Factores ambientais responsáveis por 13% das mortes na União Europeia
Estudo da Agência Europeia do Ambiente reporta-se a dados da Organização Mundial da Saúde que indicam que, em 2012, mais de 630 mil mortes na União Europeia foram provocadas por factores ambientais. Poluição do ar é a principal responsável
Diversos factores ambientais foram responsáveis por 13% das mortes dos cidadãos de 28 países da União Europeia (UE). Mortes prematuras, que poderiam ter sido evitadas se tivéssemos uma melhor qualidade ambiental, segundo um estudo da Agência Europeia do Ambiente (AEA) divulgado esta terça-feira.
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Diversos factores ambientais foram responsáveis por 13% das mortes dos cidadãos de 28 países da União Europeia (UE). Mortes prematuras, que poderiam ter sido evitadas se tivéssemos uma melhor qualidade ambiental, segundo um estudo da Agência Europeia do Ambiente (AEA) divulgado esta terça-feira.
O estudo Ambiente saudável, vidas saudáveis: como o ambiente influencia a saúde e bem-estar na Europa (Healthy environment, healthy lives: how the environment influences health and well-being in Europe, no original) assenta em dados recolhidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e já publicados em 2016, que dão conta que, em 2012, “mais de 630 mil mortes na UE foram atribuídas ao ambiente”. Destas, cerca de 400 mil eram ligadas à poluição do ar, que surge como o factor destacado no universo de causas de morte relacionadas com factores ambientais. E, dado bem mais actual do que os números de 2012, “há provas que sugerem que uma exposição a longo prazo à poluição atmosférica pode aumentar a susceptibilidade à covid-19, sendo necessária mais pesquisa sobre esta matéria”, lê-se no relatório.
Segundo o documento, o barulho é o “segundo factor ambiental mais significativo”, na responsabilidade por mortes prematuras na UE, causando 12 mil desses óbitos e contribuindo para 48 mil novos casos de doença isquémica do coração. Já o impacto das alterações climáticas é mais difícil de medir, por ser “complexo” e incluir diferentes vertentes como “eventos climatéricos extremos, como ondas de calor, frio extremo ou cheias, bem como mudanças nos padrões de doenças transmitidas por vectores ou através da água e da alimentação”. “As ondas de calor representam a mais mortífera forma de condições climatéricas extremas na Europa como um todo, com as áreas urbanas a serem particularmente afectadas. Segundo os actuais cenários de aquecimento global, o aumento de mortes provocadas por ondas de calor pode chegar às 130 mil por ano”, refere-se no documento.
O estudo conclui também que os efeitos dos factores ambientais na saúde dos cidadãos da UE não é igual em todos os países e em todas as camadas da população. Na Noruega e na Islândia, eles não são responsáveis por mais de 9% das mortes, mas na Albânia essa percentagem sobe para 23% e atinge o valor máximo na Bósnia-Herzegovina, onde 27% dos óbitos de 2012 eram atribuíveis a factores ambientais. A poluição nas suas mais diversas formas está ligada a doenças tão diversas como o cancro, doenças cardíacas, respiratórias ou neurológicas.
Olhando para as diferentes camadas da sociedade, a AEA conclui ainda que “as pessoas mais vulneráveis são afectadas de forma mais dura pelos factores ambientais”. A poluição do ar é o exemplo mais claro dessa realidade, refere-se no documento: “Os mais pobres são desproporcionalmente expostos à poluição do ar e ao clima extremo, incluindo ondas de calor ou frio extremo. Isto está relacionado com os locais onde vivem, trabalham e vão à escola, muitas vezes em bairros urbanos degradados e próximos de vias de tráfego muito movimentadas. Edifícios degradados permitem a entrada da poluição do ar, são mais difíceis de manter uma temperatura confortável e têm mais probabilidade de serem húmidos e terem mofo.”
Mudar a realidade dos dados apontados no estudo da AEA só será possível com uma recuperação ambiental, defende-se no estudo. “Reduzir a poluição e criar ambientes mais saudáveis irá trazer benefícios significativos à saúde dos cidadãos europeus. Embora existam algumas lacunas no nosso conhecimento relacionada com os efeitos na saúde dos factores de stress ambientais, a prova existente é suficientemente robusta para justificar que se aja já para acabar com a poluição”, lê-se no documento. As “soluções verdes, como a expansão de espaços verdes e azuis nas áreas urbanas” - acrescenta-se - “oferece uma ‘vitória tripla’ ao mitigar a poluição ambiental e apoiar a biodiversidade, melhorando a saúde e bem-estar das populações urbanas e fomentando a coesão social e a integração. Ambientais naturais de alta qualidade são a ferramenta para a prevenção de doenças, a redução da exposição a factores de risco ambientais e para a promoção do exercício, relaxamento e interacções sociais necessários à saúde e bem-estar”.
A resposta tem de ser integrada e passar por vertentes tão diversas como mudanças no comportamento, na dieta e no consumo dos europeus. O Pacto Ecológico Europeu, diz-se, deve ser visto como “a mudança radical” que é necessária ao estabelecer “uma estratégia sustentável e inclusiva para melhorar a saúde e qualidade de vida das pessoas, cuidar da natureza e não deixar ninguém para trás.”
O estudo também olha em particular para a covid-19, que é apresentada como “o exemplo máximo das ligações indissociáveis entre a saúde humana e os ecossistemas”. Lembrando que a doença, muito provavelmente, passou de morcegos para os humanos - embora reconheça que ainda não há certezas absolutas sobre a origem do novo coronavírus SARS-CoV-2 - o estudo refere que, a confirmar-se a hipótese mais provável, este é já o terceiro coronavírus com origem em animais a afectar humanos nos anos mais recentes.
“O uso dos solos para produzir alimento para o gado é um factor-chave para a desflorestação. Há uma ligação clara entre a desflorestação tropical e a emergência de vírus de origem zoonótica oriundos de reservatórios da vida selvagem. A limpeza da floresta para a abertura de estradas, mineração ou agricultura, bem como a caça de animais selvagens para consumo ou para a medicina tradicional, e o uso de espécies selvagens como animais de estimação, resultam numa maior interacção entre os humanos e a vida selvagem que pode ser uma rampa de lançamento para novos vírus. A mudança no uso dos solos, incluindo a conversão de ecossistemas naturais para a agricultura ou desenvolvimento urbano, tem impactos na abundância e diversidade das espécies, favorecendo espécies animais que funcionam como reservatórios para as doenças zoonóticas, em particular roedores, morcegos e diferentes pássaros”, lê-se no documento.
No comunicado que acompanha a divulgação do estudo, o director executivo da AEA, Hans Bruyninckx, frisa que um futuro mais saudável passa por diferentes combates: “Embora vejamos melhorias no ambiente na Europa e uma clara focalização do Pacto Ecológico num futuro sustentável, o relatório indica que é necessária uma forte acção para proteger os mais vulneráveis da nossa sociedade, uma vez que a pobreza está frequentemente associada à vivência em más condições ambientais e em más condições de saúde. Todas estas relações devem ser tomadas em conta numa abordagem integrada para uma Europa mais inclusiva e sustentável”, diz.