Número de mulheres mortas em contexto de intimidade desceu para metade este ano

Até 15 de Agosto houve dez homicídios de mulheres provocados por “relações de intimidade actuais, passadas ou pretendidas”. No mesmo período do ano passado tinham ocorrido 20. Já as tentativas de homicídio no mesmo contexto cresceram ligeiramente.

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Ainda há muitas dúvidas sobre a influência do confinamento nos casos de violência doméstica PAULO PIMENTA

É preciso muito cautela na interpretação de números. E também em relação aos próprios números que, baseados em artigos da imprensa, “não são as estatísticas oficiais”, pelo que podem não reflectir o todo. Ainda assim, os dados recolhidos pelo Observatório das Mulheres Assassinadas (OMA), um grupo de trabalho da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), indicam que entre 1 de Janeiro e 15 de Agosto deste ano, o número de mulheres assassinadas em contexto de intimidade desceu para metade, quando comparado com o mesmo período do ano passado. Foram dez, quando em 2019 tinham sido 20. Já as tentativas de assassinato de mulheres por “relações de intimidade actuais, passadas ou pretendidas” aumentaram ligeiramente: foram 25 este ano, tinham sido 22 no ano passado.

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É preciso muito cautela na interpretação de números. E também em relação aos próprios números que, baseados em artigos da imprensa, “não são as estatísticas oficiais”, pelo que podem não reflectir o todo. Ainda assim, os dados recolhidos pelo Observatório das Mulheres Assassinadas (OMA), um grupo de trabalho da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), indicam que entre 1 de Janeiro e 15 de Agosto deste ano, o número de mulheres assassinadas em contexto de intimidade desceu para metade, quando comparado com o mesmo período do ano passado. Foram dez, quando em 2019 tinham sido 20. Já as tentativas de assassinato de mulheres por “relações de intimidade actuais, passadas ou pretendidas” aumentaram ligeiramente: foram 25 este ano, tinham sido 22 no ano passado.

“A ligação entre estes números e a pandemia nunca poderá ser directa. É tudo muito recente e há muitos factores que contribuem para estes dados. O que observamos, em relação às tentativas de femicídio em contexto de intimidade, é que mais de metade acontece a partir de Junho, já depois do período mais restritivo do estado de emergência. Falamos por isso de uma altura em que as mulheres voltam à sua vida mais activa na sociedade, já podem sair para ir trabalhar, têm mais contacto social, e acreditamos que isto possa ser um factor de risco. Além disso, há também casos de mulheres que estavam a pedir ajuda dentro de casa e foram pessoas que iam a passar na rua que se aperceberam e pediram ajuda. O papel das testemunhas é muito importante”, diz Cátia Pontedeira, do OMA.

Já em relação à aparente queda dos casos de assassinato de mulheres em contexto de intimidade, Cátia Pontedeira insiste que a eventual influência da pandemia e do confinamento também deve ser olhada “de forma muito cuidadosa”. “Pode ter acontecido que durante o confinamento estas mulheres, que podiam já sofrer de violência doméstica, tenham adoptado estratégias de sobrevivência, adaptando os seus comportamentos para correrem o menor risco possível de serem agredidas”, diz. 

Não saindo do campo das probabilidades, a responsável do Observatório das Mulheres Assassinadas admite que, embora alguns factores de risco possam ter aumentado (como o stress provocado pelo facto de vítima e agressor estarem fechados na mesma casa), outros, como os ciúmes provocados pelos contactos sociais da vítima, possam ter diminuído, contribuindo para o balanço actual.

Todos os anos, este grupo recolhe e analisa as notícias sobre mulheres assassinadas ou que foram vítimas de tentativa de homicídio. É com base nessa recolha que é feita a contabilização dos casos, pelo que é necessário olhar para os números com alguma cautela, já que podem existir casos que não são divulgados. 

Além dos casos ocorridos em contexto de intimidade, o OMA identificou ainda dez casos de assassinato de mulheres ocorridos noutras circunstâncias (questões financeiras, assaltos ou outros), duas tentativas de homicídio num quadro de violência doméstica contra ascendente, uma tentativa de femicídio por motivos de género e uma outra tentativa “não relacionada com questões de género”. Números que levam este grupo a insistir na “urgência de um investimento numa análise sobre o femicídio e a sua tentativa a partir de um olhar especializado e aprofundado para prevenir futuros assassinatos”, refere em comunicado.

Para as vítimas e testemunhas de casos de violência doméstica, fica também um apelo, traduzido por Cátia Pontedeira: “Procurem ajuda especializada. É gratuita, confidencial, e existe por via telefónica e em estruturas de atendimento físico de que podem fazer uso para procurar ajuda, que será prestada com base nos dados de cada situação”.

O Serviço de Informação às Vítimas de Violência Doméstica tem uma linha gratuita, confidencial e disponível 24 horas por dia (800 202 148), através da qual se pode obter informação sobre a ajuda disponível em todo o território.

A influência da pandemia e do confinamento nos casos de violência doméstica ainda carece de uma análise aprofundada, mas alguns dados já vão permitindo traçar um retrato preliminar. Se o número de pedidos de ajuda caiu durante o confinamento – o que não aponta necessariamente para uma quebra nas agressões, já que a possibilidade de as vítimas pedirem ajuda poderá ter ficado comprometida pela presença constante do agressor ou agressora , o aumento desses pedidos verificou-se assim que houve algum regresso à normalidade. Só a Rede Nacional de Apoio a Vítimas de Violência Doméstica registou uma quase duplicação dos pedidos de ajuda após o desconfinamento, com os contactos a aumentarem de 2500 para 4500 por quinzena. 

Com um olhar mais abrangente sobre esta questão, o ramo europeu da Organização Mundial de Saúde veio, em Maio, alertar para o aumento de casos de violência doméstica durante o confinamento, havendo países em que os pedidos de ajuda aumentaram em 60%.