Teste ao sangue detecta cancro até quatro anos antes do diagnóstico convencional
Nova técnica reconhece pequenos pedaços de ADN que são libertados por cinco tipos de cancro na corrente sanguínea. O método inovador é apresentado esta semana na revista Nature Communications.
Chama-se PanSeer e é um novo exame ao sangue que permite detectar sinais de cancro no estômago, esófago, colo-rectal, pulmão e fígado de uma forma muito precoce, em pessoas que ainda não manifestaram sintomas da doença. A nova técnica foi desenvolvida por uma equipa de investigadores nos EUA e permitiu reconhecer cinco tipos de cancro até quatro anos antes de um diagnóstico convencional. Apesar dos bons resultados obtidos e da elevada taxa de precisão, os cientistas sublinham que o teste ainda não está pronto para usar em contexto clínico.
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Chama-se PanSeer e é um novo exame ao sangue que permite detectar sinais de cancro no estômago, esófago, colo-rectal, pulmão e fígado de uma forma muito precoce, em pessoas que ainda não manifestaram sintomas da doença. A nova técnica foi desenvolvida por uma equipa de investigadores nos EUA e permitiu reconhecer cinco tipos de cancro até quatro anos antes de um diagnóstico convencional. Apesar dos bons resultados obtidos e da elevada taxa de precisão, os cientistas sublinham que o teste ainda não está pronto para usar em contexto clínico.
É mais um avanço no campo do diagnóstico precoce do cancro através de métodos minimamente invasivos e que se servem apenas de uma simples amostra de sangue. Desta vez, o teste procura sinais de uma modificação química no ADN (metilação) no sangue que está associada à presença de um tumor. O trabalho apresentado por uma equipa da Universidade da Califórnia, em San Diego, que contou com a colaboração de investigadores da Universidade Fudan, na China, e da start-up internacional Singlera Genomics, é descrito esta semana na revista Nature Communications.
O artigo revela que o PanSeer conseguiu detectar precocemente, em pessoas sem sintomas, 91% dos casos de cinco tipos de cancro até quatro antes de um diagnóstico tradicional. O teste também detectou 88% dos casos de pessoas que já tinham um tumor diagnosticado e definiu correctamente 95% dos casos em que os participantes testados não desenvolveram qualquer lesão maligna.
Apesar de ainda não conseguir atingir os ideais 100% que se exigem num delicado diagnóstico como este, a nova técnica representa um avanço indiscutível na área da detecção precoce de cancro que pode ser decisiva para o prognóstico de um doente e, mais precisamente, para aumentar as hipóteses de sobrevivência. Os autores notam que apesar destes resultados é necessário esperar por dados de mais estudos longitudinais, a nova técnica demonstra “que o cancro pode ser detectado de maneira não invasiva até quatro anos antes do padrão actual de cuidados”.
No trabalho, os investigadores fazem questão de alertar que este teste não servirá para detectar doentes que ainda não tenham qualquer lesão maligna, mas que mais tarde podem vir a desenvolver um tumor. O que o PanSeer reconhece são sinais de um cancro numa fase ainda muito inicial, mas a lesão tem de estar lá. Assim, esta ferramenta será útil, acima de tudo, para identificar doentes que já têm um tumor, só que permanecem assintomáticos e que não foram diagnosticados pelos métodos convencionais, com a grande vantagem de garantir desta forma um importante alerta muito precoce que depois necessitará sempre de mais testes e exames para confirmação.
É, aliás, através do reconhecimento dos sinais das alterações no ADN provocadas por um tumor e que depois passam para a corrente sanguínea que este teste funciona. Assim, os cientistas conceberam um teste que detecta estas “assinaturas de metilação específicas do cancro” no sangue. Neste trabalho a equipa analisou amostras de plasma de 605 indivíduos assintomáticos, dos quais 191 foram depois diagnosticados com cancro. Foram também analisadas as amostras de outros 223 doentes com um cancro já diagnosticado e 200 amostras de tumores primários e tecidos normais. “Nos doentes com pré-diagnóstico de cancro, observámos uma sensibilidade geral de 95% no conjunto de testes. A sensibilidade foi semelhante nos doentes que acabaram por ser diagnosticados com cancro em estádio inicial e nos doentes diagnosticados com cancro tardio e variou de 91% no cancro de esófago a 100% no cancro de fígado”, escrevem os autores do artigo.
Na descrição do processo usado para o teste, os cientistas referem que o PanSeer está apoiado no reconhecimento de biomarcadores de metilação do ADN tendo como alvo mais de dez mil alterações em quase 500 regiões genéticas diferentes que são analisadas simultaneamente. “O ensaio PanSeer foi capaz de detectar com sucesso cinco tipos de cancro usando um conjunto comum de marcadores de metilação, independentemente do tecido de origem”, conclui a equipa.
Há actualmente inúmeros projectos de investigação com diferentes abordagens e que têm o mesmo objectivo de desenvolver um teste sanguíneo para detecção precoce do cancro. O recurso às marcas de metilação no ADN é uma das estratégias que têm sido exploradas e o PanSeer comprova a utilidade deste biomarcador com a vantagem de não necessitar de uma grande quantidade da amostra recolhida, exigindo uma única recolha normal (um tubo) de sangue e, por isso, é um procedimento com custos baixos.
“Antevemos um contexto clínico em que o PanSeer poderia ser usado como um rastreio de primeira linha” em que qualquer doente com teste positivo no PanSeer passaria depois por um exame mais completo (com diferentes e mais específicas análises ao sangue, entre outros meios) “para permitir mapear o tecido de origem”. Depois, o exame patológico serviria para confirmar a presença de cancro.
Os autores do estudo reconhecem que esta ferramenta tem ainda “várias limitações” e, no artigo, apresentam com detalhe oito frentes do trabalho que terão afectado a investigação e que devem ser melhoradas no futuro. Entre outras, os cientistas referem por exemplo que falta realizar um estudo longitudinal prospectivo mais completo e aproveitar melhor a técnicas de preservação do plasma que minimizam o risco da contaminação das amostras de sangue. Por outro lado, referem ainda que só tiveram acesso a um mililitro de plasma por amostra e que os resultados podiam ser mais fortes se tivessem sido usadas quantidades à volta dos dez mililitros e que, de uma forma geral, o número de amostras de tumores usadas no estudo foi limitado.
Mesmo assim, a equipa conclui que a experiência com o PanSeer “fornece uma demonstração preliminar e robusta da detecção precoce de vários tipos de cancro quatro anos antes do diagnóstico convencional e estabelece as bases para um exame de sangue não invasivo para detecção precoce de cancro de alto risco (ou risco médio) na população. No futuro, acrescentam ainda os autores, “para estabelecer completamente a utilidade clínica do PanSeer e validar completamente os resultados da detecção pré-diagnóstico de cancro, esperamos prosseguir com um grande estudo prospectivo em indivíduos saudáveis para determinar se o rastreio não invasivo do cancro pode reduzir as mortes por cancro de forma económica”.