Reabertura da linha do Douro até Barca de Alva pode potenciar economicamente a região, diz vice-presidente da CP

CP diz que está preparada para ir até Barca de Alva se a linha do Douro reabrir. Especialista diz que reabertura até à fronteira faz-se com 25 milhões de euros.

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Nelson Garrido

O vice-presidente da CP, Pedro Moreira, diz que a reabertura da linha do Douro do Pocinho até Barca de Alva é uma decisão do poder político, mas que a sua empresa está alinhada com esse objectivo e preparada para fazer serviço regular até à fronteira espanhola.

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O vice-presidente da CP, Pedro Moreira, diz que a reabertura da linha do Douro do Pocinho até Barca de Alva é uma decisão do poder político, mas que a sua empresa está alinhada com esse objectivo e preparada para fazer serviço regular até à fronteira espanhola.

“Se essa ligação for feita, a CP fará parte da solução”, disse o gestor, durante uma webinar organizado pela Liga dos Amigos do Douro Património Mundial (LADPM), que decorreu na quinta-feira.

A partir do próximo domingo, todos os comboios para o Pocinho (quatro em cada sentido) serão efectuados com carruagens Schindler, que proporcionam uma experiência de viagem mais agradável por serem mais amplas, terem assentos mais confortáveis e janelas que se podem abrir para melhor usufruir da paisagem. “São carruagens com 60 anos, mas que foram completamente reabilitadas e até países ricos como a Suíça, que tem um serviço ferroviário de referência, as mantém ao serviço e não estão a pensar retirá-las”.

Apesar das incertezas em torno da pandemia, a CP vai também recolocar nos carris o comboio histórico do Douro, a partir de 1 de Agosto, naquilo que, mais do que um negócio, é considerado pela empresa como um contributo para afirmar a região como um destino de turismo ferroviário.

O Douro sem comboio é o mesmo que o Douro sem vinho do Porto

E foi precisamente isso que sublinhou Alberto Aroso, engenheiro ferroviário, que diz que os vinhos e o comboio fazem parte da identidade do vale do Douro e que “imaginar esta região sem o comboio é o mesmo que a imaginar sem o vinho do Porto”. Por isso, diz, faz todo o sentido a reabertura da linha até Barca de Alva e Espanha, até porque “é uma obra simples de fazer, na verdade pouco mais do que uma modernização porque as obras de arte [pontes, túneis, trincheiras] já estão feitas”.

Um projecto para reabrir a linha do Douro e ligá-la a Espanha poderia custar entre 200 a 260 milhões de euros, dependendo do número e do tipo de comboios que ali circulassem e dos parâmetros de sinalização da via. No entanto, numa versão minimalista que se limitasse a abrir a linha só até Barca de Alva para comboios a diesel, bastariam 25 milhões de euros. A diferença está entre reconstruir uma verdadeira linha internacional ou prolongar a actual linha regional até à fronteira.

O orador lembrou que a própria União Europeia estudou 365 ligações transfronteiriças ferroviárias fechadas, tendo considerado a linha do Douro para Espanha como uma das 48 prioritárias para reabrir.  E recordou o caso franco-espanhol de Canfranc, uma linha nos Pirinéus com uma orografia e restrições técnicas bem mais complicadas do que a do Douro, que foi encerrada em 1970 e vai agora reabrir sob os auspícios da União Europeia.

Alberto Aroso diz que entre Barca de Alva e o Pocinho os autocarros que transportam os turistas dos navios fluviais demoram mais de 1h15 para percorrer os 63 quilómetros de uma estrada cheia de curvas, enquanto que o comboio demoraria apenas 25 minutos por um trajecto à beira rio ao longo de 28 quilómetros.

Pensar também nos utilizadores regulares

Margarida Mariz, professora de História e utilizadora regular da linha do Douro nos últimos 40 anos, contou que até à década de 80 o comboio era fundamental para toda a população do distrito de Bragança. “Esta linha representa a alma da região”, disse. No entanto, com o encerramento da linha do Tua e com a construção do IP4, o modo ferroviário perdeu importância.

Já os projectos da CP para dinamizar a linha com material circulante mais apto para o turismo merecem-lhe os maiores elogios, mas alertou para a necessidade de as carruagens terem ar condicionado, a pensar sobretudo nos passageiros que são utilizadores regulares e que não viajam por motivos turísticos.

Manuel de Novaes Cabral, presidente do Museu Nacional Ferroviário e ex-presidente do Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto, corrobora a ideia de que os vinhedos e o comboio são parte da identidade do Douro e que foi precisamente essa identidade que levou a UNESCO a classificar a região como Património da Humanidade.

“Não queremos um Douro museu, um Douro estático, mas sim uma região dinâmica e com actividade”, disse. Daí a importância do transporte ferroviário no desenvolvimento da região, em particular no turismo e em complemento com o transporte fluvial.

Manuel de Novaes Cabral partilhou ainda que os operadores turísticos da região estão agradavelmente surpreendidos com as reservas para este Verão, que mostram um crescimento maior do que no litoral do país.

A linha do Douro fechou entre Pocinho e Barca de Alva em 1988, mas os autarcas e as populações da região nunca se conformaram com esse encerramento. Miguel Cadilhe, à data ministro das Finanças do governo que tomou essa decisão, já admitiu que foi enganado e tornou-se o primeiro subscritor de uma petição para a reabertura da linha que já reuniu 13500 assinaturas. António Filipe, da LADPM, comunicou que essa petição vai estar em discussão na Assembleia da República na próxima quarta-feira, 15 de Julho.