Petições há muitas, mas ciclovias são poucas
Ao contrário daquilo que pensava, o meu principal receio não são as subidas ou descidas, que tanto assustam quem não se movimenta a pedais, mas sim quando as ciclovias terminam e tenho de partilhar a via com outros veículos a motor. Ficamos todos em perigo: quem pedala e quem conduz.
Desde o final do mês de Maio, parece existir uma nova realidade em Lisboa. Temos definitivamente um menor número de turistas nas ruas, que é compensado pelo aparente aumento do número de pessoas que se desloca a caminhar ou em bicicleta. Será, numa perspectiva optimista, uma nova versão de viver Lisboa com uma participação mais activa do cidadão na vida da cidade.
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Desde o final do mês de Maio, parece existir uma nova realidade em Lisboa. Temos definitivamente um menor número de turistas nas ruas, que é compensado pelo aparente aumento do número de pessoas que se desloca a caminhar ou em bicicleta. Será, numa perspectiva optimista, uma nova versão de viver Lisboa com uma participação mais activa do cidadão na vida da cidade.
Também eu contribuo para esta nova realidade, uso menos transportes públicos, caminho mais e, desde que adquiri uma bicicleta, há relativamente pouco tempo, utilizo menos o carro. Passei a fazer as minhas tarefas quotidianas e os trajectos que antes eram feitos a pé, de transportes públicos ou de carro, a pedalar. Na maioria destas deslocações carrego mercadoria frágil, com dois anos de vida, e uns talvez excessivos 15 quilogramas. Ao contrário daquilo que pensava, o meu principal receio não são as subidas ou descidas, que tanto assustam quem não se movimenta a pedais, mas sim quando as ciclovias terminam e tenho de partilhar a via com outros veículos a motor. Ficamos todos em perigo: quem pedala e quem conduz.
Se até agora falo apenas com base na percepção e sem números, a alteração no modo como os lisboetas se deslocam no interior da cidade é uma das principais conclusões de um trabalho recentemente publicado por investigadores do CERIS do Instituto Superior Técnico. Uma das principais conclusões destes investigadores diz que se as infra-estruturas necessárias às deslocações em bicicleta forem criadas, nomeadamente ciclovias, os ciclistas aparecem. Não tendo qualquer apreço pelas políticas e estratégias do executivo camarário da cidade Lisboa para o desenvolvimento e gestão da cidade, o investimento em ciclovias é positivo e a sua utilização visível para quem se movimenta na cidade e não tiver um olhar enviesado sobre o tema. Havendo críticas, que sejam pela falta de ambição e por pecarem por defeito. Por exemplo, as zonas da cidade a Oeste da Avenida da Liberdade, e que não estão à beira-mar, são pouco fornecidas por ciclovias.
É neste contexto de uma nova Lisboa, Capital Verde 2020, que foi recentemente lançando uma petição pública online contra a “‘ciclovização’ desenfreada e insensata da cidade de Lisboa”. E que fez notícia, por exemplo, aqui. No dia da notícia, a petição contava com 901 assinaturas, enquanto escrevo estas linhas tinham assinado 995 pessoas. Os promotores desta petição alegam que as novas ciclovias causam transtorno na circulação dos veículos automóveis, sendo que a bandeira maior desta luta é a nova ciclovia na Avenida Almirante Reis. Um eixo central que une a zona ribeirinha a uma zona alta da cidade, com um desnível acessível a qualquer ciclista. Vale a pena realçar que das quatro vias de trânsito originais foi reclamada apenas uma para construir uma ciclovia que permite uma deslocação rápida e segura.
Mas valerá a pena discutir os problemas de mobilidade da cidade. Podemos começar pelos passeios estreitos, com obstáculos e pavimentos em más condições. Aproveitemos este período para repensar e devolver a cidade às pessoas. Petições há muitas, ciclovias seguras continuam a ser manifestamente poucas.