Como evitar a próxima pandemia? Peritos propõem sistema de vigilância global de animais selvagens

Especialistas escrevem na Science que falta um sistema de rastreio de vírus de animais selvagens que podem eventualmente passar para os humanos e causar doenças.

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WALLACE WOON/EPA

Vários especialistas defendem, num artigo científico publicado esta quarta-feira na revista Science, a criação de um sistema de vigilância global de animais selvagens que permita despistar no terreno vírus com potencialidade de infectar pessoas e gerar uma pandemia como a covid-19.

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Vários especialistas defendem, num artigo científico publicado esta quarta-feira na revista Science, a criação de um sistema de vigilância global de animais selvagens que permita despistar no terreno vírus com potencialidade de infectar pessoas e gerar uma pandemia como a covid-19.

O artigo, assinado por peritos em doenças infecciosas, biólogos e ecologistas, alerta para a falta de um sistema de rastreio de vírus de animais selvagens que podem eventualmente passar para os humanos e causar doenças, apesar da ameaça sempre presente do aparecimento de novos vírus que podem disseminar-se pelo mundo provocando uma pandemia, como a da covid-19 ou a da sida.

De acordo com os autores do artigo, que citam a Organização Mundial da Saúde, o coronavírus (tipo de vírus) que provoca a doença respiratória covid-19 terá origem em morcegos selvagens que vivem em grutas perto da cidade chinesa de Wuhan, onde foi detectado em Dezembro, e terá passado para uma segunda espécie animal, ainda não identificada, antes de infectar humanos.

Terá sido a partir de um mercado de venda de animais selvagens, em Wuhan, que o coronavírus SARS-CoV-2 atravessou fronteiras e se espalhou pelo mundo. Nem todos os coronavírus causam, porém, doença nas pessoas.

“É impossível saber a frequência com que os vírus passam dos animais para a população humana, mas os coronavírus causaram surtos [de doença] três vezes nos últimos 20 anos”, afirmou uma das co-autoras do artigo, Jennifer Philips, que co-dirige a Divisão de Doenças Infecciosas na Faculdade de Medicina da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, citada em comunicado pela instituição.

A investigadora e docente refere-se aos surtos da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS, em 2002), da Síndrome Respiratória do Médio Oriente (2012) e da covid-19 (2019).

Do tamanho de uma pen USB

O sistema de monitorização, à escala global, que o grupo de peritos propõe está ao alcance de um dispositivo portátil do tamanho de uma pen USB, que permite sequenciar o genoma (informação genética) de vírus em amostras recolhidas em locais como mercados de animais selvagens ou florestas tropicais.

A ideia seria ter equipas de cientistas e técnicos no terreno a extraírem e a sequenciarem o genoma de vírus a partir de amostras recolhidas de animais e depois descarregarem os dados para uma central.

Uma vez carregadas as sequências genéticas dos vírus numa base de dados, cientistas de todo o mundo poderiam analisá-las e identificar os vírus de animais que poderão ser uma ameaça para as pessoas.

Ao compararem os dados, os investigadores poderão identificar a que família pertence um vírus desconhecido e a sua relação com vírus que provocam infecção ou detectar se tem genes associados à capacidade de gerar doença em humanos, sustentam os autores do artigo da Science.

A pandemia da covid-19 já provocou mais de 550 mil mortos e infectou mais de 12 milhões de pessoas em 196 países e territórios, segundo um balanço feito pela agência noticiosa francesa AFP.

Em Portugal, morreram 1.644 pessoas das 45.277 confirmadas como infectadas, de acordo com o boletim mais recente da Direcção-Geral da Saúde.