Tenet já está nas salas portuguesas: começa a lenta missão de resgate do cinema
Filme de Christopher Nolan que tem a difícil tarefa de reanimar as bilheteiras trouxe cerca de 20 pessoas ao NorteShopping nas primeiras sessões do dia de estreia. “Se há alguém no século XXI que pode de facto salvar o cinema, é o Nolan”, acreditam os fãs do realizador britânico.
Tenet tem uma missão injusta, possivelmente destinada ao fracasso. A missão de salvar o cinema da pandemia que vem mantendo as salas vazias há quase seis meses, não a missão à volta da qual se desfaz o labiríntico enredo do filme, tipicamente Christopher Nolan e repleto das brincadeiras com o tempo que o cineasta tanto adora. É um peso demasiado grande para cair nas costas de um só filme e de um só realizador, por mais que não seja um realizador qualquer.
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Tenet tem uma missão injusta, possivelmente destinada ao fracasso. A missão de salvar o cinema da pandemia que vem mantendo as salas vazias há quase seis meses, não a missão à volta da qual se desfaz o labiríntico enredo do filme, tipicamente Christopher Nolan e repleto das brincadeiras com o tempo que o cineasta tanto adora. É um peso demasiado grande para cair nas costas de um só filme e de um só realizador, por mais que não seja um realizador qualquer.
Em dia de estreia nacional, depois de mais do que um adiamento, foi justamente o “nome sonante” de Nolan que trouxe Igor, espectador nascido no Brasil, a uma das primeiríssimas sessões no NorteShopping, em Matosinhos, esta quarta-feira pelas 13h30. Fã do cineasta londrino desde a trilogia dedicada a Batman que obliterou os menos memoráveis esforços de Joel Schumacher, o amante de cinema diz que já não via um filme em sala desde a quarentena. Em parte por medo, em parte for falta de incentivo: “Não é como se tivéssemos tido muitos blockbusters nos últimos meses”, partilha com o PÚBLICO alguns minutos antes de começar a exibição de Tenet.
Talvez agora as coisas comecem a mudar, talvez agora o desconfinamento comece a permitir o reencontro pelo qual as grandes cadeias anseiam. “Mas devagarinho”, deixa escapar o brasileiro entre risos enquanto aponta para o mar de cadeiras vazias à sua frente.
Há que dar o devido desconto a Christopher Nolan. Com ou sem covid-19, uma sala de cinema ter pouco menos de 20 pessoas na sessão das 13h30 não é propriamente surpreendente. E, a avaliar pela compra de bilhetes online, por esta altura, as sessões da noite já começam a chegar a uma lotação simpática – que, no tão discutido “novo normal” da pandemia, é não mais do que quase meia casa.
Ultrapassada a série de trailers menos do que fascinantes que preenche o ecrã das 13h30 às 13h45, chega por fim o tão esperado possível salvador. Estão lá os ingredientes todos do criador de Memento e A Origem (Inception): a banda sonora maior do que a vida, o talismã da sorte Michael Caine (que, na única cena em que aparece, fala casualmente das “cidades soviéticas secretas”, despertando mais risos contidos e assoares de nariz do que Nolan talvez desejasse) e as sequências de luta complexas – que, em marcha atrás, o grande cartão-de-visita deste filme, chegam a lembrar uma versão muito mais tensa e enervada do vídeo de uma certa música dos Coldplay.
É precisamente essa a leitura que, após a exibição e em jeito de primeiras impressões, faz o espectador Nuno Barreiros, para quem Tenet “correspondeu perfeitamente às expectativas”. “Tem aquela marca autoral que identifica toda a obra do Nolan”, conta ao PÚBLICO.
Fã da dinâmica entre John David Washington – o “Protagonista”, como é chamado o seu personagem – e Robert Pattinson, entretém-se enquanto tenta montar na cabeça as peças das viagens temporais que confundem e desafiam a plateia. “Anda-se muito para a frente e para trás, não é? Estes são daqueles filmes que só vendo mais do que uma vez conseguimos desconstruir e desvendar”, sugere o espectador, que de resto não é o único à deriva (alegadamente, nem Robert Pattinson percebeu metade do guião enquanto estava a filmar). “É o Inception com um twist. É como se fosse a prequela”, comenta divertidamente Rosário, a sua esposa.
O casal gosta da atenção que exigem estes quebra-cabeças. “Quem vem dos anos 80 e sabe o que é o Regresso ao Futuro já está mais ou menos treinado para os saltos na narrativa”, comenta Nuno Barreiros, que também teve em Batman – O Início (2005) o seu primeiro contacto com o realizador britânico. Desde então, tem feito por não perder uma obra sua que seja. E sublinha: “Os filmes do Nolan valem sempre pela experiência de virmos ao cinema e de assistirmos num ecrã gigante.”
Num Verão aflito, a indústria cinematográfica quererá que esta seja uma opinião popular. Apesar de uma primeira onda de críticas que oscilaram entre a rendição total e a assumida desilusão, Tenet surge com a difícil (e talvez até impossível) missão de impedir as salas do afogamento. Os requisitos de blockbuster estão lá; falta a equação do medo, “que nunca vai desaparecer por completo até termos uma vacina”, pondera Igor antes de o NorteShopping apagar as luzes e ligar o projector. “Mas se há alguém no século XXI que pode de facto salvar o cinema, é o Nolan.”