Um hub criativo e 35 mil vinis para escuta: a nova casa da música é em Campanhã

Num antigo armazém bem perto da estação de Campanhã, a Arda Recorders instalou os seus estúdios com o sonho de ser um “agregador da indústria musical do Norte”. Lá dentro, a Câmara do Porto inaugura a sua fonoteca já em Setembro

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Quando João Brandão montou um estúdio de gravações em Sá da Bandeira, em 2007, o Porto ainda era “outra cidade”: a baixa estava ainda semi-vazia, os vizinhos eram poucos, os turistas ainda menos. Os anos trouxeram clientes nacionais e internacionais ao projecto e tornaram a urbe mais “obstruída” – o espaço onde se havia instalado a Estúdios Sá da Bandeira era curto para as ambições. Na cartilha de requisitos na hora de buscar outro tecto, havia um irrevogável: permanecer na cidade. E assim Campanhã se foi desenhando um destino apelativo.

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Quando João Brandão montou um estúdio de gravações em Sá da Bandeira, em 2007, o Porto ainda era “outra cidade”: a baixa estava ainda semi-vazia, os vizinhos eram poucos, os turistas ainda menos. Os anos trouxeram clientes nacionais e internacionais ao projecto e tornaram a urbe mais “obstruída” – o espaço onde se havia instalado a Estúdios Sá da Bandeira era curto para as ambições. Na cartilha de requisitos na hora de buscar outro tecto, havia um irrevogável: permanecer na cidade. E assim Campanhã se foi desenhando um destino apelativo.

Durante um mês, percorreu ruas e ruelas da freguesia oriental onde os esqueletos da revolução industrial continuam visíveis e, um dia, foi dar com um antigo armazém com um pé direito impressionante onde os sonhos pareciam caber. O negócio fechou-se. E a entretanto baptizada Arda Recorders expandiu horizontes: a Plataforma Campanhã é a nova casa da empresa, mas também um polo criativo onde se juntam outros projectos e um local de gravação para artistas. Lá dentro, está também a Fonoteca municipal, com 35 mil vinis para escuta, programação regular e um projecto educativo que devem arrancar já em Setembro.

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Quem sobe a rua de Pinto Bessa e dá com uma pequena artéria em terra batida do seu lado direito, não imagina que a poucos metros, no 122, está um dos mais sofisticados complexos da Europa no que à indústria da música e audiovisual diz respeito. João Brandão pensou em grande quando, em 2017, encomendou ao arquitecto e designer Carlos Aguiar o projecto. Cada sala e estúdio foram pensados com todo o detalhe e se daqui a uns meses acontecesse uma obra de grandes dimensões no espaço ao lado, por muito ruído e vibrações emitidos, lá dentro nada se sentiria, garante.

A Plataforma Campanhã nasceu para ser um “hub criativo” e uma “casa aberta”, com a ideia de “criar um lugar agregador da indústria musical do Norte”. Na cidade, diz João Brandão, havia “uma série de agentes culturais que não tinham um espaço onde pudessem trabalhar em conjunto” – e era isso que a Arda queria mudar.

No espaço, estão já instalados a editora Lovers & Lollypops, o artista André Tentugal e uma empresa alemã que faz mobiliário para estúdios de gravação. Há escritórios, três salas de gravação, câmara de eco, espaços para gravar voz off e fazer restauro de fitas magnéticas ou outros suportes, zonas de lazer. E “sinergias” à espera de serem criadas. Ali perto – e por pura coincidência – fica o centro comercial Stop, há muito usado como espaço de gravação de dezenas de artistas. João Brandão já por lá andou e atribui-lhe uma importância fulcral: “Serviu para mostrar que faz sentido e funciona juntar gente com o mesmo chip num mesmo espaço.” Embora o Porto seja “uma aldeia grande”, aponta, não se confundam as duas estruturas: “Faz sentido existirem os dois porque temos papéis diferentes. E a proximidade é muito interessante.”

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Um inquilino chamado Câmara do Porto

Estava já o destino da Arda Recorders definido, em 2017, quando uma conversa informal com Rui Moreira originou uma parceria inesperada. A Câmara do Porto acabara de receber uma doação de cerca de 16 mil discos da RDP e descobrira, a propósito disso, que havia mais 18 mil exemplares guardados – e praticamente esquecidos –  na Biblioteca Almeida Garrett desde 2008, quando a Rádio Renascença fez também uma oferta ao município. “Tivemos a ideia de dinamizar este acervo”, recorda Guilherme Blanc, braço direito de Moreira na área da cultura.

Dos quase 35 mil discos, 10 mil já foram limpos, documentados e digitalizados: um trabalho de minúcia que será continuado e cuja base de dados estará acessível a todos num site e também presencialmente. A pequena sala da Fonoteca municipal, com inauguração prevista para Setembro, tem três pontos de escuta e vai funcionar como um espaço de programação pública, com conversas, escuta orientada, sessões temáticas. E, não menos importante, revela Guilherme Blanc, com um projecto educativo que passará por uma relação estreita com as escolas básicas e secundárias da freguesia de Campanhã.

O acervo “muito diversificado” tem música etnográfica, clássica, erudita, pop, fado, folclore, temas nacionais e internacionais. Coisas raras, como o caso de um rancho folclórico de Trás-os-Montes gravado nos anos 60 ou gravações de aplausos e risos, mas também discos mais comuns, como Depeche Mode ou Michael Jackson.

Guilherme Blanc desconhece pormenores da viagem feita por estes vinis até aqui, mas imagina que a colecção seja uma mistura de compras das rádios e de materiais recebidos – no tempo onde todos queriam enviar as novidades para a radiofonia. Hoje é “património da cidade” e tem ambições de crescer: “O projecto está receptivo a doações, que naturalmente são sempre avaliadas, e também está disponível para adquirir discos.”