Portugueses têm fugido ao cinema mas há uma campanha para lhes devolver a confiança
De 30 de Julho a 6 de Agosto, as salas portuguesas tiveram menos 94% espectadores do que no período homólogo do ano passado. Uma nova campanha, #VamosAoCinema!?, quer que isso mude. Mas nem todas as salas estão mal.
Entre 30 de Julho e 6 de Agosto, apenas 26.252 pessoas foram ao cinema em Portugal. Comparando este total com os 445.554 espectadores do período homólogo do ano passado (1 a 7 de Agosto), a quebra é de quase 94% – e no mês passado foi ainda mais expressiva, de quase 96%. Dois meses após a reabertura das salas, os números do Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA) demonstram que a esmagadora maioria dos portugueses ainda não terá voltado ao cinema. E para tentar combater essa resistência, foi lançada esta quinta-feira uma campanha para reconciliar os espectadores com as salas.
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Entre 30 de Julho e 6 de Agosto, apenas 26.252 pessoas foram ao cinema em Portugal. Comparando este total com os 445.554 espectadores do período homólogo do ano passado (1 a 7 de Agosto), a quebra é de quase 94% – e no mês passado foi ainda mais expressiva, de quase 96%. Dois meses após a reabertura das salas, os números do Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA) demonstram que a esmagadora maioria dos portugueses ainda não terá voltado ao cinema. E para tentar combater essa resistência, foi lançada esta quinta-feira uma campanha para reconciliar os espectadores com as salas.
Sob o mote #VamosAoCinema!?, e juntando a Associação Portuguesa de Defesa de Obras Audiovisuais (FEVIP), o ICA, a GEDIPE – Associação para a Gestão Colectiva de Direitos de Autor e de Produtores Cinematográficos e Audiovisuais, a Academia Portuguesa de Cinema e a APEC – Associação Portuguesa de Exibidores de Cinema, esta campanha multimeios (televisão, rádio, imprensa escrita e digital) envolve várias figuras públicas. A cara principal é a de Nuno Markl, mas também aparecem actores e realizadores como Anabela Teixeira, Carla Chambel, Lúcia Moniz, Diogo Morgado, Leonel Vieira, Maria João Bastos, João Nuno Pinto, Sérgio Graciano, Vicente Alves do Ó, António-Pedro Vasconcelos, Miguel Gonçalves Mendes ou Joaquim de Almeida.
“Estamos ainda abaixo dos lugares disponíveis que foram impostos (e bem) por questões de segurança”, comenta Paulo Santos, director-geral da FEVIP, ao PÚBLICO. “Queremos que isto se transforme num movimento, é esse o objectivo fundamental desta campanha que pretende mostrar que os cinemas são locais Clean & Safe e que todas as directivas da Direcção-Geral de Saúde estão cumpridas e até ultrapassadas”, continua, inventariando a implementação de “circuitos de entrada e de saída, acrílicos, horários para permitir a higienização e monitorização constante”. As medidas de segurança adoptadas incluem também o distanciamento entre espectadores, o uso obrigatório de máscara, lotações reduzidas e menos sessões.
A ideia, acrescenta Paulo Santos, é “dizer às pessoas que as salas cumprem as regras”, de modo a “devolver-lhes essa confiança do cinema” que por agora parece perdida. Durará três semanas “e vai ser alimentada com o lançamento de grandes títulos”, adianta, admitindo que blockbusters a estrearem-se é algo que tem faltado. O director-geral da FEVIP refere-se a filmes como O Rei de Staten Island, de Judd Apatow, que chega no dia 20, o ultra-antecipado e já várias vezes adiado Tenet, de Christopher Nolan, que se estreará a 26, e After – Depois da Verdade, de Roger Kumble, agendado para 2 de Setembro. É uma campanha “transversal”, frisa o organizador: não vale só para o “cinema de pipocas”, tal como não vale só para o cinema “de nicho”.
Casos mais felizes
Mas nem todos os cinemas portugueses estão a sofrer. Há várias salas independentes que dizem estar a viver um desconfinamento melhor do que seria de esperar. O Medeia Nimas, em Lisboa, por exemplo, contabilizou entre 6 e 12 de Agosto, segundo uma nota distribuída esta quinta-feira à imprensa, “1379 espectadores e várias sessões esgotadas” (com a lotação a metade, claro está). É aliás um aumento, sublinham, em relação ao período homólogo do ano passado.
Américo Santos, do Cinema Trindade, no Porto, assegura que “vale a pena [o cinema] estar aberto”. Sem especificar números, estima que as suas duas salas terão menos um quarto dos espectadores, mas que Agosto, por norma, “não é um bom mês para o cinema”. No ano passado, alavancado pela estreia de Era Uma Vez...Em Hollywood, o último filme de Quentin Tarantino, houve um aumento de espectadores. Este ano, “à custa” dos filmes restaurados em cópias digitais de Federico Fellini, “também está a ser um bom mês”, mas isso depende sempre “da programação” e do que houver “na semana”. Haver “menos público” obriga a “muito mais criatividade, mais programação e acontecimentos mais especiais”, como “ciclos próprios”. No caso do Trindade, foi o mote para o ciclo de cinema dedicado ao realizador pernambucano Kleber Mendonça Filho que já está a decorrer.
Pedro Borges, do Cinema Ideal, refere que a sua sala, implantada no centro de Lisboa, recebeu entre Junho e Julho 4194 espectadores, menos 399 do que no mesmo período de 2019. “Junho e Julho são tradicionalmente meses mais ‘fracos’ no Ideal, mas se compararmos a nossa quebra de 9% com a quebra de 90% nos outros cinemas… se calhar não temos muitas razões de queixa. Sobretudo depois da campanha – conduzida pela FEVIP e pela APEC – contra a reabertura dos cinemas e que teve consequências catastróficas para a actividade dos seus associados, mas que por tabela prejudicou também os cinemas independentes”, comenta.
Como a crise provocada pela pandemia é internacional, este não é só um problema português. Nos Estados Unidos, comparando os números de Julho de 2019 com os deste ano, percebe-se que se fizeram menos de 0,5% dos lucros. Entretanto, a exibição está a mudar, provavelmente para sempre. Não é só a falta de grandes estreias. Ainda na semana passada, um juiz federal declarou que o governo podia acabar com os decretos da Paramount que, no final dos anos 1940, tornaram ilegal um distribuidor ser dono de uma sala, a fim de evitar monopólios. Não é uma consequência directa, já que o Departamento de Justiça já andava, no período pré-pandemia, a tentar que isso acontecesse, mas é sinal de uma grande mudança e da concentração do negócio do cinema em entidades monopolistas. Tal como é outro sinal significativo o facto de a estreia do remake em imagem real de Mulan, o novo blockbuster por que anseia a Disney, estar agora programada para acontecer simultaneamente no serviço de streaming Disney+ e nos cinemas que em Setembro estiverem abertos.