Alegados jihadistas portugueses terão enganado universidades britânicas para receberem apoios sociais

Inspector da Policia Judiciária explicou que a partir de certa altura, na investigação, tornou-se claro que estavam perante “uma verdadeira célula terrorista”. Dois alegados jihadistas portugueses estão a ser julgados no Campus da Justiça, em Lisboa.

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Rómulo Costa e Cassimo Turé, são dois dos oito portugueses, acusados de alegadamente pertencerem ao Daesh e estão a ser julgados no Campus da Justiça, em Lisboa. Rui Gaudencio

O inspector da Policia Judiciária (PJ), João Paulo Simões, explicou esta segunda-feira aos juízes do Campus da Justiça, em Lisboa, que estão a julgar Rómulo Costa e Cassimo Turé, dois dos oito portugueses acusados de pertencerem ao Daesh e de unirem esforços, recrutarem e financiarem a organização terrorista, apoiando a ida de cidadãos portugueses e britânicos para a Síria para combaterem ao lado de jihadistas, como os arguidos criaram um esquema de fraude que permitia ao grupo financiar as suas actividades.

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O inspector da Policia Judiciária (PJ), João Paulo Simões, explicou esta segunda-feira aos juízes do Campus da Justiça, em Lisboa, que estão a julgar Rómulo Costa e Cassimo Turé, dois dos oito portugueses acusados de pertencerem ao Daesh e de unirem esforços, recrutarem e financiarem a organização terrorista, apoiando a ida de cidadãos portugueses e britânicos para a Síria para combaterem ao lado de jihadistas, como os arguidos criaram um esquema de fraude que permitia ao grupo financiar as suas actividades.

De acordo com o inspector,  Sadjo Turé, irmão de Cassimo, forjava certificados de habilitações para depois inscrever alunos nas universidades britânicas e receber apoios sociais nesse país.

Como era tudo feito pela Internet, os apoios sociais eram levantados através de códigos que eram enviados para os endereços de correio electrónico dos alunos que na realidade não existiam o que permitia que qualquer pessoa levantasse o dinheiro. Segundo João Paulo Simões, Sadjo Turé, depois enviava o dinheiro para Cassimo que o distribuía pelos restantes membros do grupo, como Celso Costa e Edgar Costa.

O inspector não sabe, no entanto, se as autoridades britânicas chegaram a acusar alguém neste esquema de fraude.

Em tribunal apenas estão a ser julgados Cassimo Turé e Rómulo Costa porque os restantes, Nero Saraiva, Sadjo Turé, Edgar da Costa, Celso da Costa, Fábio Poças e Sandro Marques estão em paradeiro desconhecido e o juiz determinou a separação dos processos.

De acordo com a acusação, terá sido Edgar Costa que roubou um carimbo de uma escola em Sintra, que depois Sadjo Turé usava para falsificar os certificados. Cassimo Turé ficava com algum do dinheiro que o irmão lhe enviava para financiar despesas pessoais.

Como prova desta ligação, a PJ conseguiu recuperar, nas buscas que fez em casas dos pais de Rómulo, Edgar e Celso Costa, um livro que continha todos os nomes e os códigos usados para receber o dinheiro.

João Paulo Simões explicou como começou esta investigação que levou à descoberta de “uma verdadeira célula terrorista”.

Foi em 2012, quando Sadjo Turé e Celso da Costa foram suspeitos, no Reino Unido, de estarem envolvidos no rapto dos jornalistas John Cantlie e Jeroen Oerlemens, em Julho desse ano, na fronteira turco-síria. Houve uma comunicação das autoridades britânicas à policia portuguesa.

O inspector da PJ explicou que à medida que a investigação avançava a existência dessa célula formada por portugueses era cada vez mais evidente.

Portugueses terão treinado na Tanzânia 

Nero, Sadjo e os irmãos Edgar e Celso Costa tinham estado na Tanzânia em 2011. Segundo João Paulo Simões, na Tanzânia os três terão frequentado campos de treino de combate de grupos fundamentalistas islâmicos com ligações à organização terrorista Al-Shaba.

Edgar até terá sido instrutor. Foi apanhado numa escuta ao telefone com a mulher de Nero. Estava a tentar convence-la a ir para a Síria ter com o marido, mas a mulher mostrava-se reticente e questionou por que não ia Edgar para lá. Edgar disse-lhe que também esteve com ele na Tanzânia e que até foi quem ensinou Nero. Aliás, afirmou que foi ele quem ensinou os “outros”.

De acordo com o inspector, a investigação revelou que depois Edgar, Celso e Nero foram para a Síria, de onde regressaram apenas em Agosto de 2012, à excepção de Nero que lá continuou.

Cassimo e Rómulo nunca estiveram na Síria, mas de acordo com a acusação tinham um papel relevante na retaguarda. Papel esse confirmado pelo inspector da PJ, que explicou que Cassimo Turé não só recebia o dinheiro de Sadjo, como o distribuía e também tinha a função de dar apoio, em Portugal, a indivíduos aliciados e recrutados para se deslocarem para a Síria.

Já sobre Rómulo, João Paulo Simões disse que a investigação evidenciou bem as suas convicções. O inspector recordou algumas escutas em que foram apanhadas conversas como uma de Edgar com Rómulo em que falam de “matanças” e em “limpar mais uns quantos”.

No depoimento, o investigador sublinhou que Fábio Poças tinha a certa altura uma página numa rede social, na qual se exibia muitas vezes com armas e Rómulo Costa (com o nome de Romy Fansony) comentou, por três vezes, publicações nessa página, tendo escrito: “Ai não; porcos a caírem all day everyday; braaaaaaa tatatataaa.” Rómulo já disse em tribunal que a página era sua mas que não foi ele quem fez os tais comentários.

O inspector diz que essa interpretação é falsa e que à luz das crenças do Islão, significa “impuros” e “infiéis”. Mais uma vez os juízes e o procurador procuraram saber o significado de “porcos”, palavra que surge em várias letras alegadamente escritas por Rómulo, e que este diz serem homens que violam os direitos humanos.

Outro episódio que, segundo o inspector da PJ, é revelador do envolvimento e da responsabilidade de Rómulo Costa, foi quando Ahsan Ali Iqbal, que também estaria identificado no Reino Unido como tendo estado envolvido no rapto dos jornalistas juntamente com os dois portugueses Sadjo Turé e Celso Costa, foi preso na Tanzânia. Na versão de Rómulo este foi detido porque foi apanhado a usar um passaporte falso quando ia para a Tanzânia tentar casar.

Mas a versão do inspector da PJ e que está plasmada na acusação, é que havia o objectivo de tentar levar o máximo número de mulheres possível para a Síria, mas o objectivo principal era tentar chegar aquele país através da Turquia. E como já não o podiam fazer directamente através de voos de Lisboa para Istambul porque as autoridades estavam alertadas, tentavam fazê-lo através de outros países e com outros passaportes que não os portugueses.