Autarca de freguesia da Figueira da Foz cita Mussolini e chama tolos a autores de petição

Presidente da Junta de Freguesia de São Pedro, eleito pelo PS, diz que desconhecia que a frase é atribuída ao ditador italiano.

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Caixa de multibanco está na origem da polémica Andre Rodrigues

O presidente da Junta de Freguesia de São Pedro, na Figueira da Foz, chamou tolos e ignorantes aos autores de uma petição, utilizando, num ofício em papel timbrado, uma citação atribuída ao ditador fascista italiano Benito Mussolini.

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O presidente da Junta de Freguesia de São Pedro, na Figueira da Foz, chamou tolos e ignorantes aos autores de uma petição, utilizando, num ofício em papel timbrado, uma citação atribuída ao ditador fascista italiano Benito Mussolini.

Na sequência de uma exposição enviada à junta de freguesia relativa a um problema com uma caixa multibanco avariada no mercado local, assinada por duas residentes que juntaram à carta uma petição subscrita ao longo do mês de Julho por uma centena de pessoas, António Salgueiro, eleito pelo PS, afirmou, também por escrito: “O silêncio é a única resposta que devemos dar aos tolos. Porque onde a ignorância fala, a inteligência não dá palpites”.

A frase utilizada pelo autarca socialista é atribuída, em inúmeras fontes espalhadas pela Internet, ao ditador italiano Benito Mussolini, considerado o pai do fascismo e aliado de Hitler, que foi morto em 1945.

Ouvida pela agência Lusa, Dulce Ponard, uma das signatárias da exposição à junta de freguesia, manifestou-se “perfeitamente atónita” com a resposta “insultuosa” de António Salgueiro. “É inadmissível que alguém que se considera democrata, um autarca eleito, falte desta maneira ao respeito a quem assinou a petição e à população de São Pedro. O senhor presidente da junta não tem noção nenhuma do cargo que ocupa, não tem o direito de pegar num ofício da Junta e fazer isto”, lamentou Dulce Ponard.

A signatária, que também está na génese de um projecto cívico intitulado Movimento Independente de Reflexão sobre a freguesia de São Pedro e pertence à assembleia de freguesia, eleita precisamente na lista socialista liderada por António Salgueiro, acusou o autarca de nas reuniões daquele órgão partir “facilmente para o insulto e agressão verbal”. “E agora com esta atitude põe em causa o seu próprio mandato”, declarou.

Questionado pela Lusa, António Salgueiro argumentou que a sua resposta foi endereçada ao movimento cívico, e não à população da freguesia e questionou os termos da petição. “A petição tem um rol de mentiras e esse movimento cívico não existe, é essa senhora [Dulce Ponard] e o marido”, alegou o presidente da junta, que na carta, datada de 7 de Agosto, alega responder “de acordo com a essência” do movimento de cidadania, enviando “para reflexão” a citação atribuída ao ditador italiano.

António Salgueiro manifestou, no entanto, desconhecer a autoria da frase por si utilizada. “Eu não sabia que estava a citar Mussolini, mas isso também não me preocupa, toda a gente tem coisas boas e más. A maior parte das coisas que Mussolini fez foram más, eu tenho simpatia por Álvaro Cunhal e sei que ele não fez tudo bem”, argumentou o autarca.

“Se calhar, aqui [na citação que lhe é atribuída] o Mussolini acertou”, acrescentou.

Segundo António Salgueiro, Dulce Ponard “nunca levantou a questão do multibanco” na assembleia de freguesia: “As coisas devem ser debatidas com frontalidade e honestidade para se poder chegar a uma solução. Legítimo era existir uma petição que dê força à junta, que anda desde Novembro [de 2019] a tentar resolver o problema da caixa multibanco. Mas o que aquele documento [a petição] quer fazer é achincalhar a junta de freguesia e isso, obviamente, eu não admito”, enfatizou. “Sempre lutei pela honestidade política, se é para fazer política porca, comigo não”, alegou o presidente da Junta.

Questionado sobre se não teme vir a ser alvo de uma eventual acção disciplinar por parte do Partido Socialista, do qual é militante desde 2019, António Salgueiro desvalorizou a questão. “O único partido que eu tenho é a minha freguesia e é a minha freguesia que me preocupa. O resto, da mesma maneira que entrei [no PS] é da maneira que saio”, enfatizou.

A agência Lusa tentou obter um comentário de Carlos Monteiro, presidente da Câmara da Figueira da Foz e líder concelhio do PS mas o autarca, que está ausente do município, manifestou não conhecer “o enquadramento” do caso, reservando eventuais declarações para mais tarde.