Como a covid-19 fez esquecer as regras básicas de higiene na restauração... E não só
Apesar de todo o enquadramento legal, comunicação de boas práticas e conhecimento aparentemente generalizado numa sociedade desenvolvida, situações caricatas multiplicam-se no nosso dia-a-dia, em contexto profissional e da vida pessoal.
Em tempos conturbados de pandemia têm proliferado, por parte das instituições governamentais, um sem número de orientações e códigos de boas práticas com recomendações que permitem minimizar o risco de contaminação. Embora estas diretivas nem sempre sejam consensuais, e existam temas, para os quais as opiniões se dividem, há recomendações que são absolutamente indiscutíveis e fundamentais: a etiqueta respiratória e a lavagem das mãos.
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Em tempos conturbados de pandemia têm proliferado, por parte das instituições governamentais, um sem número de orientações e códigos de boas práticas com recomendações que permitem minimizar o risco de contaminação. Embora estas diretivas nem sempre sejam consensuais, e existam temas, para os quais as opiniões se dividem, há recomendações que são absolutamente indiscutíveis e fundamentais: a etiqueta respiratória e a lavagem das mãos.
No contexto da restauração, desde 1998 com a publicação do Decreto-lei n.º 67/98, que é obrigatóro um conjunto de regras de higiene pessoal, entre outras, que visam garantir a segurança dos alimentos e dos consumidores. Mais recentemente este diploma foi substituído por legislação europeia nomeadamente através do Regulamento 852/2004, mais abrangente e com caráter transversal a toda a União Europeia.
Apesar de todo o enquadramento legal, comunicação de boas práticas e conhecimento aparentemente generalizado numa sociedade desenvolvida, situações caricatas multiplicam-se no nosso dia-a-dia, em contexto profissional e da vida pessoal.
Funcionários da restauração que agora se encontram totalmente empenhados em usar máscara, esquecem-se de que não podem deixar de usar o cabelo protegido, unhas curtas e sem verniz, abster-se de usar adornos e não manipular alimentos prontos a consumir com as mãos desprotegidas, muito menos depois de mexer em dinheiro, sem previamente lavar as mãos.
No supermercado, uma funcionária da peixaria coloca cuidadosamente a máscara e calça as luvas, mas esquece-se que está de cabelo solto e desprotegido. Uma supervisora que, de máscara colocada, não se coíbe de, na tarefa de controlar as temperaturas de alimentos armazenados em estantes de refrigeração mais altas, subir de sapatos calçados e desprotegidos, para a prateleira de baixo, de forma a alcançar os produtos mais altos. Em restaurantes, funcionários preocupados em usar gel desinfetante entre tarefas, negligenciando a prática insubstituível de lavar as mãos.
Indivíduos com a preocupação de usar máscara pecam, frequentemente, pelo estado da mesma, que sendo descartável, ou seja, de utilização única, é usada repetidamente; e ainda pelo uso de máscaras comunitárias, usadas repetidamente sem serem lavadas. A utilização de ambos os tipos de máscara deve obedecer a cuidados especiais de utilização (cobrir boca e o nariz) bem como de acondicionamento quando não estão a ser usadas (colocação preferencial numa saqueta de papel ou pano). Caso contrário incorremos no risco de que a máscara se torne um veículo de contaminação em vez de proteção.
Estes exemplos evidenciam duas situações igualmente preocupantes. Por um lado, estamos a substituir a regras básicas de higiene pela desinfeção desenfreada das mãos e por outro a negligenciar boas práticas de higiene que se supunha estarem plenamente implementadas e que afinal foram rapidamente descuradas.
Lavar as mãos é uma prática de higiene com quase dois séculos de existência, com resultados comprovados cientificamente em termos da sua eficácia. O objetivo da lavagem das mãos consiste em remover a sujidade e a matéria orgânica que pode ser sucedida por uma desinfeção. Esta desinfeção, como o próprio nome indica, visa eliminar microrganismos e não substitui a lavagem prévia. Poderá ser suficiente lavar e não desinfetar, mas o oposto não se verifica.
Toda esta situação leva-nos a questionar se as práticas e comportamentos em matéria de higiene são adotados apenas porque nos são veiculados superiormente ou, se efetivamente os fundamentos da sua aplicação são compreendidos e se traduzem em alteração consciente de comportamentos.
De nada servem as regras impostas se não houver simultaneamente investimento em literacia. Só a tomada de consciência das implicações para si e para os outros de um determinado comportamento resultará numa efetiva alteração permanente de atitudes.
Os autores escrevem segundo o novo Acordo Ortográfico.