Israel e Emirados Árabes Unidos anunciam “normalização de relações” diplomáticas
Administração Trump patrocina “acordo de paz histórico” que inclui a desistência de Israel anexar parte da Cisjordânia. “Agora que se quebrou o gelo, espero que se sigam mais países árabes e muçulmanos”, disse Trump.
Israel e Emirados Árabes Unidos vão normalizar relações diplomáticas e assinar um acordo anunciado primeiro no Twitter pelo Presidente dos EUA, Donald Trump, que o patrocinou: “Enorme avanço hoje com acordo de paz histórico”, declarou Trump, a que se seguiu a reacção do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, que logo tweetou que era um “dia histórico”.
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Israel e Emirados Árabes Unidos vão normalizar relações diplomáticas e assinar um acordo anunciado primeiro no Twitter pelo Presidente dos EUA, Donald Trump, que o patrocinou: “Enorme avanço hoje com acordo de paz histórico”, declarou Trump, a que se seguiu a reacção do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, que logo tweetou que era um “dia histórico”.
Em troca da normalização, Israel compromete-se a não anexar a parte da Cisjordânia como tinha previsto sob o plano de paz de Trump, rejeitado pelos palestinianos.
Trump repetiu depois a jornalistas na Casa Branca que este é “um momento verdadeiramente histórico”. “Agora que se quebrou o gelo, espero que mais países árabes e muçulmanos sigam os Emirados Árabes Unidos.”
Israel tem acordos de paz apenas com dois Estados árabes, o Egipto, desde 1979, e a Jordânia, desde 1994. (Em 1999, seguiu-se a Mauritânia, mas esta congelou as relações com Israel em 2009, em protesto contra a guerra em Gaza.)
O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, reagiu congratulando-se por “qualquer iniciativa que possa promover a paz e segurança na região do Médio Oriente”.
A notícia é surpreendente, apesar de vários sinais de aproximação recentes entre Israel e países do Golfo, que têm em comum temer o aumento da influência regional do Irão (dois aviões da Emirates com ajuda para o combate à covid-19 aterraram em Telavive, Netanyahu visitou Omã pela primeira vez em 2018, por exemplo).
Michael Singh, do Washington Institute for Near East Policy, nota que muitos analistas, incluindo ele próprio, duvidavam que as ligações entre Israel e Emirados passassem de tácitas a formais enquanto não houvesse progressos em negociações com os palestinianos. Aaron David Miller, que participou em várias negociações entre israelitas e árabes patrocinadas pelos EUA (incluindo o acordo de paz com a Jordânia), escrevia, ainda em Maio, sobre esta aproximação, dizendo que, “claramente, os países do Golfo não estão prestes a ter uma normalização total com Israel”.
Perante a notícia da normalização, Miller comentou agora no Twitter: “Netanyahu, Emirados Árabes Unidos e a Administração Trump transformaram uma necessidade numa vantagem e numa vitória para os três. Os Emirados dizem que impediram a anexação, os EUA também e conseguem um grande avanço, e Netanyahu consegue uma enorme vantagem e liberta-se da armadilha da anexação”.
O acordo é uma rara vitória no plano internacional para Donald Trump, e num timing perfeito, numa altura em que o ciclo noticioso se focava na escolha de Kamala Harris como vice do candidato democrata Joe Biden.
Para o primeiro-ministro israelita, cuja gestão da covid-19 e o julgamento por corrupção levaram a grandes protestos em Israel, a notícia também surge em boa altura: Netanyahu junta assim o seu nome aos de Menachen Begin (que assinou a paz com o Egipto) e Yitzhak Rabin (que assinou a paz com a Jordânia), comenta a jornalista Noga Tarnopolsky.
Também o príncipe Mohammed bin Zayed consegue uma vitória para os Emirados Árabes Unidos, ao ser o primeiro a dar um passo que pode ser seguido por outros na região, e que lhe permite apresentar-se como um defensor da tolerância, mesmo que o país seja governado por líderes autocratas, diz a Associated Press. Mas é quem arrisca mais.
"Parar a bomba-relógio"
Do lado dos Emirados, o ministro dos negócios Estrangeiros, Anwar Gargash, justificou o acordo com a necessidade de impedir a “bomba-relógio” que era uma anexação da Cisjordânia (que seria o fim efectivo da solução de dois Estados, um israelita e outro palestiniano).
Para Gargash, é agora altura de israelitas e palestinianos voltarem à mesa de negociações. A última tentativa, levada a cabo pelo secretário de Estado dos EUA John Kerry, fracassou em 2014, quando os palestinianos se retiraram das conversações por causa da continuada construção por Israel em colonatos judaicos em território que os palestinianos reivindicam para um Estado.
Durante décadas, esperou-se que uma normalização de relações de países árabes com Israel se seguisse à criação de um Estado palestiniano. Para os palestinianos, este anúncio de acordo com os Emirados só pode ser visto como uma vitória, porque impede a anexação que muito provavelmente mataria essa solução, mas é também uma derrota, porque marca um reconhecimento de Israel mesmo sem que haja um Estado palestiniano.
Hanan Ashrawi foi a voz da reacção da Autoridade Palestiniana no Twitter, criticando o acordo: “Israel foi recompensado por não declarar abertamente o que tem estado a fazer ilegalmente e persistentemente desde o início da ocupação.”
Uma das questões deixadas por este acordo, além de quem se poderá seguir, é se ele pode dar algum ímpeto a negociações entre israelitas e palestinianos.
O analista Michael Singh evoca pontos a favor e contra. A favor, a paralisação do processo de anexação. Um ponto que pode funcionar a favor ou contra é a Autoridade Palestiniana perceber que não tem apoio regional para não negociar com Israel, mas pode não perceber e/ou não reagir. O ponto contra é que em Israel “especialmente à direita, o status quo é visto como o melhor de sempre, o que quer dizer que há pouco incentivo para arriscar um acordo com os palestinianos”, diz.