O que é o SOS Amazónia, que recebeu 100 mil euros de Greta Thunberg?

Projecto pertence ao Fridays For Future Brasil e foca-se no apoio a comunidades indígenas da Amazónia. A doação da activista sueca vai permitir que continuem a distribuir alimentos e produtos de higiene — e a fazerem a medicina chegar a locais remotos.

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Nathan Anderson/Unsplash

Pouco tempo depois de se tornar público que Greta Thunberg era a vencedora do Prémio Gulbenkian para a Humanidade, a activista fez o anúncio: do milhão de euros que lhe foi atribuído, os primeiros 200 mil seriam divididos entre a Stop Ecocide Foundation, que luta para tornar o ecocídio um crime internacional, e o SOS Amazonia Campaign. E num momento em que os índios brasileiros enfrentam (mais) uma grande batalha, desta vez provocada pela pandemia, quisemos conhecer o trabalho do SOS Amazónia e perceber o que levou Thunberg a canalizar parte do seu prémio para esta organização.

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Pouco tempo depois de se tornar público que Greta Thunberg era a vencedora do Prémio Gulbenkian para a Humanidade, a activista fez o anúncio: do milhão de euros que lhe foi atribuído, os primeiros 200 mil seriam divididos entre a Stop Ecocide Foundation, que luta para tornar o ecocídio um crime internacional, e o SOS Amazonia Campaign. E num momento em que os índios brasileiros enfrentam (mais) uma grande batalha, desta vez provocada pela pandemia, quisemos conhecer o trabalho do SOS Amazónia e perceber o que levou Thunberg a canalizar parte do seu prémio para esta organização.

“O SOS Amazónia é um projecto do Fridays For Future Brasil que nasceu na pandemia e para os tempos de pandemia”, apresenta Abel Rodrigues, brasileiro nascido em Belém, capital do Pará, agora a viver em Lisboa e um dos responsáveis da organização. O gatilho para começar o movimento, em Maio último, conta o jovem de 20 anos, foi a mensagem de Arthur Virgílio Neto, prefeito de Manaus, a capital do estado do Amazonas, a apelar a Greta Thunberg para alertar os líderes globais para “a situação do coronavírus em Manaus, que estava incontrolável e insustentável”.

Desde então, o grupo, que conta com um núcleo duro de 16 activistas de todo o mundo, foca-se essencialmente no apoio a comunidades indígenas, passando para prática o lema “Dar força para quem protege a floresta” e focando-se em duas áreas: a da saúde e a das alterações climáticas. “Actualmente, estamos a realizar a distribuição de cestas básicas alimentares para comunidades indígenas — dentro de Manaus, ao redor e também no interior do estado do Amazonas”, conta Abel. Cada cesta é personalizada de acordo com a dieta de cada comunidade indígena, “para respeitar a cultura e a tradição”. Com as cestas, enviam também álcool-gel e materiais de higiene, para auxiliar na prevenção do vírus.

Tudo começou — e tem sido possível — graças a um crowdfunding criado no site do projecto, que estabelecia uma meta de um milhão de reais, cerca de 160 mil euros, para dar apoio a comunidades indígenas. Até agora, o SOS Amazónia já ajudou 1489 famílias de 16 comunidades, o que deverá significar aproximadamente 5956 pessoas, se for assumida uma média de quatro pessoas por família.

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Abel Rodrigues discursou na chegada de Greta Thunberg a Portugal DR

A ajuda a estas comunidades torna-se especialmente importante em tempos de pandemia: “Segundo dados que a Articulação de Povos Indígenas do Brasil (APIB) compilou, mais de 9% dos indígenas que entra em contacto com o vírus acaba morrendo. Para a população brasileira em geral, esse número é de apenas 5%. A gente vê que é quase o dobro da taxa de letalidade”, refere. Mais ainda, coloca-se o “problema cultural” inerente ao facto de as comunidades indígenas, “especialmente os anciãos”, guardarem o saber, histórias e tradições das comunidades. “O conhecimento é sobretudo passado oralmente e quando essas pessoas, de repente, são atingidas por um vírus, muito desse conhecimento acaba perdido”, lamenta Abel. “Estamos a falar de línguas, tradições, conhecimentos sobre a flora, que são milenares, muitas vezes, e estão sendo perdidos por conta do vírus.”

Do ponto de vista ambiental e climático, a perda de vidas indígenas representa também a perda de um escudo. “Quando a gente vê que essas populações correm o risco de genocídio, a gente percebe que a floresta acaba ficando sem seus defensores originais.” É que “quando a indústria madeireira e extractivista invade aquela floresta com o objectivo de extrair recursos, quem está lá a defendê-la são os indígenas”, atira. O que significa que sem eles “não há protecção”, não há uma linha da frente contra o desmatamento que assola a floresta da Amazónia.

Por isso, a doação feita pela activista sueca através da Fundação Greta Thunberg vai permitir que o movimento se concentre em “expandir a entrega de cestas básicas alimentares a mais regiões”, sendo que o próximo passo deverá ser a instalação de painéis solares em áreas remotas, a aquisição de equipamentos electrónicos, como computadores, e a obtenção de Internet via satélite, de forma a proporcionar atendimento médico, que deverá ser feito por profissionais de saúde de Manaus contratados para o efeito. “Tudo isso conforme o orçamento já estabelecido desde o início da campanha”, que antes da parcela disponibilizada por Thunberg, contava apenas com 25% do valor pretendido. Actualmente o valor do crowdfunding fixa-se em 250 mil reais, cerca de 40 mil euros.

Ajudar o SOS Amazónia está ao alcance de todos. Doar é, “obviamente, a forma mais directa de ajuda”, e pode ser feita directamente no site. Mas, tendo em conta que “a situação financeira está muito complicada”, a solução para quem quer ajudar pode passar por um acto tão simples como partilhar: “Partilhar a mensagem e a campanha”, mostrar ao mundo o que está a acontecer.