“Sabemos onde dormes.” Dirigente antifascista novamente ameaçado pela extrema-direita

Jonathan da Costa Ferreira recebeu esta quinta-feira mensagens de um ex-comando que pertenceu à Nova Ordem Social, de Mário Machado. O ex-militar diz que o activista não vai ter onde se esconder.

Foto
O alegado responsável pela ameaça tem ligações à neonazi Nova Ordem Social Miguel Madeira/PÚBLICO/ARQUIVO

O activista antifascista Jonathan da Costa Ferreira voltou esta quinta-feira a receber ameaças à sua integridade física, denunciou a Frente Unitária Antifascista em comunicado enviado ao PÚBLICO. O indivíduo que alegadamente fez as ameaças é conhecido da Polícia Judiciária, é ex-comando e tem um longo percurso na extrema-direita portuguesa, tendo estado ligado aos Portugal Hammer Skins e a Mário Machado. 

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O activista antifascista Jonathan da Costa Ferreira voltou esta quinta-feira a receber ameaças à sua integridade física, denunciou a Frente Unitária Antifascista em comunicado enviado ao PÚBLICO. O indivíduo que alegadamente fez as ameaças é conhecido da Polícia Judiciária, é ex-comando e tem um longo percurso na extrema-direita portuguesa, tendo estado ligado aos Portugal Hammer Skins e a Mário Machado. 

“[No] Fim do mês estaremos em Braga. Sabemos onde dormes. Vamos iluminar-te o cérebro. Nos não perdoamos. Nós não esquecemos”, lê-se nas mensagens divulgadas pela organização antifascista. “O Babalu Ma [Mamadou Ba] já foi avisado, o próximo a sentir a nossa presença serás tu. Não vais conseguir correr pela ribanceira abaixo nem te vais esconder.”

Numa fotografia, também divulgada pela Frente Unitária Antifascista, pode-se ver o seguinte grafitado numa parede: “ANTIFA. Jonathan chibinho, estás morto”, seguido de uma suástica. A ameaça foi escrita na semana passada numa parede nas proximidades da Praça Cruzeiro do Campo das Carvalheiras, no centro de Braga, disse o dirigente antifascista ao PÚBLICO. 

Esta nova ameaça acontece depois de o SOS Racismo e Frente Unitária Antifascista terem recebido um e-mail, assinado pelas organizações de extrema-direita Nova Ordem de Avis e Resistência Nacional, com os nomes de dez pessoas, o de três deputadas (Joacine Katar Moreira, Mariana Mortágua e Beatriz Gomes Dias) e de outros sete activistas antifascistas e anti-racistas, entre os quais Jonathan da Costa Ferreira, dando-lhes um prazo de 48 horas para abandonarem o “território nacional”. Caso contrário, “medidas serão tomadas contra estes dirigentes e os seus familiares, de forma a garantir a segurança do povo português”. O Ministério Público instaurou um inquérito-crime.

​Para a Frente Unitária Antifascista, estas mensagens e ameaças “fazem parte de uma estratégia clara de intimidação de dirigentes antifascistas, anti-racistas, sindicais e de partidos de esquerda”. “Numa altura destas, as respostas unitárias são mais importantes do que nunca, pelo que reiteramos o apelo à união da esquerda – contra este inimigo comum”, apela a organização no comunicado. 

O elemento alegadamente responsável pelas ameaças desta quinta-feira é um velho conhecido da Polícia Judiciária e tem capacidade para juntar poucas pessoas para organizar ataques, sabe o PÚBLICO. Circula na extrema-direita desde o início dos anos 2000, esteve ligado aos Portugal Hammer Skins, é ex-comando e, mais recentemente, pertenceu à organização neonazi Nova Ordem Socialde Mário Machado, entretanto suspensa.

Também é membro do novo grupo de extrema-direita Resistência Nacional, responsável pela parada com tochas e máscaras em frente à sede do SOS Racismo na noite do passado sábado. O PÚBLICO viu várias mensagens da sua autoria enquanto esteve, no início desta semana, a monitorizar o chat do grupo na aplicação de mensagens encriptadas Telegram. O homem de 36 anos é próximo do membro do novo grupo que representou a Nova Ordem Social numa manifestação com mais de dois mil neonazis em Sófia, em Fevereiro de 2019, em homenagem ao general pró-nazi búlgaro Hristo Lukok, assassinado por dois militantes antifascistas em 1942. 

Ameaças e agressões

Em Janeiro de 2019, Jonathan Ferreira da Costa foi alvo de uma “tentativa de homicídio”, como o próprio a descreveu, pouco depois de sair do local de trabalho. Um carro com elementos neonazis tentou atropelá-lo uma vez, falhou, e tentou uma segunda. O antifascista conseguiu então sair da estrada, descendo uma ribanceira em direcção ao mato.

O activista foi ainda alvo de tentativa de agressão no aeroporto do Porto em 2016 por um elemento dos Portugal Hammer Skins. As duas agressões, no Porto e em Braga, foram incluídas no processo-crime no qual o Ministério Público acusou 27 cabeças rapadas de crimes de ódio, entre os quais tentativas de homicídio. 

O PÚBLICO sabe que a situação de Jonathan da Costa Ferreira é bastante sensível em Portugal, tendo já recebido nos últimos meses várias ameaças de morte e, inclusive, existido planos para lhe fazerem “uma visitinha” em Braga, onde residia, até ser obrigado a sair da cidade por temer represálias – envolveu-se numa escaramuça em que um elemento do Escudo Identitário, uma organização neofascista, acabou esfaqueado. É uma das caras mais conhecidas do movimento antifascista português, sendo um dos responsáveis pela sua reorganização nos últimos anos, apesar de ser criticado por outros antifascistas. 

“Fico preocupado por haver ameaças contra familiares meus por parte de um grupo que não sabemos bem quem são”, disse ao PÚBLICO, através do Facebook, o dirigente antifascista. “Não diria que estou com medo, mas um pouco preocupado, sim. Sobretudo pela minha filha e namorada”, continuou, garantindo que as ameaças “não o vão calar”. 

A Polícia Judiciária já está a investigar o caso da ameaça por e-mail às dez pessoas e as autoridades consideram estes acontecimentos, a que se juntam dois episódios de vandalização da sede do SOS Racismo nos dois últimos meses, uma escalada na actuação da extrema-direita em Portugal.