O caminho até ao longínquo haiku

A poesia de um poeta que viveu há três séculos num mundo bem diferente do nosso, recuperado num cuidadoso e honesto trabalho de “aproximação”.

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Ao lermos estes poemas, trilhamos o solo de um mundo distante, tanto linguística, quanto culturalmente. Yosa Buson viveu no século XVIII

O percurso que vai de um idioma como o japonês até à língua portuguesa pode imaginar-se tão sinuoso quanto o caminho estreito que dá nome ao célebre relato de viagens de Bashô (O Caminho Estreito para o Longínquo Norte, Fenda, 1995, trad. Jorge Sousa Braga). Assim, ler a tradução de um poeta japonês é como estar perante os matizes inumeráveis do desconhecido — “sopra uma brisa fresca/ separando o sino/ do seu som” (p.158). O tradutor, Joaquim M. Palma, discorreu, com rara modéstia e probidade, sobre essa condicionante nos volumes de traduções que tem dedicado à poesia nipónica: O autor destas linhas teve, e continua a ter, plena conscência da longa lista de dificuldades [de] uma tradução como esta” (O Eremita Viajante, Matsuo Bashô, trad. J.M.P., Assírio & Alvim, 2016); “Perante um quadro linguístico tão longínquo do padrão lógico a que estamos habituados, não há qualquer hipótese de falarmos, honestamente, de tradução. O mais correcto é utilizarmos aproximação ou então versão.” (Os Animais, Kobayashi Issa, trad. J.M.P, Assírio & Alvim, 2019); “o resultado final deverá sempre ser visto como uma versão e não como uma tradução literal” (p.30). Ao prefaciar a colectânea de um amigo poeta, Kuroyanagi Shoha, mais tarde seu discípulo, escreveu Yosa Buson: “Embora o haikai valorize sobremaneira a linguagem comum, afasta-se do que é comum. Isto é, abandona o comum usando esse mesmo comum.” (Early Modern Japanese Literature: an Anthology, 1600–1900, ed. Haruo Shirane, Columbia University Press, 2002). Para ilustrar os seus preceitos, Buson lembrava, então, o mestre zen que incitava os seus discípulos a escutarem o som de uma só mão. Uma imagem que funciona como metáfora desta poesia: uma tradição que privilegia “indícios, sugestões, o oblíquo” (The Penguin Book of Japanese Verse, tr. Geoffrey Bownas e Anthony Thwaite, Penguin, 2009).

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O percurso que vai de um idioma como o japonês até à língua portuguesa pode imaginar-se tão sinuoso quanto o caminho estreito que dá nome ao célebre relato de viagens de Bashô (O Caminho Estreito para o Longínquo Norte, Fenda, 1995, trad. Jorge Sousa Braga). Assim, ler a tradução de um poeta japonês é como estar perante os matizes inumeráveis do desconhecido — “sopra uma brisa fresca/ separando o sino/ do seu som” (p.158). O tradutor, Joaquim M. Palma, discorreu, com rara modéstia e probidade, sobre essa condicionante nos volumes de traduções que tem dedicado à poesia nipónica: O autor destas linhas teve, e continua a ter, plena conscência da longa lista de dificuldades [de] uma tradução como esta” (O Eremita Viajante, Matsuo Bashô, trad. J.M.P., Assírio & Alvim, 2016); “Perante um quadro linguístico tão longínquo do padrão lógico a que estamos habituados, não há qualquer hipótese de falarmos, honestamente, de tradução. O mais correcto é utilizarmos aproximação ou então versão.” (Os Animais, Kobayashi Issa, trad. J.M.P, Assírio & Alvim, 2019); “o resultado final deverá sempre ser visto como uma versão e não como uma tradução literal” (p.30). Ao prefaciar a colectânea de um amigo poeta, Kuroyanagi Shoha, mais tarde seu discípulo, escreveu Yosa Buson: “Embora o haikai valorize sobremaneira a linguagem comum, afasta-se do que é comum. Isto é, abandona o comum usando esse mesmo comum.” (Early Modern Japanese Literature: an Anthology, 1600–1900, ed. Haruo Shirane, Columbia University Press, 2002). Para ilustrar os seus preceitos, Buson lembrava, então, o mestre zen que incitava os seus discípulos a escutarem o som de uma só mão. Uma imagem que funciona como metáfora desta poesia: uma tradição que privilegia “indícios, sugestões, o oblíquo” (The Penguin Book of Japanese Verse, tr. Geoffrey Bownas e Anthony Thwaite, Penguin, 2009).