Um plano para recuperar a confiança
À custa de um estudo exaustivo das forças e das fraquezas da sociedade, do Estado e da economia ou de um conhecimento pessoal enciclopédico, o relatório de Costa Silva já terá sido de enorme utilidade, se nos obrigar a pensar sobre o retrato que faz
Há muitos anos que o país não dispunha de um documento prospectivo tão abrangente, tão rico e tão profundo como o que António Costa Silva entregou na semana passada ao Governo – talvez desde os tempos do Departamento de Planeamento e Prospectiva liderado por José Félix Ribeiro. A qualidade desse documento basta para justificar o acerto na escolha de António Costa e, principalmente, para se acreditar que a crise pode mesmo abrir uma nova página para o futuro do país. À custa de um estudo exaustivo das forças e das fraquezas da sociedade, do Estado e da economia ou de um conhecimento pessoal enciclopédico do que somos, por que somos assim e o que podemos ser enquanto país, o relatório de Costa Silva já terá sido de enorme utilidade, se nos obrigar a pensar sobre o retrato que faz.
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Há muitos anos que o país não dispunha de um documento prospectivo tão abrangente, tão rico e tão profundo como o que António Costa Silva entregou na semana passada ao Governo – talvez desde os tempos do Departamento de Planeamento e Prospectiva liderado por José Félix Ribeiro. A qualidade desse documento basta para justificar o acerto na escolha de António Costa e, principalmente, para se acreditar que a crise pode mesmo abrir uma nova página para o futuro do país. À custa de um estudo exaustivo das forças e das fraquezas da sociedade, do Estado e da economia ou de um conhecimento pessoal enciclopédico do que somos, por que somos assim e o que podemos ser enquanto país, o relatório de Costa Silva já terá sido de enorme utilidade, se nos obrigar a pensar sobre o retrato que faz.
Nada, ou quase nada lhe escapa. Da educação à saúde, da economia do mar à inovação, da indústria tradicional às tecnologias de ponta. Como seria de esperar para tanta ambição, o documento é excessivamente longo – 120 páginas e 323 mil caracteres. Por isso deve ser visto como um relatório que sustenta as opções políticas de um plano e não um plano em si. Escolher os eixos de intervenção, os investimentos, os calendários de execução ou as entidades que os hão-se gerir têm de ser da responsabilidade do Governo. Rui Tavares tem razão quando escreve que o documento é uma espécie de “cozido à portuguesa” no qual cada um escolhe o ingrediente de que mais gosta. É assim, e ainda bem.
Há duas leituras obrigatórias no documento: a primeira tem a ver com a necessidade de “colocar as empresas no centro da recuperação da economia”; e a segunda é a procura de um “equilíbrio virtuoso entre Estado e mercado, de forma a que o mercado funcione tanto quanto possível e o Estado funcione tanto quanto necessário”. Nessa necessidade e nesse equilíbrio, o Estado terá um papel crucial em definir prioridades para aplicar os recursos disponíveis, nomeadamente em infra-estruturas. Mas serão a sociedade e a economia a fazer o seu próprio caminho.
E há, também, uma mensagem subliminar que serve como antídoto ao discurso fatalista e miserabilista que a cada passo se ouve: Portugal tem recursos naturais, tem competências científicas e tecnológicas avançadas, tem empresas capazes de competir globalmente, tem uma posição geoestratégica favorável e não revela fissuras sociais graves que encontramos em outras latitudes. Pode ser pouco. Mas, com inteligência, determinação e com um Estado livre de paternalismo (e corrupção), pode ser suficiente para que, ao menos, seja possível acreditar que há luz para lá da obscuridade da pandemia.