Noites do Palácio: concertos desconfinados para mostrar que cultura e pandemia podem conviver
Rui Moreira cansou-se de aguardar pelos prometidos apoios do Ministério da Cultura e convidou promotores para desenhar um ciclo de oito concertos na cidade. De 31 de Julho a 22 de Agosto, passam pelos jardins do Palácio de Cristal os Blind Zero, António Zambujo, Rui Veloso e outros nomes da música portuguesa.
Oito concertos a 10 euros e para um máximo de 600 pessoas em lugares sentados - com o devido distanciamento e uso de máscara obrigatório. As Noites do Palácio serão “o primeiro grande evento organizado na cidade após esta nova fase de desconfinamento” e querem estender a mão a um sector “duramente afectado por esta pandemia”. Rui Moreira esteve esta manhã de quarta-feira nos jardins para apresentar o programa cuja organização ficou a cargo de dois dos grandes organizadores de festivais do país, a Everything in New e a PEV Entertainment. Para a Câmara do Porto, que promoveu a iniciativa e a apoia com 200 mil euros, esta é uma cartada com benefícios múltiplos: por um lado, ajudar o sector, por outro “animar os Jardins do Palácio” e, “em termos de turismo doméstico, atrair mais gente para a cidade.”
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Oito concertos a 10 euros e para um máximo de 600 pessoas em lugares sentados - com o devido distanciamento e uso de máscara obrigatório. As Noites do Palácio serão “o primeiro grande evento organizado na cidade após esta nova fase de desconfinamento” e querem estender a mão a um sector “duramente afectado por esta pandemia”. Rui Moreira esteve esta manhã de quarta-feira nos jardins para apresentar o programa cuja organização ficou a cargo de dois dos grandes organizadores de festivais do país, a Everything in New e a PEV Entertainment. Para a Câmara do Porto, que promoveu a iniciativa e a apoia com 200 mil euros, esta é uma cartada com benefícios múltiplos: por um lado, ajudar o sector, por outro “animar os Jardins do Palácio” e, “em termos de turismo doméstico, atrair mais gente para a cidade.”
O nome escolhido para o evento não deixa esquecer o festival que durante 25 anos se realizou no Porto. Em 2019, a autarquia anunciou o fim das Noites Ritual argumentando que o festival que fechava os festivais de Verão havia perdido público ao longo dos anos e, com isso, teria esvaziado o seu sentido. Além disso, o renovado Super Bock Arena Pavilhão Rosa Mota acabara as suas obras de requalificação e conciliar a existência de um festival de música e um multiusos parecia tarefa complexa. O que mudou, então, um ano depois?
“As coisas nunca são eternas, mudam em função de circunstâncias externas”, começou por justificar Rui Moreira, garantindo não temer más interpretações por criar agora um evento em tudo semelhante àquele que foi extinto: “Nessa altura, com o Rosa Mota aberto e verificando que havia menos público entendeu-se não continuar a apoiar. Se não estivéssemos a viver a pandemia não íamos fazer as Noites do Palácio. Tínhamos feito o Piquenique, havia imensos festivais, os jovens estariam no Neopop, nas Marés Vivas. A situação é muito diferente. E quando há uma situação diferente precisamos de meter no assador coisas diferentes.”
Com dois concertos por semana, o cartaz inclui António Zambujo (31 de Julho), The Black Mamba (1 de Agosto), HMB (7 de Agosto), Gisela João (8 de Agosto), Jorge Palma (14 de Agosto), Diogo Piçarra (15 de Agosto), Blind Zero (21 de Agosto) e Rui Veloso (22 de Agosto). Das oito entidades, da cidade e de fora, convidadas pela Câmara do Porto para apresentarem propostas, quatro decidiram fazê-lo, três foram validadas e uma foi a mais votada por um júri liderado por Paulo Vinhas.
30 milhões do Ministério da Cultura? “Não chegou nada"
O apoio financeiro da autarquia surgiu para conseguir manter o preço “convidativo”, explicou o autarca, admitindo que com bilhetes a 10 euros, uma lotação do recinto mais limitada e procurando qualidade na escolha dos artistas, o ciclo de concertos “nunca poderia ser rentável”. É um apoio “inédito” que Rui Moreira gostaria de ter visto chegar de Lisboa, mas do qual se cansou de esperar.
“Ouvimos falar em 30 milhões de euros para a cultura através das autarquias. Não sei quando é que vai chegar, se vai ser no Inverno… A verdade é que não chegou nada”, afirmou, em declarações aos jornalistas. “Mesmo em termos de fundos estão a pedir-nos reprogramação e a retirar parte daquilo que era para a cultura e outras actividades. Perante isso, esperamos até ao momento em que nos pareceu que devíamos fazer mais qualquer coisa. Temos vindo a apoiar produtores através do Rivoli, muito nas áreas do teatro e da dança, pareceu-nos que tínhamos de fazer mais alguma coisa.”
"No limite da sobrevivência"
Miguel Guedes, vocalista dos Blind Zero que viu todos os espectáculos cancelados no ano em que a banda sopra as 25 velas, espera que das Noites do Palácio nasça uma “belíssima reflexão do que deve ser feito” pelo país: “Com toda a segurança e com um cartaz que nos devolve à vida”, disse. “É necessário, nesta altura, separar os necessários cuidados dos demasiado pruridos. O país parece querer encostar-se, culturalmente, a uma atitude de ‘está bem assim até que um dia seja melhor’. E claramente que há músicos, artistas, bailarinos, actores no limite da sobrevivência.”
Foi também essa a mensagem dos produtores e organizadores do evento. Num “ano atípico” onde quase nada se fez, as Noites do Palácio são para o presidente executivo da PEV Entertainment, Jorge Lopes, uma “luz ao fundo do túnel” para a cultura e para a música. E uma forma de “mostrar que é possível continuar a fazer coisas” e a voltar a “dar emprego” aos muitos que ficaram sem ele.
Álvaro Covões, director-geral da Everything is New, foi ainda mais duro nas críticas aos decisores políticos. “Pouco tem acontecido porque as instituições ligadas ao poder central nem sequer fizeram um esforço para transferir eventos para o ar livre”, acusou. Para um sector que “continua confinado”, o momento é de “dificuldades muito grandes” – e Álvaro Covões quis alertar para os efeitos colaterais que tal pode causar, tanto no turismo como nos negócios em geral. Deixando um convite a outras autarquias para que repliquem o exemplo da Câmara do Porto, o produtor falou num “drama” vivido por muitos artistas. “O risco sério que corremos é que mudem de profissão.”