Protestos regressam em força nos EUA após intervenção federal em Portland

Manifestações anti-racismo estavam a perder intensidade um pouco por todo o país até que a Administração Trump enviou agentes federais para várias cidades geridas pelo Partido Democrata. Só em Seattle e Omaha foram detidas 145 pessoas no sábado.

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Em Portland há protestos diários há quase dois meses DAVID SWANSON/EPA

A vaga de protestos anti-racismo e contra a violência policial que marcou grande parte dos últimos dois meses nos Estados Unidos começou a transformar-se, nos últimos dias, numa onda de manifestações contra o envio de agentes de forças federais para cidades como Portland e Chicago, por ordem do Presidente Donald Trump. Na noite de sábado para domingo, 145 pessoas foram detidas em confrontos com a polícia um pouco por todo o país, um homem foi morto a tiro no Texas e um automobilista tentou atropelar um grupo de manifestantes no Colorado.

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A vaga de protestos anti-racismo e contra a violência policial que marcou grande parte dos últimos dois meses nos Estados Unidos começou a transformar-se, nos últimos dias, numa onda de manifestações contra o envio de agentes de forças federais para cidades como Portland e Chicago, por ordem do Presidente Donald Trump. Na noite de sábado para domingo, 145 pessoas foram detidas em confrontos com a polícia um pouco por todo o país, um homem foi morto a tiro no Texas e um automobilista tentou atropelar um grupo de manifestantes no Colorado.

O principal palco dos confrontos deste fim-de-semana nos Estados Unidos foi Seattle, a cidade mais populosa do estado de Washington, na costa Oeste do país.

Foi lá que milhares de pessoas – entre 2000 e 5000, consoante as fontes – começaram a juntar-se ao início da tarde de sábado para protestarem contra as cargas de agentes federais em Portland, no estado vizinho do Oregon

Ao início da noite de sábado, um grupo de manifestantes ateou fogo a um contentor na área onde está a ser construído o futuro centro de detenção de menores de Seattle – uma construção muito contestada nos meios mais progressistas, que defendem o fim da punição de crianças e adolescentes com penas de prisão.

A caminho da Baixa da cidade, onde os manifestantes se têm concentrado em frente à esquadra da polícia local, algumas pessoas vandalizaram edifícios e partiram as montras de uma loja da cadeia Starbucks, alvo de protestos pelo seu apoio financeiro à polícia de Seattle. 

Pouco depois da chegada dos manifestantes às imediações da esquadra, que está encerrada e protegida por um cordão de segurança, a polícia declarou que estava em curso um motim e carregou contra os manifestantes com gás lacrimogéneo e gás pimenta. 

Segundo a polícia, a declaração de motim (que autoriza o uso do gás e de armamento de controlo de multidões considerado não-letal) foi activada após o lançamento de pedras e garrafas contra os agentes. Ao fim da noite, a polícia de Seattle anunciou que foram detidas 45 pessoas.

Em Austin, no estado do Texas, um manifestante foi morto por um automobilista que buzinou à passagem do protesto. Segundo a polícia, o manifestante ter-se-á aproximado do veículo armado com uma espingarda, e terá sido morto a tiro pelo automobilista.

Ao longo da noite houve também cenas de violência entre manifestantes e a polícia em Los Angeles e Oakland (Califórnia), Richmond (Virgínia), Omaha (Nebraska), Nova Iorque, Portland e Aurora, no estado do Colorado, onde um grupo de manifestantes foi abalroado por um automóvel e pelo menos uma pessoa foi baleada, sem que haja registo de vítimas mortais. Em Omaha, a polícia local disse que foram detidas 100 pessoas na noite de sábado para domingo.

Operação Legend

No início de Julho, a Casa Branca enviou para Portland um contingente de agentes federais requisitados a várias agências do Departamento de Segurança Interna, principalmente aos guardas que patrulham a fronteira com o México.

O objectivo, segundo a Administração Trump, é proteger a propriedade do Governo norte-americano, em particular estátuas e outros monumentos e o edifício em que funciona o tribunal distrital do Oregon.

Quase ao mesmo tempo, o Presidente Trump anunciou o início de uma operação de policiamento federal em vários estados, a que chamou Operação Legend, distinta da que está em curso em Portland.

Segundo a Casa Branca, essa operação tem como objectivo ajudar as polícias de várias cidades de média e grande dimensão a reporem a ordem perante um aumento da criminalidade nos últimos meses.

Até ao momento foram enviados agentes federais para Chicago (Illinois), Albuquerque (Novo México) e Kansas City (Missouri), e há planos para estender a Operação Legend a Baltimore (Maryland), Filadélfia (Pensilvânia), Cleveland (Ohio), Detroit (Michigan), Milwaukee (Wisconsin) e Seattle (Washington).

Tal como Portland, todas elas têm como presidentes de câmara políticos do Partido Democrata, que o Presidente Trump acusa de não conseguirem controlar os protestos. Uma delas, a cidade de Milwaukee, vai ser o palco da convenção nacional do Partido Democrata entre 17 e 20 de Agosto, onde Joe Biden vai ser confirmado como candidato à Casa Branca nas eleições de Novembro.

Os governantes de todas as cidades incluídas na Operação Legend rejeitam a intervenção dos agentes federais e acusam o Presidente Trump de estar a encobrir o falhanço do seu combate à pandemia da covid-19 com uma postura agressiva, apresentando-se como “o Presidente da lei e da ordem”.

“Vamos falar a sério: Trump não quer reprimir a violência em Portland”, diz o jornalista e comentador político Nicholas Kristof na sua coluna de opinião no New York Times. “Ele quer provocar a violência para desviar a atenção de 140 mil mortes por covid-19 nos Estados Unidos. Mais uma vez, está a lançar gás lacrimogéneo contra manifestações pacíficas para ter uma fotografia – e está a fazer isto todas as noites em Portland.”

Para alguns críticos do Presidente norte-americano, o país corre o risco de ir a eleições, em Novembro, debaixo de uma lei marcial que poderia limitar o acesso dos cidadãos ao voto. 

Apesar de o Presidente dos Estados Unidos não ter poder para adiar eleições presidenciais, que são marcadas por uma lei federal que só o Congresso pode alterar, os especialistas em Direito dizem que tem ao seu dispor várias formas de limitar a afluência às urnas – um cenário que, segundo a generalidade dos analistas, seria favorável ao Presidente Trump.

“O menu de opções inclui interromper ou controlar de forma selectiva as comunicações através da Internet, enviar tropas para reprimir supostos motins, deter ‘subversivos’ e impor o recolher obrigatório – cada uma destas opções pode, pelo menos, ser suficiente para reduzir a afluência a números históricos e dar-lhe a vitória”, dizem Mark Medish e Joel McCleary, dois veteranos dos governos de Bill Clinton e Jimmy Carter, no site do fórum Just Security, onde se analisam matérias de segurança nacional norte-americana.