Club de Vila Real é a primeira sala de concertos a perder a luta contra a pandemia

Associação abandona casa que conheceu durante quase toda a sua existência no ano em que celebra o 125.º aniversário, mas vai procurar nova sede. No circuito da música ao vivo, teme-se que esta seja a primeira de muitas peças deste frágil dominó a cair.

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Reinventou-se em 2008 como uma das mais activas salas de concertos do país, recuperou em 2018 do temporário encerramento de 2017, mas não resistiu à pandemia de 2020. Certamente não era esta a celebração com que a direcção sonhava no ano do seu 125.º aniversário: suspenso o pagamento das rendas há cinco meses, o Club de Vila Real teve de fazer as malas e dizer um adeus definitivo à histórica casa na Avenida Carvalho Araújo que conheceu durante quase toda a sua existência. Vítima da inactividade que se iniciou com a declaração do estado de emergência e que não foi resolvida pelo desconfinamento, o espaço de espectáculos  que, em nota de imprensa, garante que vai dar continuidade ao seu trabalho “como associação” até encontrar nova sede  é a primeira baixa conhecida no fragilizado circuito de salas de música ao vivo, cuja sustentabilidade nunca foi uma incógnita tão grande.

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Reinventou-se em 2008 como uma das mais activas salas de concertos do país, recuperou em 2018 do temporário encerramento de 2017, mas não resistiu à pandemia de 2020. Certamente não era esta a celebração com que a direcção sonhava no ano do seu 125.º aniversário: suspenso o pagamento das rendas há cinco meses, o Club de Vila Real teve de fazer as malas e dizer um adeus definitivo à histórica casa na Avenida Carvalho Araújo que conheceu durante quase toda a sua existência. Vítima da inactividade que se iniciou com a declaração do estado de emergência e que não foi resolvida pelo desconfinamento, o espaço de espectáculos  que, em nota de imprensa, garante que vai dar continuidade ao seu trabalho “como associação” até encontrar nova sede  é a primeira baixa conhecida no fragilizado circuito de salas de música ao vivo, cuja sustentabilidade nunca foi uma incógnita tão grande.

Os problemas do Club não começaram, porém, com o novo coronavírus. A década em que a associação ampliou o seu espectro de acção, tornando-se paragem obrigatória para as bandas à procura das melhores salas do Portugal descentralizado, foi também aquela em que a necessidade de reabilitação de um edifício tão importante como “degradado” se tornou “incontornável”, explica ao PÚBLICO o presidente Luís Cardoso, membro da direcção desde 2018. As desavenças com o senhorio multiplicaram-se ao longo dos anos – o já mencionado encerramento temporário de 2017 surgiu depois de os proprietários do espaço na Avenida Carvalho Araújo alegadamente não assumirem “responsabilidades” por “obras que nunca foram feitas” – e, em 2018, o Club só conseguiu prolongar o seu contrato de arrendamento porque a Câmara Municipal de Vila Real o declarou entidade de interesse histórico, social e cultural.

A relação com a autarquia, que apoia a associação com pouco mais de mil euros anuais, não se revelou menos atribulada durante o confinamento. Luís Cardoso lembra que a sua equipa tentou, semanas após o encerramento decretado em Março, apresentar ao município ideias de actividades que podiam ser concebidas e apresentadas à distância com a integração de vários artistas locais, e lamenta que a Câmara não tenha revelado suficiente “abertura” para encabeçar um “diálogo” produtivo com o Club. “Neste momento, a criação de uma ponte sólida com a autarquia é tão importante como a procura de novas instalações”, assinala o rosto desta instituição cultural.

Enquanto tenta encontrar um novo espaço, a associação continuará a desenvolver um projecto financiado pela Direcção-Geral das Artes que visa o reconhecimento do valor patrimonial do “folclore transmontano”. Este mês, a equipa organiza também uma “residência artística” que envolverá estudantes locais do ensino secundário, convidados a criarem “peças novas a partir do espólio e do mobiliário antigo do Club”; a iniciativa conduzirá, em Setembro, a uma espécie de “exposição à porta fechada”, que aproveitará a montra de uma loja “relativamente próxima” da agora antiga sede.

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Concerto dos Baleia Baleia Baleia no Club Vila Real, na quarta edição do Circuito Super Nova Joana Lopes

O Club de Vila Real integra a Associação Portuguesa de Salas de Programação de Música, cuja formalização deverá acontecer “até ao fim de Agosto”, segundo Daniel Pires, o fundador do Maus Hábitos que, a par de Gonçalo Riscado, director da CTL – Cultural Trend Lisbon, empresa proprietária e gestora do Musicbox, é um dos impulsionadores da rede. O grupo pretende, entre outros objectivos, “profissionalizar o sector da música ao vivo” e ajudar o circuito das salas regionais “a chegar ao Ministério da Cultura”. “Vamos lá ver se por esta altura já não é tarde de mais”, lamenta Daniel Pires, que, não disfarçando a tristeza por saber que o Club de Vila Real está actualmente sem tecto, não ficou particularmente surpreendido com a notícia. “Foi a primeira de muitas salas a sair de cena. Vamos ver se sobra alguma no fim desta crise toda.”

“Há casas que estão em situações muito delicadas e quase tão perigosas como a nossa”, alerta Luís Cardoso, que passou a última semana “com caixas de arrumações até ao pescoço”. Para já, a missão é encontrar o canto ideal para desempacotar a tralha. Uma missão que “não será fácil sem o apoio do poder local” e que a crise levantada pela pandemia parece tornar ainda mais impossível. Mas motivação não falta. “Não posso descansar enquanto não encontrar um novo espaço para o Club. É demasiado importante para Vila Real e para a Região Norte.”