Delegado de saúde em Reguengos diz que orientações da DGS não o obrigavam a ir a lar de idosos

Médico, com 70 anos, diz que está em “grupo de risco” para covid-19 não só por causa da idade, mas também porque é fumador e não tem experiência no uso dos equipamentos de protecção individual.

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LUSA/NUNO VEIGA

O delegado de saúde de Reguengos de Monsaraz​, o médico de 70 anos que é a autoridade local de saúde pública, explica que não visitou o lar onde um surto de covid-19 provocou a morte de 16 idosos e uma funcionária porque nada nas orientações publicadas pela Direcção-Geral da Saúde (DGS) “o obrigava a ir em pessoa” à instituição.

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O delegado de saúde de Reguengos de Monsaraz​, o médico de 70 anos que é a autoridade local de saúde pública, explica que não visitou o lar onde um surto de covid-19 provocou a morte de 16 idosos e uma funcionária porque nada nas orientações publicadas pela Direcção-Geral da Saúde (DGS) “o obrigava a ir em pessoa” à instituição.

A informação de que o delegado de saúde local não visitou o lar de Reguengos de Monsaraz, alegando ser “grupo de risco” por ter mais de 70 anos, surge no relatório da auditoria que a Ordem dos Médicos fez aos acontecimentos no lar de Reguengos de Monsaraz. A equipa que fez a auditoria acrescenta que o médico resolveu “delegar” esta função numa enfermeira especialista em controlo de infecção que apenas terá visitado o lar em 23 de Junho, quase uma semana depois de ser conhecido o primeiro caso de covid-19 no lar.

Mas o médico assinala, em resposta enviada ao PÚBLICO por email, que “nada nas orientações publicadas” pela DGS o “obriga ou obrigava a ir em pessoa ao local”. “O que eu tinha de fazer era avaliar a situação de informações que me chegaram e que davam conta de irregularidades nas medidas de controlo de infecção então recomendadas”. Para isso, pediu “a colaboração da enfermeira” que é coordenadora do programa de controlo de infecção do Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) do Alentejo Central. “Exactamente a pessoa indicada para o que era necessário fazer”, argumenta.

De resto, assume que, de facto, está num grupo de risco para covid-19, mas não só porque tem 70 anos. Além da idade (o risco de letalidade por covid-19 aumenta à medida que a idade avança), adianta que é “fumador” e que não tem “nenhuma experiência no uso dos EPI [equipamentos de protecção individual] necessários”. Vários factores de risco, portanto. 

O presidente da Administração Regional de Saúde (ARS) do Alentejo, José Robalo, tinha antes explicado ao PÚBLICO que o médico, que já era delegado de saúde no ACES do Alentejo Central, “se disponibilizou para permanecer no Serviço Nacional de Saúde mesmo depois de ter completado 70 anos, o que aconteceu justamente quando a pandemia de covid-19 eclodiu em Portugal”. A falta de médicos especialistas em saúde pública é grande. “Continuou no activo e foi contratado [pela ARS] por quatro meses, como está previsto nas medidas de combate à pandemia, porque os nossos recursos na área de saúde pública são muito escassos”, justificou José Robalo.

O Governo decretou em Março várias medidas de carácter extraordinário para garantir “o estado de prontidão do Serviço Nacional de Saúde”. A contratação de médicos reformados “sem sujeição aos limites de idade” foi uma delas. Antes, a contratação de clínicos aposentados já era possível, mas havia várias condicionantes e limites.

O delegado de saúde é o primeiro nível da autoridade de saúde pública e é o responsável local. Há ainda um responsável a nível regional. Ambos são os “braços" no terreno da autoridade de saúde pública máxima, a nacional, que é a directora-geral da Saúde.​