A emoção nos “tempos modernos” da educação

Perante uma educação (e sociedade) tendencialmente mais tecnológica e menos “humana”, importa reservar o lugar da emoção nas novas estratégias pedagógicas e na aprendizagem dos alunos.

Foto
PAULO PIMENTA

O atual contexto sanitário reforçou a relevância das ferramentas digitais na comunicação pedagógica. Ao mesmo tempo, enfatizou a crescente individualização de experiências tradicionalmente coletivas. Contudo, as emoções humanas mantêm-se como poderosos fatores para o desenvolvimento de aprendizagens significativas. Num momento em que urgem novos modelos de prática educativa, importa que os processos de distanciamento interpessoal através de canais digitais não anulem, mas potenciem, o envolvimento emocional dos jovens.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O atual contexto sanitário reforçou a relevância das ferramentas digitais na comunicação pedagógica. Ao mesmo tempo, enfatizou a crescente individualização de experiências tradicionalmente coletivas. Contudo, as emoções humanas mantêm-se como poderosos fatores para o desenvolvimento de aprendizagens significativas. Num momento em que urgem novos modelos de prática educativa, importa que os processos de distanciamento interpessoal através de canais digitais não anulem, mas potenciem, o envolvimento emocional dos jovens.

A imposição recente e generalizada de confinamento doméstico e a iminência de uma segunda vaga pandémica conduziram à natural necessidade de uma renovação pedagógica nas escolas e universidades. Estas têm procurado definir modelos logisticamente exequíveis e pedagogicamente válidos para fomentar nos seus estudantes as competências desejadas. Mas são várias as dúvidas e incertezas, sobretudo no que concerne ao impacto das novas estratégias e possibilidades educativas. As novas metodologias de ensino centraram-se nos meios eletrónicos e na comunicação em rede como soluções para a impossibilidade da partilha física de espaços. Reforçaram a necessidade de atribuir papéis ativos, autonomia e responsabilidade aos estudantes na construção do seu conhecimento, mas conduziram também ao enquadramento de cada aluno num ambiente de aprendizagem mais frio e distante.

Nos últimos 20 anos, vários estudos têm comprovado que o cérebro apreende e memoriza melhor tudo aquilo que nos provoca algum tipo de emoção. O relatório “Emotions and Learning” (2014) da Unesco apresenta dez princípios-chave pelos quais as emoções valorizam a diferença, a inclusão, a negociação e coabitação em grupo, a autoconfiança ou até a capacidade de enquadrar e resolver pulsões negativas no processo ensino-aprendizagem. Tudo o que nos emociona (positiva ou negativamente) convoca aquilo que somos, como indivíduos ou membros de coletividades (políticas, sociais, religiosas, etc.), pelo que qualquer processo de aprendizagem de algo exterior implica, necessariamente, aprendermos algo sobre nós mesmos. E poucas experiências conseguem fazê-lo como as artes ou, mais especificamente, o cinema.

A “desritualização” e individualização de uma experiência coletiva é algo que não é estranho à sétima arte. Desde finais do século XX, uma boa parte das oportunidades de fruição fílmica transferiu-se para os ambientes domésticos, a partir das tecnologias que o foram permitindo e encorajando. O VHS, o DVD e mais recentemente, a Internet (com todas as possibilidades de streaming ou VOD) provocaram uma diminuição generalizada do número de espectadores em salas de cinema, questionando o lugar do cinema enquanto “ritual” coletivo. No entanto, jamais abreviou a relevância das emoções no nosso contacto com os filmes. As expressões cinematográficas – ficcionais, não-ficcionais, narrativas ou experimentais – nunca ficaram órfãs da intenção de autores e recetores em proporcionar ou vivenciar emoções, oferecendo pontos de contacto, fontes de diálogo e fatores de motivação para aprendermos algo sobre o mundo ou sobre nós mesmos.

Em inglês, “to move” pode significar emocionar ou mover. Hoje, as emoções aparecem-nos – na educação, no cinema e noutros contextos de comunicação – cada vez mais como “e-moções”, ou seja, movimentos internos que convocam idiossincrasias pessoais ou coletivas, mas são agora fomentados, em grande medida, por canais eletrónicos. Perante uma educação (e sociedade) tendencialmente mais tecnológica e menos “humana”, importa reservar o lugar da emoção nas novas estratégias pedagógicas e na aprendizagem dos alunos. O presente contexto, inibindo a proximidade física, reforça a relevância da subjetividade dos jovens ao participarem naquilo que a sua cultura, sociedade e educação lhes oferece. Os universos sensíveis e desafiantes das narrativas ou não-narrativas artísticas são pedagogicamente acessíveis e ricos pela sua polissemia. Oferecem oportunidades para que os alunos desenvolvam competências curriculares e extracurriculares que definirão, consideravelmente, a sua identidade e comportamento. Assim, cada filme ou obra de arte permitir-lhes-á perspetivarem mundos, o deles e o de outros, presentes ou futuros, enriquecendo-os com novos significados e novas formas de ver e aprender.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico