A Hertech quer mostrar como a engenharia não é “coisa de rapazes”
Projecto nascido na Universidade do Minho quer acabar com os estigmas de género nas engenharias. A Hertech é uma rede de networking feminina, criada por três estudantes e uma professora.
Longe vão os tempos em que havia cursos para meninas e cursos para meninos, mas o legado dos estereótipos de género ainda se faz sentir. O ramo das engenharias é um dos exemplos mais óbvios da falta de representatividade feminina nas áreas STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática, na sigla em inglês), mas a Hertech quer mudar essa realidade. Criado na Universidade do Minho (UM), o projecto tem como objectivo incentivar mais raparigas a abraçar as engenheiras que têm dentro de si.
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Longe vão os tempos em que havia cursos para meninas e cursos para meninos, mas o legado dos estereótipos de género ainda se faz sentir. O ramo das engenharias é um dos exemplos mais óbvios da falta de representatividade feminina nas áreas STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática, na sigla em inglês), mas a Hertech quer mudar essa realidade. Criado na Universidade do Minho (UM), o projecto tem como objectivo incentivar mais raparigas a abraçar as engenheiras que têm dentro de si.
“Esta iniciativa surgiu no âmbito de um projecto de mentoria, realizado pelas Portuguese Women in Tech, uma comunidade que surgiu em 2016 em Portugal e que tem como objectivo atrair mais mulheres para a área da tecnologia. A professora Filomena e eu inscrevemo-nos neste programa e na altura deram-nos liberdade total. Reparámos que existe uma grande discrepância em alguns cursos da área de engenharia entre os géneros e foi assim que surgiu a ideia”, explica Carolina Pereira, estudante do mestrado integrado de Engenharia Têxtil e uma das responsáveis da rede Hertech, ao P3.
A ideia nasceu em Abril de 2020, mas só em Junho começou a ganhar forma, tendo já sido realizado um podcast com o mote do teletrabalho entre géneros. “Participámos também, na sequência, em podcasts da Escola de Engenharia, em que vários núcleos iam lá e apresentavam a temática, no nosso caso era a engenharia no feminino”, refere Araci Silva, aluna do mestrado integrado de Engenharia Biológica. Para as 18h30 desta quarta-feira, 22 de Julho, está prevista a realização de uma formação sobre inteligência emocional, no Zoom, e o núcleo conta também participar na Universidade de Portas Abertas (UPA), para divulgar a oferta da instituição aos estudantes do secundário.
Mas, afinal, o que explica a discrepância entre os géneros nas engenharias? Filomena Soares dá aulas no departamento de Electrónica Industrial da UM e realça que as diferenças variam bastante de curso para curso. “Se formos para os cursos onde dou mais aulas, como de electrónica ou informática, são maioritariamente rapazes. Os cursos de Bio e Gestão Industrial são mais equilibrados, mas no geral há aquele estigma de que engenharia é trabalhar com carros e montar circuitos, o que afasta as raparigas. É isso que nós gostaríamos de trabalhar com as alunas do secundário e explicar que as engenharias são muito mais do que esses estereótipos”, esclarece.
Ainda persistem os preconceitos de que as áreas ligadas à biologia são mais adequadas para raparigas, segundo Araci Silva. “Há um estigma de que as Bio têm de ser direccionadas às raparigas, pela sensibilidade que possamos ter, o que não é bem realidade”, sublinha. Apesar de a Hertech ser uma rede feminina, os rapazes não são esquecidos e há o desejo de que os números nos cursos dominados por raparigas também se equilibrem.
Estudante do mestrado integrado de Engenharia e Gestão Industrial, Tatiana Guimarães faz também a gestão das redes sociais da Hertech. O seu curso é um dos que tem uma menor diferença de género, mas isso não impede que haja situações caricatas. “No último semestre, o meu grupo para um projecto era constituído por 10 raparigas e quando o nosso tutor nos conheceu disse ‘Vocês são só mulheres, têm mesmo a certeza? De certeza que isto não vai funcionar’ e nós sentimo-nos tão mal com essa situação que andámos o semestre todo a provar-lhe que íamos ser o melhor grupo e acabamos por sê-lo. Foi um desafio que nos foi imposto só por sermos mulheres”, conta.
O caminho para mudar o paradigma passa pela educação. “Temos de saber educar e lutar logo cedo contra os estigmas. Depois, temos de mostrar o que fazemos e participar nas actividades da universidade, como o Verão no campus ou o UPA, para as estudantes virem aos nossos laboratórios e instalações, porque só quando vemos é que entendemos o que acontece. No meu caso, quando fui para Engenharia Biológica achei que ia ser maioritariamente biologia e, na realidade, o curso tem muita química e matemática, por isso acho que passa pela educação dos alunos e dos pais”, explica Araci Silva. Tatiana Guimarães acrescenta que há pouca informação sobre os cursos de engenharia para além das mais conhecidas, como a Civil ou a Informática, e que “faz falta essa divulgação por igual”.
“Desde os nove anos que a minha filha participou no RoboParty, um evento organizado pelo meu departamento em que os jovens passam três dias na universidade e lhes dão um kit robótico desmontado. Têm que soldar peças e construir rodas, por isso inclui partes de mecânica, electrónica e programação. Acho que actividades como estas são muito importantes para a descoberta do que a engenharia pode ser”, revela Filomena Soares.
A Hertech não fecha a porta à possibilidade de fazer parcerias com núcleos semelhantes noutras universidades. “Confesso que não sei da existência de outros núcleos, terei de me informar mais. Existe a organização internacional Women Engineering e, apesar de termos um espectro mais dirigido à Universidade do Minho, partilhamos o mesmo objectivo. Já tivemos uma reunião com a presidente e uma das actividades programadas para Setembro é organizar um evento com elas”, conclui a docente.
Texto editado por Ana Maria Henriques