Morreu John Hume, Nobel da Paz e “arquitecto” dos Acordos de Sexta-Feira Santa
Ex-líder do SDLP desempenhou um papel fundamental no processo que pôs fim à guerra civil na Irlanda do Norte e que culminou com os acordos de paz de 1998.
John Hume, antigo líder do Partido Social Democrata e Trabalhista (SDLP), vencedor do Nobel da Paz em 1998 e figura-chave no processo de paz que pôs fim à guerra civil na Irlanda do Norte, morreu esta segunda-feira, aos 83 anos.
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John Hume, antigo líder do Partido Social Democrata e Trabalhista (SDLP), vencedor do Nobel da Paz em 1998 e figura-chave no processo de paz que pôs fim à guerra civil na Irlanda do Norte, morreu esta segunda-feira, aos 83 anos.
Hume sofria de demência e de doença prolongada há vários anos e, segundo a família, morreu na residência para idosos onde vivia, em Derry, na Irlanda do Norte, cidade onde também nasceu, em 1937.
Professor de profissão, católico, antigo deputado e eurodeputado, ajudou a fundar o SDLP, que liderou entre 1979 e 2001.
Deu a cara por uma solução pacífica para acabar com os Troubles, o conflito armado entre os republicanos católicos, que lutavam pela integração da Irlanda do Norte na República da Irlanda, e os unionistas protestantes, leais à coroa britânica e ao Reino Unido, que durou trinta anos (1968-1998) e que ceifou a vida de mais de 3500 pessoas.
O diálogo – inicialmente secreto – que encetou com Gerry Adams, então líder do Sinn Féin (republicanos de esquerda), criou condições para o anúncio de cessar-fogo do braço armado do partido, o Exército Republicano Irlandês (IRA), em 1994 e abriu caminho para uma solução pacífica para o conflito.
Pelo meio de avanços e recuos nas negociações entre republicanos, protestantes e lideranças políticas britânicas e irlandesas, que Hume impulsionou e mediou, e que lhe valeu alguns inimigos em ambos os lados da barricada, foi possível estabelecer as bases para os Acordos de Sexta-Feira Santa, ou Acordos de Belfast, de 1998, ratificados pelos Governos do Reino Unido e da República da Irlanda.
Os acordos puseram fim a décadas de violência sectária na Irlanda do Norte e foram depois aprovados em referendo por irlandeses e norte-irlandeses.
Instituíram um parlamento em Belfast, definiram um sistema de partilha de poder, desmilitarizaram os grupos armados e consagraram o princípio fundamental segundo o qual o futuro constitucional da Irlanda do Norte terá de ser decidido pelos cidadãos dos dois lados da fronteira.
“Os Acordos de Sexta-feira Santa representam a personificação da crença e da visão da população irlandesa. John não foi o seu arquitecto ou o seu construtor, foi ambos. Será para sempre a sua inspiração duradoura”, reagiu o actual líder do SDLP, Colum Eastwood.
Citado pelo Irish Times, Eastwood rotulou Hume como o “líder político mais significativo e consequente” da Irlanda do século XX.
O papel que desempenhou para a resolução do conflito valeu a John Hume a atribuição do Prémio Nobel da Paz em 1998, galardão que partilhou com David Trimble, líder do Partido Unionista do Ulster (conservadores moderados).
“John sempre esteve firmemente comprometido com os meios pacíficos e opôs-se aos esforços de outras pessoas que queriam atingir os seus objectivos através da violência”, disse, por sua vez, Trimble, esta segunda-feira, citado pelo Guardian.
“Os que pensavam que poderiam vencer valendo-se da violência não tiveram sucesso e acabaram por perceber que tinham de iniciar um processo político, como o John sempre defendeu”, sublinhou.
Também o primeiro-ministro britânico recordou o trajecto e a importância política de Hume. Através do Twitter, Boris Johnson destacou o seu perfil de pacifista e proclamou: “John Hume foi simplesmente um gigante político”.