.
José Andrade, sentado à porta de entrada da sua casa e de máscara posta, sempre vai dizendo que as coisas por Poiares “estão ásperas devido ao bicho”. O octogenário lamenta “que ninguém olhe para esta gente que está longe de tudo”. “Há por aqui muitos idosos como eu. Isto já não é como há 15 dias. Noto que as pessoas estão mais recatadas e talvez mais desconfiadas devido à presença do vírus na aldeia. É preciso mais atenção para descobrir o que se passa “, relatou à Lusa.
Já Júlia Santos atira que é preciso muito cuidado para se circular na aldeia, “porque já lá vão quase duas semana em que registam casos de covid-19 e pouco ou nada se fez”. “Não sabemos quem está infectado. Precisamos de fazer mais testes e quando os temos de fazer vamos muito longe, a Macedo de Cavaleiros”, desabafou.
Na aldeia há 27 pessoas em confinamento obrigatório, de acordo com dados fornecidos pela Junta de Freguesia, a que se juntam 20 casos activos, segundo o último boletim epidemiológico da Unidade Local de Saúde do Nordeste. Bernardino Gabriel esteve em confinamento desde dia 4 de Setembro, após o contacto com um dos primeiros casos positivos de covid-19 detectados em Poiares. “Já estava a ganhar mofo após tantos dias em casa. Fui, por vontade própria e por aconselhamento das entidades de saúde, fazer isolamento profiláctico, indicou.
Bernardino explicou que veio do Porto para Poiares para cuidar dos pais que têm uma idade avançada e sentiu a necessidade de fazer o teste de despistagem, para melhor poder desempenhar a sua função, porque o receio de contágio “era muito grande”. “Acabei por ser enviado para uma unidade de testagem à covid-16 em Macedo de Cavaleiros, após alguma insistência, onde fiz 200 quilómetros de uma viagem complicadíssima sem saber se estava positivo ou negativo para o vírus. Foi muito difícil. Temos de parar pelo caminho e não sabemos o nosso estado de saúde”, indicou à Lusa.
Outra das queixas apontadas passa pela percentagem de população idosa residente na aldeia, cuja deslocação para efectuar testes a 100 quilómetros de distância é muito difícil, dado nem sempre as condições estarem reunidas. “Eu tenho o meu carro. Contudo, mesmo que quisesse ajudar alguém não podia porque que estava em situação de confinamento. Há situações em que se tem de pensar e acautelar o bem de todos”, frisou Bernardino.
O presidente da Junta de Freguesia de Poiares, Felipe Portela, garante que denunciou a situação das distâncias e longas viagens que as pessoas têm de percorrer para serem testadas e com o número de casos a aumentar, mas ainda “sem resposta”. “Os testes estão ser feitos às “pinguinhas”. A minha ideia é que se instalasse uma unidade móvel de testagem aqui em Poiares e que alguém pagasse os testes. A Junta não tem dinheiro para esta operação. Eu fiz dois testes e paguei do meu bolso, porque se estivesse positivo para a doença não podia acompanhar e ajudar a população”, concretizou o autarca.
Na sexta-feira, o presidente da Comissão Distrital de Protecção Civil de Bragança, Francisco Guimarães, mostrou-se “preocupado” com as distâncias que os habitantes de freguesias como Poiares têm de percorrer para a realização de testes de despiste à covid-19. O responsável adiantou que esta preocupação é partilhada pela Unidade Local de Saúde, que o informou de que os testes à covid-19 vão voltar a ser efectuados nos centros de saúde dos 12 concelhos do distrito de Bragança.
Filipe Portela foi confrontado com esta indicação e de forma peremptória e disse que “até agora Junta não foi informada de nada por partes das autoridades envolvidas neste processo”. O autarca de freguesia diz ter conhecimento de que em concelhos vizinhos os testes foram pagos pelos municípios, em situações com menos casos do que em Poiares, que contabiliza 20 casos positivos para covid-19, num universo de cerca de 300 habitantes.
“Foram realizados 45 testes aqui na aldeia, o que significa que em cada duas pessoas testadas há um caso positivo para o novo coronavírus. Uma situação que é preocupante e urge actuar de outra forma”, contabiliza Filipe Portela. Para o autarca, “era preciso ter actuado mais cedo para assim sabermos o número de casos positivos. Estamos num momento em que não sabemos quem está infectado porque não se fizeram os testes necessários”. Na aldeia transmontana, a vida faz-se com “uma nova normalidade” nesta altura de colheitas.