Saber fazer e como fazer
Para pôr o país de novo a crescer, o ponto fundamental é saber como responder à questão de “como fazer”.
A covid-19 arrastou o mundo e o nosso País para uma crise com consequências económicas e sociais ainda difíceis de imaginar.
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A covid-19 arrastou o mundo e o nosso País para uma crise com consequências económicas e sociais ainda difíceis de imaginar.
Mostra a experiência que no fim de qualquer crise de grande dimensão nunca se regressa ao ponto de partida. As grandes crises conduzem sempre à renovação e à obtenção de novos equilíbrios.
Por isso, temos de estar preparados para viver uma fase de transição que seguramente será marcada por incertezas, equívocos, angústias, oportunismos e também desorientação, incluindo alguma do próprio Estado.
Na busca de novos equilíbrios, algumas vozes têm apontado caminhos que têm em comum a ideia da criação de condições para que haja um significativo aumento do investimento produtivo, capaz de incorporar alto valor acrescentado em produtos transacionáveis. Argumentam que será por aí que a criação de emprego bem remunerado é possível, a consolidação das contas públicas tornar-se realidade, o conhecimento e a inovação serem mobilizados, a riqueza nacional crescer de forma sustentada e, desse modo, dar uma mais alta prioridade às questões sociais, nomeadamente na promoção de mais igualdade, no combate à pobreza e no apoio às instituições sociais.
A procura dessa nova estratégia parece ser a preocupação maior dos responsáveis políticos, tendo o próprio Governo encomendado a uma personalidade de inegável craveira e prestígio a identificação de pistas, com vista à descoberta desse caminho. Esta é a fase de tentar encontrar respostas à pergunta de saber “o que fazer”. Esta fase, sendo importante, útil e necessária, é, contudo, insuficiente. Tenho a forte convicção de que o ponto fundamental tem mais a ver com a busca de respostas à questão de “como fazer”.
Nas atuais circunstâncias do País, o “como fazer” obriga à conceção de um modelo de organização que deveria ser concebido por forma a possibilitar uma atuação convergente em torno de três objetivos principais, a saber: recuperar, de forma progressiva e não abrupta, o equilíbrio das finanças públicas (a cadência e a tendência são aqui um aspeto muito importante), pôr a economia a crescer e combater as desigualdades sociais e regionais.
Estes pontos tornar-se-iam os vértices de um triângulo que delimitaria o espaço para o exercício da política económica e social dos próximos tempos.
A forma de atuar na área deste triângulo teria ser preenchida através de um Programa Nacional que teria de cumprir dois requisitos fundamentais. Por um lado, teria de ser credível, o que significa que do seu desenho se teria de concluir que estaríamos perante um programa ganhador e criador de condições para uma maior competitividade da economia nacional. Esse programa teria ainda de evidenciar, de forma muito nítida, o potencial de competitividade e de crescimento do País, logo a identificação clara de prioridades. A invocação das dificuldades teria de ser afastada e substituída pela afirmação das capacidades. Por outro lado, o Programa teria de se constituir também como elemento gerador de um clima de confiança junto dos agentes económicos e sociais, o que aconselha a que se façam todos os esforços, no sentido de ser conseguido um forte compromisso entre o Estado, parceiros sociais, autarquias e instituições sociais, com vista à obtenção de progressos, também no domínio social.
Mas não chega. Para garantir a eficácia do programa haveria ainda que assegurar o preenchimento de, pelo menos, quatro pressupostos, todos eles essenciais, mas difíceis de serem conseguidos. Primeiro pressuposto, o tempo. Um programa desta amplitude e natureza precisa, no mínimo, de uma década para a sua execução, logo seria fundamental garantir estabilidade política que seja garante que as linhas essenciais do programa teriam de ser objeto de um muito alargado consenso parlamentar; segundo, uma visão gradativa, que não deve ser confundida com uma atitude de menos firmeza na execução do caminho definido. Tal como disse Miguel Cadilhe “o gradualismo é a arte fina da política”; terceiro, estabilidade e coerência entre as políticas públicas desenhadas; e, quarto, um forte investimento no aumento da qualidade da administração pública, com a requalificação dos seus agentes e com a entrada de “sangue novo”, preparado e motivado.
A não ser definido aquele triângulo, identificados os respetivos vértices e preenchidos estes quatro pressupostos, o dinheiro que por aí vem nunca será suficiente para que ocorram alterações com verdadeiro significado e, no fim, o País perderá mais uma oportunidade.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico